Com um desfecho ainda imprevisível, a crise política e institucional na Argentina ganha novos capítulos com a briga pública entre a presidente Cristina Kirchner e seu vice-presidente Julio Cobos. A aversão ao risco chegou aos títulos que o Banco Central leiloa todas as terças-feiras. O apetite dos bancos pelas Letras e Notas do BC (Lebac e Nobac) apenas cobriram a oferta do BC, enquanto até duas semanas atrás as propostas representavam o triplo do volume leiloado.
No leilão de terça-feira, para uma oferta de 640 milhões de pesos, o BC recebeu propostas de 817 milhões e decidiu aceitar 732 milhões. A precaução nas mesas de operação dos bancos já havia sido demonstrada no leilão da semana passada, quando o BC ofereceu volume similar e as propostas chegaram a 721 milhões de pesos. Os bancos se tornaram cautelosos depois dos polêmicos decretos, o que estabelece o uso das reservas para pagar vencimentos da dívida em 2010 e o que exonera o presidente da instituição, Martín Redrado.
No último leilão realizado antes da crise, a oferta de Lebac e Nobac foi de 600 milhões de pesos, enquanto os bancos apresentaram propostas de 1,9 bilhão de pesos. O BC acabou colocando 1,8 bilhão de pesos. A nota oficial da instituição, informando sobre os resultados do leilão de terça-feira, mostra que a operação saiu da esfera do presidente do BC e passou para as mãos da "Comissão 6", dirigida pelo inimigo dele, Miguel Pesce. Mantido no cargo por decisão da Justiça, Redrado já não toma nenhuma decisão oficial na autoridade monetária e enfrenta uma dura disputa interna com os diretores ligados ao governo.
Os operadores explicam que os bancos vão ficar na retaguarda até a solução do impasse e o esclarecimento do boato de que o Tesouro passaria a emitir esses papéis no lugar do BC. Os títulos emitidos pelo BC não têm risco de um calote porque são contabilizados como passivos da instituição. Já a dívida emitida pelo Tesouro é usada para financiar o gasto público e corre o risco de um default, como o de 2001.
O conflito, que começou com a tentativa de usar as reservas do BC para pagar vencimentos da dívida em 2010, tende a agravar-se, já que o resultado do superávit primário de 2009 confirma o perigoso avanço do gasto público. Enquanto a arrecadação aumentou 18%, o gasto cresceu 30%. O superávit primário só foi alcançado devido às contribuições dos trabalhadores à previdência social e aos recursos dos Direitos Especiais de Saque do Fundo Monetário Internacional (FMI). O superávit primário caiu 47% em 2009, comparado com o ano anterior, e chegou a 17,2 bilhões de pesos.