Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Cultura

- Publicada em 16 de Junho de 2021 às 19:11

Maria Bethânia chega aos 75 anos de uma vida devotada à canção

Após estreia quase ao acaso, cantora virou estrela imediata da MPB

Após estreia quase ao acaso, cantora virou estrela imediata da MPB


ROBERTO FILHO/DIVULGAÇÃO/JC
Igor Natusch
Quando Maria Bethânia canta, a canção é o corpo inteiro. Como se, pelo poder de sua voz e interpretação, ela pudesse canalizar a energia da Bethânia que foi e que será, de tudo que ainda não existe e do que precisa existir. "Deus não me deu filhos, só me deu o meu trabalho. É a ele que dedico cada minuto da minha vida", disse a cantora, durante uma turnê em Portugal em 2015. "Se choro, guardo a minha lágrima para quando for cantar. Se namoro, o prazer do namoro será para utilizar quando for trabalhar. É tudo assim. Tudo é o meu trabalho."
Quando Maria Bethânia canta, a canção é o corpo inteiro. Como se, pelo poder de sua voz e interpretação, ela pudesse canalizar a energia da Bethânia que foi e que será, de tudo que ainda não existe e do que precisa existir. "Deus não me deu filhos, só me deu o meu trabalho. É a ele que dedico cada minuto da minha vida", disse a cantora, durante uma turnê em Portugal em 2015. "Se choro, guardo a minha lágrima para quando for cantar. Se namoro, o prazer do namoro será para utilizar quando for trabalhar. É tudo assim. Tudo é o meu trabalho."
A voz de Bethânia traz a potência de um Brasil inteiro. Completando 75 anos de vida nesta sexta-feira (18), a artista baiana segue sendo uma das mais amadas vozes da MPB, capaz de nos cantar, a um só tempo, a respeito do que somos e do que desejamos ser. Um pouco como se, na potência de seu cantar, surgisse em nós, os que ouvimos, uma nostalgia de nós mesmos - saudade que, em um paradoxo apenas aparente, nos faz desejar o futuro ainda inconcluso de nossas vidas.
Para Maria Bethânia Viana Teles Veloso, a música surgiu como um chamado. Verdade que, vindo de onde veio, a arte estava posta como trilha desde o berço: nasceu em Santo Amaro da Purificação, filha de Seu Zezinho e Dona Canô, irmã mais nova de Mabel e Caetano Veloso. Diz a lenda familiar que foi o irmão, então com quase quatro anos de idade, quem escolheu seu nome - inspirado na valsa Maria Betânia, então um sucesso do rádio na voz de Nelson Gonçalves.
Maria Bethânia, a baiana, desde cedo ansiava pelo palco. Sua primeira disposição, contudo, era pelo teatro. Mudou-se em 1960 para Salvador, matriculando-se na Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia.
A música, porém, era um compromisso de batismo, e se impôs. Em 1963, o irmão Caetano escreveu a trilha sonora para uma montagem de Boca de ouro, peça de Nelson Rodrigues - e coube a Bethânia abrir a cena, cantando Na cadência do samba. Se a letra de Ataulfo Alves fala em morrer na cadência bonita do samba, a canção teve efeito inverso na trajetória da jovem intérprete de 17 anos: revelou uma melodia capaz de preencher toda uma vida.
A estreia como profissional viria dois anos depois, e também quase por acaso. Musa da bossa nova, Nara Leão havia assistido Maria Bethânia na Bahia, em um dos espetáculos realizados junto a nomes então igualmente emergentes, como Gal Costa e Gilberto Gil - e lembrou dela imediatamente quando, por motivos de saúde, precisou se afastar do espetáculo Opinião, criado por Oduvaldo Vianna Filho e em cartaz no Rio de Janeiro. A cantora iniciante topou segurar o rojão, e sua interpretação de Carcará causou tanto impacto que ela saltou, quase imediatamente, para a linha de frente da MPB.
Desceu do palco de contrato assinado com a RCA, e logo gravou o primeiro LP - disco que, de quebra, também projetou Caetano Veloso, como compositor de várias faixas, e Gal Costa, com quem faz dueto na música Sol negro.
A partir de então, tivemos uma longa consagração, que já dura mais de cinco décadas e que (ainda bem) não dá qualquer sinal de acabar. Em 1976, seu LP Pássaro proibido seria o primeiro gravado por uma mulher a conquistar disco de ouro no Brasil - marca superada com Álibi (1978), primeiro álbum de uma cantora brasileira a vender 1 milhão de cópias. Quinze anos depois repetiria a dose, já em formato CD, com As canções que você fez para mim (1993).
Juntou-se aos baianos Caetano, Gal e Gil para formar a banda Doces Bárbaros, hoje reconhecida como revolucionária na música brasileira, e foi uma intérprete decisiva no sentido de consolidar a MPB como uma música, de fato, popular, com faixas tocando incessantemente no rádio e nos programas de televisão. Tudo isso sem abrir mão da qualidade artística e interpretativa fortemente associada com a sua figura. Além disso, como menina de Oyá, teve papel importante na aceitação das religiões de matriz africana como parte fundamental do cenário artística brasileiro.
Essa carreira superlativa reflete-se, em sentido contrário, no modo como a Abelha-Rainha conduz sua vida privada. É avessa a entrevistas, aceitando falar apenas com alguns poucos veículos quando está promovendo algum disco. Nunca casou, não teve filhos, e vive sozinha em uma casa afastada, envolta em vegetação, na Zona Oeste do Rio.
De certo modo, é como se tivesse devotado todo seu potencial criador para a música. Mas, como ela mesma já reconheceu em entrevistas, não há espaço para a solidão, porque o amor de amigos e fãs, além da potência de sua história, são mais do que suficientes para preencher tudo. Sua voz é sua filha amorosa, e todos nós somos testemunhas encantadas desse amor sem fim.
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO