Eric Fernando Boeck Daza
A escolha de Belém como sede da COP30 é um gesto geopolítico potente. Levar as negociações climáticas ao coração da Amazônia representa o desejo do Brasil de se recolocar no centro da governança climática e do Sul Global de ocupar papel de protagonismo. Mas entre o gesto e sua realização há uma lacuna que precisa ser enfrentada. A poucos meses da conferência, uma pergunta se impõe: quem estará em Belém para decidir o futuro do planeta?
Nas negociações de junho em Bonn, o custo da participação na COP30 surgiu como tema central, ainda que informal. Hospedagens acima de R$ 50 mil, escassez de voos, relatos de aluguéis a preços exorbitantes e infraestrutura limitada acendem um alerta. Em um sistema onde a ONU não financia delegações, isso deixa de ser um problema logístico e se torna um filtro de presença e influência.
Delegações de países vulneráveis, representantes da sociedade civil e povos tradicionais — que têm dado voz e legitimidade às negociações — correm o risco de não estarem presentes. Já países desenvolvidos, instituições financeiras e empresas da indústria fóssil não só estarão, como devem ampliar sua atuação e moldar os termos do debate.
O centro de gravidade das COPs tem se deslocado: deixam de ser arenas políticas e se tornam grandes feiras de negócios climáticos. Quando o acesso é limitado pelo custo, rompe-se o já frágil equilíbrio entre multilateralismo e legitimidade social.
A COP30 será o primeiro grande momento político pós-Global Stocktake. Espera-se avançar na transição justa, na adaptação e no financiamento — temas travados pela falta de confiança. Uma conferência desigual só aprofundará esse abismo.
O governo brasileiro tem ciência dos riscos. A presidência da COP busca construir uma agenda ambiciosa, mas isso não bastará se os mais impactados não puderem estar presentes. A credibilidade da COP30 será medida não por discursos, mas por quem ocupou os assentos — e por quem ficou de fora.
Especialista em energia e mudanças climáticas