Vice-presidente do maior grupo supermercadista das Regiões Sul, Campanha e Fronteira Oeste, Lindonor Peruzzo Júnior também se consolida como liderança empresarial no Rio Grande do Sul: vai assumir a presidência da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas) em setembro deste ano. O dirigente foi o entrevistado do programa de estreia do videocast Mapa Econômico do RS, projeto do Jornal do Comércio (veja a íntegra aqui).
Peruzzo Júnior aponta a industrialização da Campanha Gaúcha como uma importante oportunidade de desenvolvimento, o que pode acontecer com o beneficiamento da soja, que já tem uma produção representativa na região. E defende incentivos fiscais para atrair investimentos a essa parte do Estado.
Nesta entrevista, o empresário ainda fala sobre os desafios logísticos, projetos como o porto seco de Bagé e a retomada de barragens, além da dificuldade para retenção de talentos nas empresas. Perruzo Júnior ainda comenta projetos de inovação e sustentabilidade no ambiente corporativo gaúcho.
Lidonor Peruzzo Júnior concedeu entrevista a Guilherme Kolling, editor-chefe do JC, no programa de estreia do videocast Mapa Econômico do RS
TÂNIA MEINERZ/JC
Jornal do Comércio – A Região Sul é considerada menos desenvolvida economicamente em relação a outras áreas do Rio Grande do Sul. Mas tem várias boas iniciativas e projetos acontecendo...
Lindonor Peruzzo Júnior – Com certeza, é a região da melhor carne, do melhor ovino, do melhor bovino, o agronegócio é muito forte. E trabalhamos muito essa questão regional das nossas potencialidades.
JC – Na área do varejo, nos supermercados, as redes regionais estão crescendo fortemente nos últimos anos: Peruzzo, Nicolini, Righi, Guanabara, todas das Regiões Sul, Campanha e Fronteira Oeste.
Peruzzo Júnior – As redes regionais estão investindo, vemos um grande avanço dos supermercados nos últimos anos, em função da economia e da potencialidade da nossa região.
JC – Que outras iniciativas estão avançando nas Regiões Sul e Campanha?
Peruzzo Júnior – Temos várias potencialidades. Falamos várias vezes sobre a industrialização da nossa região, porque a indústria traz dinheiro para a cidade.
E o turismo também é forte, a região tem um passado muito legal, com prédios diferentes (históricos). Em Bagé tem a pedra da lua, um atrativo turístico que tem em apenas seis lugares no mundo inteiro.
JC – Em relação ao turismo, além de Bagé, há movimentação em outros municípios da Campanha. O empresário paulista Luiz Eduardo Batalha, que tem negócios em Candiota, vê perspectiva de desenvolvimento do turismo ligado à produção de vinho e azeite. É um potencial para além do turismo histórico?
Peruzzo Júnior - Sem dúvida. Ainda é tímido, a visitação aqui não é comparável à Serra Gaúcha, mas vem crescendo ano a ano, as pessoas vêm, tem ônibus de excursões, visitam nossas vinícolas e vão conhecer museus também. E a cidade de Bagé está se preparando, hoje tem agências especializadas que ajudam a saber o que fazer na cidade, restaurantes melhores, hotéis – a hotelaria melhorou bastante em Bagé. É um conjunto que faz com que estejamos preparados para incrementar o turismo, que traz dinheiro ao município.
JC – A produção de vinho, setor em que a família Peruzzo também tem negócios, com vinícola, é outra indústria da Região da Campanha.
Peruzzo Júnior – É uma indústria, com investimento alto que fizemos lá no passado na vinícola, modernizamos, e vemos que cada vez mais as pessoas vão entrando nesse mercado. É encantador trabalhar com vinho, sempre digo para o meu irmão, "isso aqui é uma maravilha!". A vinícola é um potencial, estamos no paralelo 31, o mesmo do Chile, da Argentina, da Austrália, da África do Sul. Então, isso facilita a alta qualidade dos nossos vinhos.
JC – Sobre industrialização, a Região da Campanha produz arroz, que já é beneficiado em fábricas, e também tem cultivo de soja. Existe perspectiva de fazer o processo industrial com a soja também?
Peruzzo Júnior – Tem o projeto de um empresário de Bagé que está buscando investidores. Dom Pedrito é o município gaúcho que mais produz soja, então, existe a matéria-prima, o que facilita para a região industrializar. Isso traz incremento de ICMS e riqueza para a cidade.
JC – Um desafios da agricultura é a irrigação. Há barragens sendo retomadas na Região da Campanha. Tem a Barragem da Arvorezinha, em Bagé, para abastecimento da população, e também as grandes barragens de Jaguari e Taquarembó, que criariam reservatórios de água que poderiam ajudar na irrigação...
Peruzzo Júnior – Nossa região historicamente tem problema de estiagem. As barragens facilitariam e trariam muita riqueza, aumentariam a produtividade das fazendas, seriam de grande importância ao desenvolvimento. A questão de Bagé, nossa barragem (Arorezinha) há muito tempo ficou parada e depois voltou a ter atividade. Atualmente estamos com problema de falta de água em Bagé.
JC – Há racionamento em algumas horas do dia...
Peruzzo Júnior – Acontece isso, é um problema. E o pessoal que não tem uma caixa d'água em casa, como faz? Essa é uma questão histórica que precisa ser resolvida e o prefeito (Luiz Fernando) Mainardi está trabalhando muito forte em cima disso.
JC – Em relação aos desafios, a infraestrutura sempre é lembrada. Qual é o maior desafio?
Peruzzo Júnior – A logística. Está cada vez mais precária. Sabemos da duplicação da (rodovia) BR-290, que é muito importante. Quando duplicarem Pantano Grande a Porto Alegre, vai ser um alívio. A manutenção das estradas também não acontece de acordo com o que deveria ser. As estradas estão preparadas para receber x quilos por caminhão, mas não temos posto de pesagem, o governo não controla. Isso faz com que as estradas se deteriorem, precisam de manutenção permanente, e acaba atrasando. Isso realmente vem atrapalhando nos últimos anos.
JC – A duplicação da BR-290 é em um trecho pequeno considerando a extensão da rodovia. Mas só essa parte em obras em Pantano Grande já seria um avanço?
Peruzzo Júnior – Alivia, alivia... Cada vez que liberam um trecho da pista, alivia bastante o trânsito. Eu trafego ali direto, nossos caminhões também. Facilitaria bastante... A logística que o Brasil definiu na década de 1970 não era por trem, que seria mais barato. Pagamos bastante por esse modelo adotado lá atrás. E hoje sofremos. A via férrea seria muito mais barata. Termina a concessão (de ferrovias no Rio Grande do Sul) em 2027, esperamos que tenhamos mudanças, com investimentos, para que consigamos tirar grandes caminhões das pistas, evitando acidentes, reduzindo custos e melhorando bastante a competitividade do Estado.
JC – Outra concessão que está chegando ao fim é a do Polo Rodoviário de Pelotas, pegando Rio Grande também. Há uma expectativa de mudança por parte de lideranças regionais, considerando o custo dos pedágios...
Peruzzo Júnior – Com certeza, se não me engano, é o segundo pedágio mais caro do mundo o trecho Rio Grande a Porto Alegre. Nós, que trafegamos com caminhões ali, podemos dizer que é muito pesado o valor, o que acaba impactando no preço lá no consumidor.
JC – E o projeto do porto seco de Bagé, que seria na área do distrito industrial, que era do governo do Estado e foi repassada ao município. Ajudaria na logística em Bagé?
Peruzzo Júnior – Facilitaria muito nossas importações – exportações também –, não precisaria fazer tudo no Porto de Rio Grande ou no Porto Seco de Uruguaiana.
JC – No painel realizado em Bagé, levantou-se a defesa da instituição de incentivos fiscais para atrair investimentos industriais à Região da Campanha. Há discussões sobre isso?
Peruzzo Júnior – Há anos temos trabalhado nessa pauta. Nosso vice-prefeito (de Bagé, Gilberto Alagia) tem esse assunto muito claro. É um projeto similar ao que aconteceu em Sobral (CE), Camaçari (BA) e também na Zona Franca de Manaus. De que forma poderíamos industrializar com atrativos? Porque a Região Sul do Estado não consegue competir com outras regiões se não for a base de incentivo. No setor têxtil, por exemplo, o Ceará levou muitas indústrias devido à vantagem competitiva na questão tributária. Então, é um assunto para estarmos debatendo e vermos formas de avançar.
JC – A propósito de impostos, no painel em Bagé foi citada a questão da Substituição Tributária para o setor dos supermercados. Está resolvida essa questão? Como funciona para o setor supermercadista?
Peruzzo Júnior – A Substituição Tributária é um pagamento do imposto direto na indústria. Quando entrou o governo atual, no primeiro mandato (Eduardo Leite, 2019-2022), foram tirados vários itens da cesta da Substituição Tributária. E isso afetou muitos empreendedores que faziam o cálculo de forma diferente da sua precificação. Isso eu descobri conversando com supermercadistas ao longo desse ano. E mexeu muito na lucratividade deles, até por uma questão sistêmica. Grandes supermercadistas têm sistema suficiente para poder majorar o produto da mesma forma. Outros majoraram de forma diferente e acabaram perdendo dinheiro no final. Então, quando há mudança tributária robusta como a que aconteceu, talvez precisasse ser um pouco mais trabalhada na informação, para que não afetasse os negócios. A queda da Substituição Tributária fez com que muitas empresas tivessem a questão competitiva afetada.
JC – Como está a discussão atualmente?
Peruzzo Júnior – Precisamos avançar, ter muito diálogo, conversar com o governo, explicar o nosso lado, mostrar que nós, voltando atrás, poderíamos ser mais competitivos e que o setor não está contente com essas mudanças. Isso é claro, é só conversar com os empreendedores.
JC – O setor supermercadista está crescendo nos últimos anos, especialmente com atacarejos. Isso demanda mais mão de obra, tema que é considerado um desafio. Como está a situação de formação e retenção de colaboradores?
Peruzzo Júnior – Esse é um desafio muito grande, uma dificuldade, o setor supermercadista, geralmente, é o primeiro emprego, e é um dos setores que mais emprega na economia gaúcha. Somos responsáveis hoje por 175 mil empregos no Rio Grande do Sul. E um faturamento na casa de R$ 70 bilhões (ano). É um setor que vem crescendo, mas a retenção da mão de obra é uma dificuldade muito grande. Ontem, estava em um evento em que uma das pessoas disse: "Olha, para resolver a mão de obra, estou trazendo gente da Venezuela, porque no Brasil não estamos conseguindo". Vimos também uma reportagem sobre uma empresa de Erechim que também está trazendo muito venezuelano.
JC – Segundo a prefeitura, são 4,5 mil trabalhadores estrangeiros, entre venezuelanos, haitianos e senegaleses em Erechim...
Peruzzo Júnior – E vivemos uma situação em que, por um lado, existe o Bolsa Família – que é importante, necessário, porém, tira mão de obra hoje. E vemos uma informalidade muito grande nos empregos, muitas pessoas não querem ter carteira assinada por isso. E a dificuldade de contratar e de as pessoas ficarem. Tem ainda uma questão da geração (atual). Então, nossos RHs têm que estar muito mais robustos hoje do que precisavam no passado. Antigamente tínhamos muito mais pessoas buscando empregos, hoje é difícil.
JC – É preciso atratividade para manter a pessoa trabalhando na empresa.
Peruzzo Júnior – Exatamente. Esses atrativos são benefícios, plano de saúde, vale-alimentação, todo mundo vem trabalhando em cima disso para conseguir manter as pessoas nas empresas. Nossa rotatividade, o turnover do setor (supermercadista) gira a mais de 50% no ano. É um absurdo...
JC – Metade dos colaboradores saem ao longo de um ano?
Peruzzo Júnior - Ao longo de um ano, é isso.
JC – Quem mantém a equipe tem um ativo.
Peruzzo Júnior - É um ativo. Imagina conhecer quem é o cliente, chamar pelo nome, são coisas importantes no nosso negócio, realmente ter um atendimento diferencial.
Vice-presidente do Grupo Peruzzo Supermercados, Lindonor Peruzzo Júnior diz que manter colaboradores é um desafio dos supermercadistas
TÂNIA MEINERZ/JC
JC – Nesse mapeamento da economia, vemos mudanças em dois eixos nos negócios: sustentabilidade e inovação. Como está o Rio Grande do Sul atualmente na inovação?
Peruzzo Júnior – Estive na feira NRF (evento mundial do varejo nos EUA), no início do ano, e lá se falou somente sobre Inteligência Artificial. Fomos buscar tecnologias e dá para dizer que tem muita coisa surgindo. Todas as palestras falavam sobre IA e de que forma pode trazer vantagem competitiva. E a principal ferramenta hoje para uso da Inteligência Artificial (no setor supermercadista) é na área de supply chain, na área do abastecimento de mercadorias, uma das partes mais difíceis do varejo supermercadista. Olhamos algumas ferramentas e o custo ainda é muito alto. Barateando um pouco vai ter uma adesão muito maior.
JC – E também é possível adaptar à sua realidade, uma grande empresa vai utilizar de uma maneira, e uma empresa menor pode usar a inovação adaptada a sua realidade.
Peruzzo Júnior – Claro. Trazendo um exemplo prático: hoje aqui em Porto Alegre está chovendo. Imagina uma tecnologia que vai prever que no dia de chuva, devido a ter um estacionamento coberto, você tem um incremento da venda e não uma redução para aquela determinada loja. E o sistema conseguir fazer toda essa análise. São ativos que a Inteligência Artificial pode trazer, um sistema normal nunca vai conseguir fazer essa previsão.
JC – E em termos de sustentabilidade?
Peruzzo Júnior – A empresa que não se preocupar com ESG está fadada ao fracasso. Vamos falar sobre o meio ambiente, o E de ESG que é o environment. O que a empresa pode fazer melhor? Na nossa empresa, 99,5% da energia é renovável, limpa. Isso já dá um diferencial enorme com relação a toneladas de CO2 que não são colocadas no meio ambiente. Com relação ao S, a questão da inclusão é muito forte nas empresas hoje. Trabalhamos muito a ética, (alertamos para) a questão do assédio. Essa questão do meio ambiente e do ESG não é mais uma pauta somente conceito, é uma pauta que tem que ser atual.
JC – Alguma questão do desenvolvimento econômico do Estado que queria acrescentar?
Peruzzo Júnior – Não se fala em desenvolvimento sem falar no empreendedor. O empreendedor é quem traz riqueza ao município, ao Estado. E acredito em fomento do empreendedorismo, em mudanças na educação, as crianças aprenderem na escola o empreendedorismo. O desenvolvimento econômico não vem somente dos grandes projetos, mas, sim, de vários pequenos projetos unidos em prol do desenvolvimento.