Com 25 cooperativas associadas, mais de 170 mil produtores integrados e um faturamento que ultrapassou os R$ 2 bilhões em 2024, a CCGL (Cooperativa Central Gaúcha Ltda) se consolida como uma das maiores forças do cooperativismo agroindustrial do Sul do Brasil. Fundada em 1976, a cooperativa atua em diversas frentes — da industrialização do leite e operação logística portuária à pesquisa e desenvolvimento de tecnologias aplicadas no campo, por meio da Rede Técnica Cooperativa (RTC).
À frente dessa engrenagem está Caio Vianna, engenheiro agrônomo, produtor rural, presidente da CCGL e da Cotrijuc, e referência em gestão cooperativa e agroindustrial no Brasil. Vianna tem conduzido a central em uma trajetória de modernização, crescimento sustentável e posicionamento estratégico dentro e fora do País. Ele é também um dos principais articuladores da 3ª Jornada Técnica da RTC, que acontece de 28 a 30 de maio, em Gramado (RS), e traz como tema "O futuro do agro já chegou. Vamos juntos?". O evento reunirá nomes como o Prêmio Nobel da Paz Rattan Lal e o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, para discutir inovação, sustentabilidade e produtividade com foco na força transformadora do cooperativismo.
Empresas & Negócios - Quantos cooperados fazem parte atualmente da CCGL e em quantos municípios a cooperativa está presente?
Caio Vianna - A CCGL completa meio século de história em 2026. São 25 cooperativas singulares associadas e mais de 170 mil produtores integrados, distribuídos em praticamente todas as regiões produtoras do Rio Grande do Sul. Nossa base é ampla e diversificada, o que fortalece o modelo de intercooperação. Ao longo das últimas décadas, a CCGL ampliou sua atuação, passando da industrialização de leite para a operação portuária — com os terminais Termasa e Tergrasa — e o desenvolvimento tecnológico por meio da RTC, com sede em Cruz Alta (RS). Essa estrutura permite atender de forma descentralizada e eficaz as demandas dos produtores em campo, conectando pesquisa, assistência técnica e gestão.
E&N - Qual foi o faturamento da cooperativa em 2024 e quais são as projeções para 2025?
Vianna - Alcançamos, em 2024, o maior faturamento da nossa história: uma receita bruta superior a R$ 2 bilhões. Esse resultado expressivo reflete uma gestão profissional, com foco em excelência e compromisso com o cooperado. Tivemos também recorde na distribuição de dividendos: foram R$ 14,4 milhões em 2024, referentes ao exercício anterior, e agora, em 2025, esse valor dobrou, chegando a R$ 28 milhões. Isso representa mais que números — é o retorno direto para quem está na base, incentivando novos investimentos e reforçando o vínculo entre a produção e a cooperativa. Nossa expectativa para 2025 é manter esse crescimento sustentável, com base na eficiência operacional e no fortalecimento das cadeias produtivas.
E&N - A CCGL tem planos de expansão? Há novos investimentos em infraestrutura, tecnologia ou ampliação da base de cooperados?
Vianna - Sim, e com intensidade. Entendemos que para seguir competitivo é preciso inovar continuamente. Um dos projetos mais relevantes é o SmartCoop, plataforma desenvolvida pela FecoAgro/RS, que revoluciona o acompanhamento técnico das lavouras. Ela reúne dados agronômicos, clima, manejo e gestão em tempo real, integrando cooperativas, técnicos e produtores. No campo da infraestrutura, estamos investindo R$ 550 milhões na reconstrução do terminal Termasa, no Porto de Rio Grande, que sofreu grandes danos nas enchentes de 2024. A planta de leite em Cruz Alta, com capacidade para processar 3,4 milhões de litros por dia, é uma das mais modernas da América Latina e ainda tem margem para crescimento. Também estamos expandindo nossa presença internacional, com exportações para América Latina, África e Ásia — e a China entrou recentemente nesse mapa.
E&N - A CCGL vem promovendo um projeto para reforçar o sentimento de pertencimento dos cooperados. Como essa estratégia tem impactado o engajamento e os resultados da cooperativa?
Vianna - Em abril de 2025, lançamos o projeto "Aqui, o produtor é dono", uma websérie que apresenta histórias reais dos nossos cooperados. A proposta é valorizar quem faz o dia a dia da cooperativa, mostrar que, de fato, são os produtores que movem essa engrenagem. O engajamento nas redes tem sido muito positivo, mas, mais do que visibilidade, isso fortalece a identidade e o pertencimento. O produtor que se sente dono participa mais, compartilha decisões e investe com mais segurança. Essa relação de confiança e transparência é a base do nosso modelo de gestão.
E&N - Como a CCGL avalia o atual cenário do cooperativismo agropecuário no Rio Grande do Sul e no Brasil?
Vianna - O Rio Grande do Sul é o berço do cooperativismo brasileiro e isso nos dá uma responsabilidade histórica. Apesar dos desafios recentes, especialmente climáticos, o modelo cooperativista tem mostrado resiliência e capacidade de adaptação. A CCGL é um exemplo disso: nos reinventamos, incorporamos tecnologia, aumentamos a eficiência e continuamos entregando valor ao produtor. O cooperativismo é, antes de tudo, um modelo de desenvolvimento coletivo. E isso tem muito valor num cenário que exige sustentabilidade, inclusão e inovação.
E&N - Na prática, o que muda para um produtor ao se tornar um cooperado? Quais são os principais benefícios?
Vianna - A principal mudança é sair do isolamento. O cooperado tem acesso a assistência técnica, tecnologia de ponta, crédito, comercialização estruturada e, sobretudo, à força do coletivo. No caso do leite, isso é ainda mais visível: os preços pagos são justos e transparentes, baseados em parâmetros técnicos e de mercado. E o resultado da operação retorna para ele, como sócio. Além disso, ele participa das decisões. Isso dá previsibilidade, reduz riscos e cria um ambiente mais saudável para investir e crescer.
E&N - O modelo cooperativo segue sendo competitivo frente a outros modelos de negócio no agro?
Vianna - Sem dúvida. Hoje, as cooperativas são administradas com o mesmo nível de profissionalismo das grandes empresas privadas, mas com uma grande diferença: o foco está no associado. A governança é sólida, os resultados são compartilhados e a visão de longo prazo é parte da cultura. Além disso, o modelo tem como base a educação, a inovação e o desenvolvimento local. Isso torna o cooperativismo não só competitivo, mas estratégico para o futuro do agro.
E&N - A Jornada Técnica da RTC deveria ter ocorrido em 2023, mas foi adiada pela enchente. Como a CCGL lidou com os impactos daquele evento?
Vianna - Foi uma decisão difícil, mas necessária. A Jornada já estava com as inscrições quase esgotadas quando o Estado foi duramente atingido pelas enchentes. Cancelamos imediatamente, em solidariedade aos produtores e comunidades afetadas. Assumimos o compromisso de atuar na linha de frente do apoio humanitário, com doações de leite em pó, água potável, mantimentos e logística para atender as regiões isoladas. E mesmo em áreas com acesso comprometido, mantivemos a coleta de leite — porque o compromisso com o produtor é diário. Essa resposta rápida só foi possível porque temos uma base cooperativa forte e organizada.
E&N - O evento traz nomes de peso como o Prêmio Nobel da Paz Rattan Lal e o ex-ministro Roberto Rodrigues. O que a CCGL busca ao trazer esse tipo de debate ao setor agropecuário?
Vianna - A Jornada Técnica da RTC é muito mais que um encontro técnico. É um espaço de provocação e construção de futuro. Trazer nomes como Rattan Lal, referência mundial em solos e sustentabilidade, e Roberto Rodrigues, um ícone do agro brasileiro, mostra que queremos pensar o agro além da porteira. Nossa intenção é conectar os produtores com as grandes tendências globais — agricultura regenerativa, inovação digital, segurança alimentar. O cooperativismo tem um papel-chave nisso. É com conhecimento, cooperação e visão de longo prazo que vamos garantir um futuro sustentável para o campo e para a sociedade.