Porto Alegre,

Publicada em 05 de Maio de 2025 às 06:00

Eldorado do Sul permanece com cenário de calamidade

Segundo o Mapa Único do Plano Rio Grande, 80,8% dos domicílios de Eldorado foram atingidos

Segundo o Mapa Único do Plano Rio Grande, 80,8% dos domicílios de Eldorado foram atingidos

EVANDRO OLIVEIRA/JC
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Fabrine Bartz
Fabrine Bartz Repórter
Localizada na Região Metropolitana de Porto Alegre, Eldorado do Sul ainda apresenta um cenário de calamidade em razão da enchente do ano passado, considerada a maior da série histórica do município. Entre as principais demandas dos moradores, está a falta de medidas habitacionais e de proteção contra cheias.
Localizada na Região Metropolitana de Porto Alegre, Eldorado do Sul ainda apresenta um cenário de calamidade em razão da enchente do ano passado, considerada a maior da série histórica do município. Entre as principais demandas dos moradores, está a falta de medidas habitacionais e de proteção contra cheias.
Segundo o Mapa Único do Plano Rio Grande (MUP), do governo do Rio Grande do Sul, 80,8% dos domicílios foram atingidos pela água, o que gerou impactos para 31.964 moradores. O município é considerado o mais atingido, seguido de Muçum (66,3%), Canoas (44%), São Leopoldo (40,7) e São Sebastião do Caí (36,3%).

Cidade da Região Metropolitana foi a mais impactada do RS pela enxurrada | Bruno Peres/Agência Brasil/JC
Cidade da Região Metropolitana foi a mais impactada do RS pela enxurrada Bruno Peres/Agência Brasil/JC
Quem circula por Eldorado do Sul encontra as marcas d'água, tanto nas residências quanto no comércio. Casas praticamente inteiras estão abandonadas, devido ao medo sentido pelos moradores de uma próxima enchente. No entanto, não há um levantamento de quantas casas estão vazias. De acordo com a prefeitura, será feito um decreto para que as equipes possam limpar os espaços e notificar os proprietários para que a "manutenção e prevenção contra a dengue seja feita em todo território", afirmou o Executivo, em nota.
Da população total de 39.556 habitantes, cerca de 30% (ou seja, mais de 10 mil pessoas) deixaram a cidade durante o período da enchente. Contudo, de acordo com a prefeitura, mais da metade retornou após a água baixar. O cenário foi descrito pelos moradores como o de uma guerra. Helicópteros e barcos circulavam na busca pela população e por alternativas de sair da cidade entre o fim de abril e o início de maio de 2024.
"Eu estava em Porto Alegre, mas precisei entregar a casa que estava e com isso resolvemos voltar. Nossa vida está aqui", conta uma moradora que trabalho como autônoma no bairro Chácara, que optou por não se identificar. Ela saiu de casa no começo de maio do ano passado. "Nós erguemos os móveis e depois fomos para um bairro mais alto, mas a água também chegou lá. Com isso, toda nossa família foi para Porto Alegre. Saímos de casa com as roupas do corpo, o cachorro e um pacote de bolachas", complementa, entre lágrimas.
De acordo com ela, o único recurso recebido foi o Auxílio Reconstrução do governo federal, no valor de R$ 5,1 mil. Agora, a expectativa é de que sejam adotadas novas medidas de proteção contra cheias.
Quem ficou em Eldorado também reforça a estrutura das casas como medida preventiva. "A casa do meu pai caiu e eu tive que refazer toda ela por conta própria, porque estaria esperando até agora", conta o pedreiro John Lennon Soares da Silva - que está construindo o segundo andar de um supermercado no bairro Medianeira. De acordo com ele, os donos do estabelecimento estão fazendo a obra para ter alguma alternativa caso o mesmo se repita.
O nível do Guaiba e do Rio Jacuí alagou diversos bairros da cidade. Além dos já mencionados, os bairros Picada, Cidade Verde, Vila da Paz, Itaí e Sans Soucci foram os mais impactados. Os rastros da água também são nítidos no comércio. Supermercados, barbearias e outros estabelecimentos seguem fechados e sem sinais de retomada.
Proprietária do mercado Fênix, Terezinha Marlene Freitas, fez jus à mitologia grega e retornou, mais de uma vez. "Foi terrível! Perdemos tudo, a água chegou no teto. Quando saímos, a água estava subindo, mas em pouco tempo já não conseguimos voltar, ficamos 38 dias fora de casa", detalha.

Ainda há muitos locais abandonados em todas as regiões da cidade | EVANDRO OLIVEIRA/JC
Ainda há muitos locais abandonados em todas as regiões da cidade EVANDRO OLIVEIRA/JC
De acordo com ela, na enchente de novembro de 2023, a água chegou a 80 centímetros. "Como temos os cavaletes, não perdemos nada, apenas levantamos, mas em maio não teve o que fazer", lembra. A família recebeu ajuda dos fornecedores e solicitou empréstimo para poder retornar ao espaço. Caso receba algum auxílio governamental, Terezinha afirma que sairá da cidade. Durante o período, ela ficou em um abrigo na cidade vizinha de Guaíba. "Pelo menos, estávamos todos juntos, porque muitas famílias ficaram separadas", complementou.
Relativamente acostumada com as enchentes, devido a topografia plana, Eldorado do Sul já tinha um plano de contingência para essas situações, que incluía o uso de ginásios indicados para abrigar os moradores, mas ele foi insuficiente pelo tamanho da tragédia. O projeto de construção de um dique, embora tenha sido discutido recentemente entre as autoridades, ainda não saiu do papel desde 2012. O edital para revisar o projeto foi publicado O investimento total previsto para o sistema de proteção é de R$ 531 milhões.

Ruas da cidade ainda têm muitos entulhos e carros abandonados

Número de carros abandonados no município ainda é desconhecido

Número de carros abandonados no município ainda é desconhecido

EVANDRO OLIVEIRA/JC
Embora mutirões de limpeza tenham sido realizados, quem circula pela cidade ainda encontra os entulhos da catástrofe em praticamente todas as ruas e avenidas. Pedaços de madeira, que antes eram janelas e portas agora estão tanto em grandes montes quanto de forma separada. Além disso, o acúmulo de resíduos descartados no momento posterior à enchente de 2024 também é perceptível em praticamente todas as regiões, inclusive dentro dos bueiros e bocas de lobo - o que gera preocupação entre os moradores.
"Além de ter vindo com força diretamente do rio, a água também veio pelos bueiros, como também aconteceu em Porto Alegre", conta a moradora da Vila Paz, que optou por não se identificar. De acordo com a prefeitura, a limpeza e a manutenção são realizadas semanalmente. Em nota, o Executivo alegou que "toda a semana mais pessoas voltam pra casa e descartam os resíduos nas ruas" e que a limpeza "é feita contentemente". Porém, o cronograma da coleta e a quantidade já recolhida não foram informados à reportagem.

Prefeitura ainda não realizou a coleta de todos os entulhos  | EVANDRO OLIVEIRA/JC
Prefeitura ainda não realizou a coleta de todos os entulhos EVANDRO OLIVEIRA/JC

Outra cena de quem circula por Eldorado do Sul são os carros abandonados. Alguns quebrados e com marcas d'água estão espalhados pelas ruas do município da Região Metropolitana. Já em outros, nem a marca é perceptível, porque a água foi além do teto tanto dos carros quanto das casas. De acordo com a prefeitura, "todos os identificados são recolhidos, os que têm donos eles são notificados e os que não tem são encaminhados aos depósitos". A prefeitura também não confirmou quando já foram recolhidos e a quantidade de carros que ainda estão por serem retirados das ruas e avenidas, a partir dos pedidos.
 

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