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Publicada em 17 de Junho de 2024 às 19:35

Abrigos fechados e falta de moradia após enchentes mobilizam ocupações

Na última semana, dois prédios públicos foram ocupados por movimentos sociais no Centro de Porto Alegre

Na última semana, dois prédios públicos foram ocupados por movimentos sociais no Centro de Porto Alegre

TÂNIA MEINERZ/JC
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Bárbara Lima
Bárbara Lima Repórter
As enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul em maio deixaram, até o momento, 176 mortos, além de milhares de pessoas desabrigadas e desalojadas. Nesta segunda-feira (17), a capital gaúcha, segundo a prefeitura, ainda tinha, conforme atualização das 17h, cerca de 2.132 pessoas em 46 alojamentos ativos. No auge dos alagamentos, Porto Alegre chegou a ter 14.632 pessoas em 163 abrigos. 
As enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul em maio deixaram, até o momento, 176 mortos, além de milhares de pessoas desabrigadas e desalojadas. Nesta segunda-feira (17), a capital gaúcha, segundo a prefeitura, ainda tinha, conforme atualização das 17h, cerca de 2.132 pessoas em 46 alojamentos ativos. No auge dos alagamentos, Porto Alegre chegou a ter 14.632 pessoas em 163 abrigos. 
Com tantas pessoas sem ter para onde ir ou com casas inabitáveis por conta da lama e da destruição, as ocupações de prédios públicos por movimentos sociais têm sido uma estratégia para chamar a atenção sobre o tema da habitação.
Na última semana, dois prédios públicos foram ocupados. Um deles é o antigo prédio do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), ocupado no sábado (8) pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O outro é um prédio do governo estadual que abrigava a antiga sede da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), ambos no centro da cidade. A ocupação Sarah Domingues,  em homenagem a estudante morta no bairro da Ilha das Flores no início do ano, foi realizada pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) no sábado (15) e sofreu reintegração de posse em menos de 24 horas. 
Segundo Priscila Voigt, liderança do MLB, a ação da Brigada Militar foi bastante violenta. Cerca de 100 famílias estavam no local quando a polícia realizou a operação. "Foi bem traumático, revistaram até crianças. Pediram para que as famílias se identificassem. Não tinham mandado", conta. A Brigada Militar, por sua vez, informou, em nota, que a retirada foi realizada de forma "pacífica e dentro das normas procedimentais após negociação com os manifestantes." Sobre a forma como a Brigada Militar realizou a reintegração de posse, a líder do movimento afirmou que irão buscar recursos. "Vamos entrar na corregedoria, no Ministério Público, em tudo que pudermos", explica.
De acordo com Priscila, as ocupações de prédios não utilizados pelo poder ser justificam porque muitas famílias, que perderam tudo, são numerosas e não conseguem se acomodar em casa de parentes que, muitas vezes, também foram afetados pelas enchentes. "São pessoas que moravam nos bairros Humaitá e Sarandi, os últimos onde a água baixou."
Outras famílias precisaram deixar os abrigos em que estavam porque estes estão fechando. "Muitos abrigos eram voluntários, de escolas que abriram suas portas. No entanto, há uma pressão para que as aulas retornem. Já em outros abrigos, não há espaço suficiente. Quando saímos da ocupação, queriam que fossemos para o  CETE (Centro Estadual de Treinamento Esportivo), um abrigo, mas, chegando lá, as famílias que estavam lá também não queriam que ficássemos. Eu entendo, é apertado. De repente, seriam mais 150 famílias no local", conta.
Ela também relatou que os integrantes do movimento têm dificuldade para acessar os recursos disponibilizados pelos governos municipal, estadual e federal. "Tem gente que perdeu o celular, tem gente que não tem internet, ou que não sabe como acessar os recursos. Além disso, Porto Alegre demorou para cadastrar o Auxílio Reconstrução", pondera. O Auxílio Reconstrução é pago pelo governo federal no valor de R$ 5,1 mil. A líder aponta, ainda, que, mesmo com todos os auxílios, não há recurso financeiro suficiente para todas as famílias se reerguerem imediatamente.

Sistema Retrofit é opção para moradia digna

Priscila defende que o prédio da ocupação Sarah Domingues, há 10 anos desocupado, poderia ser aproveitado no programa do governo federal que realiza o 'Retrofit', ou seja, que transforma prédios públicos, antes utilizados como escritórios, por exemplo, em moradias.
Sobre a ocupação do MTST no prédio do INSS, Eduardo Osório, que integra a coordenação nacional do movimento, ressaltou que a situação é uma oportunidade para a cidade retomar o debate de moradia popular, mas que a falta de uma política pública pode agravar o problema habitacional. "O drama da moradia é antigo, apartamentos ficam desocupados intencionalmente e durante esse tempo tem pessoas vivendo em condições desumanas", avalia. "Tem pessoas vivendo em abrigos há 45 dias, expostas à violência, longe das suas casas, longe de estruturas como escolas, postos de saúde. É um retorno difícil, porque há risco de novos alagamentos. O Estadia Solidária, do município, dura apenas um ano. Depois, as pessoas ficam à mercê?", questiona.
O titular da Diretoria de Habitação e Saneamento da Secretaria Extraordinária para a Reconstrução do RS, Carlos Roberto Comassetto, em entrevista ao Jornal do Comércio, disse que o prédio do INSS deve ser incluído no Retrofit. "Nós vamos ajudar a operacionalizar. Já existe a portaria, e nós vamos ajudar a colocar esse programa de pé junto com a SPU que é responsável por esses locais. Esse é um programa de médio prazo. Nós precisamos agora colocar esse programa também na política de emergência". 
Sobre a ocupação Sarah Domingues, a Secretaria Estadual de Habitação e Regularização Fundiária afirmou que a política de abrigamento é de responsabilidade do município. Questionada sobre a possibilidade de transformar o prédio da ocupação, ou outros que são de domínio estadual, em habitação pelo sistema Retrofit, a pasta informou que ainda "não tem programa para uso do sistema Retrofit, do governo federal, em prédios públicos estaduais." Apesar disso, afirmou que "há um estudo, recém iniciado, para avaliar o custo benefício da ação." 
De acordo com Comasseto, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou um projeto que permite o uso de áreas públicas do Estado pelo Retrofit. "O desafio é fazer com que os municípios também entrem nisso e coloquem áreas à disposição para inserimos nesses programas", diz.

centros humanitários de acolhimento começam a ser montados

Uma solução provisória para a moradia são os Centros Humanitários de Acolhimento (CHA), como são chamados pelo governo estadual.  Eles serão montados em Porto Alegre e Canoas. Na cidade Metropolitana, as estruturas começaram a ser montadas na última sexta-feira (14). O local terá capacidade para receber cerca de 700 pessoas desabrigadas pelas enchentes.
Em Porto Alegre, a construção do CHA Centro Humanístico Vida, de acordo com o governo,  já cumpriu as etapas de escavação para drenagem e marcação dos pontos para o aterro com brita. Também foi executado o aterramento e a implantação da rede elétrica. No caso do CHA que será construído no estacionamento do Porto Seco, o governo informou, em nota, que está sendo desenvolvida uma "nova tipologia de abrigos para montagem". A opção é questionada pelos movimentos sociais que realizam as ocupações. "São locais afastados, sem estrutura. É a manutenção da violência", afirma Eduardo, do MTST.
Outra alternativa, da prefeitura de Porto Alegre, é a Estadia Solidária. A administração informou nesta segunda-feira (17) que começou a entrar em contato com os beneficiários que tem direito ao programa  para famílias em abrigos ou desalojadas, que estão em casas de familiares ou amigos. Segundo o município, as primeiras 3,9 mil famílias que têm direito ao benefício já podem obter o recurso, que consiste em 12 parcelas de R$ 1 mil. O valor será pago através da Caixa Econômica Federal.

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