Trinta meses após a invasão russa à Ucrânia, que deu início ao maior conflito armado na Europa desde a Segunda Guerra Mundial, o governo ucraniano conseguiu uma vitória difícil de ser imaginada há poucos meses. O exército assumiu o controle de 1.000 quilômetros quadrados de território russo, colocando-se, pela primeira vez, em posição de negociar.
A dinâmica inédita agora imposta pelo presidente Volodimir Zelenski na guerra iniciada por Vladimir Putin, em 2022, indica que a Ucrânia busca mudar a narrativa de um conflito que há meses era descrito como estático. O objetivo estratégico da invasão à Rússia, a primeira desde que os nazistas entraram na União Soviética, em 1941, ainda é incerto. De certo, apenas que o ataque à província de Kursk é uma séria provocação a Putin.
Nessa incursão, além do deslocamento de mais de 130 mil russos moradores das cidades tomadas, o exército ucraniano vai somando ativos para aumentar seu poder de barganha em uma futura negociação de paz. Entre eles, a captura de soldados russos - fala-se em mais de 100 - e a tomada de Sudja, o centro final de distribuição de gás russo à Europa.
Se, de fato, Zelenski tomou a instalação, Putin está em maus lençóis. É do local que o gás russo flui para a Ucrânia e, de lá, para o restante da Europa. Hoje, França, Espanha e Bélgica são os maiores compradores. Juntas, receberam, no ano passado, 87% de todo gás que entrou na UE.
Obviamente, Zelenski não paralisará o transporte. O bloco europeu, desde o início da guerra demonstra apoio político, humanitário, militar e financeiro à Ucrânia e quebrar essa confiança seria um tiro no pé.
Mesmo com a guerra econômica travada por Estados Unidos, UE, Reino Unido e outras nações - já são mais de 16 mil sanções desde o início da guerra, tendo como alvo, principalmente, o rublo russo -, dados de 2023 do Fundo Monetário Internacional(FMI) mostram que a economia russa cresceu mais rapidamente do que a de todo o G-7 - EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá. E a previsão é que 2024 siga o mesmo ritmo. Claramente isso é explicado pela necessidade europeia de gás natural.
Com o gás continuando a fluir, então porque Putin estaria em maus lençóis? Os territórios ocupados podem obrigá-lo a ceder, o que seria uma situação inédita.
Nas negociações sobre paz, Putin não arredava o pé dos 20% que já ocupa da Ucrânia, enquanto Zelenski não admitia perder nada. Com um naco mínimo do maior país do mundo na mão, terá o que negociar, restando, contudo, saber se a Rússia toparia isso.