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Publicada em 30 de Outubro de 2025 às 08:46

"É uma história sobre paixão", afirma Irandhir Santos, protagonista de série sobre a Coligay

Filmagens de série inspirada em pioneira torcida LGBT  do Grêmio visitam lugares simbólicos, como o pórtico do antigo Olímpico, e vão até 6 de novembro

Filmagens de série inspirada em pioneira torcida LGBT do Grêmio visitam lugares simbólicos, como o pórtico do antigo Olímpico, e vão até 6 de novembro

GALERIA DISTRIBUIDORA/DIVULGAÇÃO/JC
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Jamil Aiquel
Jamil Aiquel
No auge da ditadura militar, o Rio Grande do Sul foi palco de uma das maiores demonstrações de força e resistência na história do futebol brasileiro. Essa é a história da Coligay, uma torcida organizada do Grêmio composta exclusivamente por homossexuais, que marcou época entre os anos de 1977 e 1983, e é amplamente creditada como a primeira torcida LGBTQIAPN+ do Brasil.
No auge da ditadura militar, o Rio Grande do Sul foi palco de uma das maiores demonstrações de força e resistência na história do futebol brasileiro. Essa é a história da Coligay, uma torcida organizada do Grêmio composta exclusivamente por homossexuais, que marcou época entre os anos de 1977 e 1983, e é amplamente creditada como a primeira torcida LGBTQIAPN+ do Brasil.
Essa manifestação histórica vai virar uma obra audiovisual. Assinada pelo Canal Brasil, a minissérie Coligay, vem sendo gravada na capital gaúcha desde o início de novembro, com produção da Ventre Studio, Casa de Cinema de Porto Alegre e +Galeria. Na tarde desta terça-feira (28), o Jornal do Comércio visitou o set de gravação do projeto. 
Dirigida por Paulo Machline, e com o roteiro escrito por Patricia Corso, Raul Perez, Fernando Américo e Luiz Filipe Noé, a minissérie contará com a presença do ator Irandhir Santos, conhecido por trabalhos na novela Renascer e no filme Tropa de Elite, que foi escolhido para representar um dos protagonistas da história, o personagem Ramon, inspirado em Volmar Santos, fundador da torcida em 1977.
A equipe de reportagem do Jornal do Comércio conversou com profissionais envolvidos na produção, incluindo o diretor e o ator principal da obra.
A série ainda não tem previsão de lançamento | ESPECIIAL/JAMIL AIQUEL/JC
A série ainda não tem previsão de lançamento ESPECIIAL/JAMIL AIQUEL/JC
Machline, diretor da minissérie, contou que foi convidado pela produtora Ventre Studio para fazer parte do projeto. Amante do futebol, ele afirma que participar de algo como a minissérie da Coligay foi um “presente”, pois o permitiu entender e enxergar a importância da torcida como um relevante ato de resistência.
“Para mim, a Coligay é um ato político revolucionário. Estamos em 2025 e, em alguns aspectos, as coisas estão regredindo. Os direitos adquiridos, que esses grupos de resistência conseguiram durante tantos anos de luta, em diversos pontos do mundo, estão ou regredindo de fato ou existe uma força contrária tentando revertê-los. Então, acho que olhar para a Coligay é uma chance que temos de mostrar um dos lugares onde essa luta começou e o quanto ela é importante para que nós, como seres humanos, consigamos ter o direito de ser quem somos”, destacou Machline.
A história da Coligay é bastante famosa e bem documentada. O diferencial desta versão, portanto, é que será uma série fictícia inspirada nos personagens históricos. Machline destaca que a principal inspiração de sua obra foi o livro Coligay: tricolor e de todas as cores, escrito por Léo Gerchamnn, que, apesar de ter uma estrutura documental, o apresentou diversos personagens interessantes. 
A ideia central, então, é trazer esse universo à vida, contando a história dessas pessoas que, segundo ele, possuem personalidades muito marcantes, explorando os dramas e o arco de cada personagem individualmente, para poder contar a grande história da torcida.
“Volmar, que foi o líder da Coligay lá nos anos 1970, é um personagem fantástico. Personagem que, na ficção, tem 1 milhão de camadas e que pode ser trabalhado de formas saborosas no sentido da ficção, do drama, da comédia. Me lembra muito o universo do (diretor espanhol Pedro) Almodóvar. Queremos contar um pouco da história de cada uma dessas pessoas. Cada personagem tem seu arco, contamos várias histórias para poder contar uma grande história”, destacou.
Outro que destacou a importância da obra foi Irandhir Santos. Torcedor fanático do Sport Recife, o ator é um homem gay que vive o futebol em sua plenitude. Por conta dessa vivência, ele entende a importância de uma obra como Coligay
“Sou gay e eu amo futebol. Vou ao estádio, vibro com a vitória do meu time, me entristeço com as derrotas, mas me dói demais deixar o campo ao som de cantorias homofóbicas geradas por essa atmosfera masculina, heteronormativa e machista, que ainda, infelizmente, predomina. Mas isso me serve como motor, como incentivo para fazer essa história, porque acho que a importância de se contar sobre a Coligay hoje em dia é para que sirva de parâmetro. Para que a gente perceba que, há quase 50 anos, existia uma torcida gay, que ia para o campo em busca de sentimento de pertencimento a um espaço democrático, que deve ser o esporte”, ponderou Santos.
Assim, o ator conta que se preparou para o papel pesquisando sobre tudo que podia sobre a histórica torcida. Além disso, ele conversou com algumas pessoas de Porto Alegre que lhe deram retornos interessantes sobre aquela época. Um aspecto crucial da preparação foi a imersão em Porto Alegre, tentando entender as memórias da Coligay que ainda permanecem na Capital e como acessá-las.
Assim, durante a gravação da série, Irandhir Santos afirma que trocou o rubro negro de seu amado Sport e passou a representar o tradicional azul, preto e branco do tricolor gaúcho. Neste período na capital gaúcha, o ator afirma que já visitou a Arena do Grêmio “pelo menos cinco vezes”, e descreveu a experiência como contagiante.
“Essa história é sobre paixão. Sobre alguém que era apaixonado pelo futebol e que resolveu fazer um grande movimento em relação a isso. E só é possível acessar essa paixão quando você entra numa arena e que você torce junto com o pessoal. Nosso elenco foi muito bem recebido pela torcida Tribuna 77. Chegamos meio acanhados e, de repente, ouvimos o hino da Coligay. Foi muito emocionante. Imagina você ouvir aquilo no estádio, em pleno jogo do Grêmio. É uma mistura onde a ficção e a realidade te envolvem e você apenas abre os poros, para receber isso e tornar isso material para o seu trabalho”, explicou Santos.
Por fim, o ator reforçou o caráter político do projeto. “O ato de coragem do Volmar e seus amigos em montar essa essa torcida em plena ditadura, adentrar nesse mundo tão preconceituoso que é o futebol, e se expressar a sua maneira por pura e simplesmente paixão pelo seu time, isso já é por si só um ato político. É um ato que gera as discussões de pertencimento, de direitos, direitos de igualdade, de respeitabilidade, da liberdade que o outro tem para se expressar. A partir desse ponto inicial de coragem desses formadores da Coligay, o processo político todo se desenvolve até hoje”, afirmou Santos.
A série ainda não tem previsão de lançamento. O set conta com cerca de 87 funcionários fixos, entre elenco e produção, além de figurantes, e as gravações seguem até 6 de novembro. O projeto contou com apoio institucional do Grêmio, que autorizou o uso da imagem, além de permitir a gravação de algumas cenas no pórtico do antigo Estádio Olímpico Monumental.

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