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Publicada em 27 de Agosto de 2025 às 00:05

Reforma tributária traz alívio para a indústria, mas pressiona setor de serviços e agronegócio

Ricardo Amorim prevê que o impacto esperado para o setor de serviços é de elevação média de até 30% nos custos ao longo da década

Ricardo Amorim prevê que o impacto esperado para o setor de serviços é de elevação média de até 30% nos custos ao longo da década

EVANDRO OLIVEIRA/JC
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Osni Machado
Osni Machado Colunista
A reforma tributária, em fase de implementação no Brasil, promete encerrar o imposto em cascata, considerado um dos principais entraves à competitividade da indústria nacional. Apesar do avanço, o economista Ricardo Amorim alerta, em entrevista para o JC Contabilidade, que os efeitos da mudança não serão igualmente positivos para todos os setores. Serviços e agronegócio tendem a arcar com aumento de carga tributária, o que pode gerar pressões sobre preços, emprego e investimentos nos próximos anos.
A reforma tributária, em fase de implementação no Brasil, promete encerrar o imposto em cascata, considerado um dos principais entraves à competitividade da indústria nacional. Apesar do avanço, o economista Ricardo Amorim alerta, em entrevista para o JC Contabilidade, que os efeitos da mudança não serão igualmente positivos para todos os setores. Serviços e agronegócio tendem a arcar com aumento de carga tributária, o que pode gerar pressões sobre preços, emprego e investimentos nos próximos anos.
O assunto também foi tema da palestra abordada por Amorim, durante o Seminário Jurídico, parte integrante da programação da 42ª Convenção Gaúcha de Supermercados, no Centro de Eventos da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), em Porto Alegre, no período de 19 a 21 de agosto. Evento realizado pela Associação Gaúcha de Supermercados (Agas). 
Em entrevista, na última quarta-feira (20), Amorim detalha que a reforma tributária será gradual, com transição de 10 anos, mas já antecipa ganhos importantes para a indústria, sobretudo a de cadeias produtivas longas. “O fim da tributação em cascata tende a reduzir custos e permitir maior agregação de valor, beneficiando empregos de maior qualificação”, cita. Por outro lado, o especialista diz que a neutralidade da arrecadação exigirá compensações: se a indústria pagará menos, serviços e agronegócio pagarão mais. Esse deslocamento, segundo ele, pode frear a criação de postos de trabalho no setor mais empregador do País.
Amorim também criticou a reforma tributária por não abordar previamente questões estruturais, como a redução de gastos públicos e reformas administrativa e previdenciária, que poderiam gerar benefícios à indústria sem prejudicar outros setores. Segundo ele, o Brasil gasta atualmente quase R$ 1 trilhão com programas sociais mal planejados e mantém despesas elevadas no funcionalismo público. Apesar disso, a mudança promete reduzir a carga tributária da indústria em aproximadamente R$ 500 bilhões, mas com transferência de ônus para comércio e serviços, afetando emprego e renda.
O impacto esperado para serviços é de elevação média de até 30% nos custos ao longo da década, o que equivale a 3% ao ano. Diante da baixa produtividade brasileira, dificilmente as empresas conseguirão compensar integralmente essa alta sem repassar valores para os consumidores ou reduzir despesas, especialmente com mão de obra. O resultado provável, de acordo com Amorim, será uma combinação de inflação maior, cortes de vagas e pequenas melhorias de eficiência.
Estados e municípios também enfrentarão desequilíbrios. Embora a reforma seja neutra em termos de arrecadação geral, a União tende a ampliar receitas, enquanto governos estaduais, de forma agregada, devem perder. O risco, aponta Amorim, é que essa diferença gere pressões políticas por compensações futuras, o que pode resultar em novas elevações de impostos. Para ele, a falta de uma reforma administrativa e previdenciária prévia limita o alcance positivo da mudança tributária.
No caso do Rio Grande do Sul, onde o agronegócio é base da economia, os efeitos devem ser sentidos com mais intensidade. Além da alta de tributos, produtores e indústrias locais enfrentam ainda barreiras externas, como tarifas impostas pelos Estados Unidos em determinados segmentos. Amorim projeta que, de forma geral, o impacto sobre o PIB será menor que o previsto, com efeito positivo na inflação, taxa de juros e poder de compra, beneficiando o setor supermercadista.
Os contadores, segundo Amorim, têm papel decisivo nesse cenário. A complexidade das regras e a proximidade do início das mudanças criam a maior oportunidade de negócios já vivida pela categoria, que deve orientar empresas sobre impactos e ajustes necessários. Para isso, associações contábeis são chamadas a ampliar a comunicação com clientes e a sociedade, não apenas em eventos internos, mas em iniciativas de esclarecimento e capacitação abertas ao mercado.
O debate jurídico da convenção contou ainda com Fábio Canazaro, advogado tributarista, que destacou a importância de os empresários estarem atentos à readequação de notas fiscais e outras obrigações; Fernando Pergher, sócio da KPMG, sobre a antecipação do recolhimento de tributos; Vanderlei Goulart, da Meta Assessoria, apontando a unificação de PIS, Cofins, ICMS e ISS como simplificação importante; e Flávio Obino, sócio da Obino Advogados, que reforçou a não cumulatividade dos impostos e a importância de créditos tributários na redução da carga fiscal.
Outro ponto abordado pelo economista é o contexto macroeconômico. Apesar das incertezas, o Brasil tem registrado crescimento acima das previsões nos últimos cinco anos, impulsionado por fatores externos como alta de commodities e liquidez internacional. Esse desempenho, no entanto, não é resultado de reformas estruturais internas. Para garantir sustentabilidade, Amorim defende investimentos em produtividade, educação e redução do peso do Estado, sob pena de o País repetir ciclos de estagnação quando o cenário global se alterar.
Além da reforma tributária, a transformação tecnológica foi apontada como elemento central para o futuro das empresas. Para Amorim, a Inteligência Artificial (IA) é a maior revolução desde a eletricidade, com potencial de redefinir processos, carreiras e modelos de negócios. Quem não se adaptar, alerta, corre o risco de fechar as portas. Por outro lado, os que se prepararem poderão transformar as mudanças em oportunidades de crescimento e competitividade.

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