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Publicada em 11 de Julho de 2025 às 17:17

A confeitaria que une mulheres na Comunidade São Pedro

Curso, que é realizado nas quintas-feiras à noite, promove inclusão e geração de renda para moradoras da Comunidade São Pedro, em Porto Alegre

Curso, que é realizado nas quintas-feiras à noite, promove inclusão e geração de renda para moradoras da Comunidade São Pedro, em Porto Alegre

Gabrieli Silva/especial/JC
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Gabrieli Silva
Gabrieli Silva
Às quintas-feiras à noite, enquanto Porto Alegre se recolhe ao frio da temporada mais gelada do ano, uma cena quente se repete com afeto e fermento na sede do Instituto Vida Solidária (IVS), no bairro Partenon. Um grupo de mulheres da Comunidade São Pedro se reúne em torno de uma mesa com toucas na cabeça, risadas soltas e o olhar atento para o que está sendo misturado, recheado e montado. Em comum, carregam não apenas o desejo de aprender confeitaria profissional, mas também a vontade de transformar a rotina com açúcar, farinha e parceria.
Às quintas-feiras à noite, enquanto Porto Alegre se recolhe ao frio da temporada mais gelada do ano, uma cena quente se repete com afeto e fermento na sede do Instituto Vida Solidária (IVS), no bairro Partenon. Um grupo de mulheres da Comunidade São Pedro se reúne em torno de uma mesa com toucas na cabeça, risadas soltas e o olhar atento para o que está sendo misturado, recheado e montado. Em comum, carregam não apenas o desejo de aprender confeitaria profissional, mas também a vontade de transformar a rotina com açúcar, farinha e parceria.
Naquela cozinha iluminada, a confeitaria deixa de ser apenas técnica e passa a ser linguagem: uma forma de dizer "eu posso", "eu sei", "eu também mereço". É ali que, durante cinco encontros, acontece o curso promovido pelo IVS em parceria com o Instituto Gourmet, com aulas práticas ministradas pela confeiteira profissional Gabriela Francio.
"A maioria já fazia bolos em casa, para os filhos, para as festas da família. Aqui, elas estão sistematizando um saber que já era delas", conta a professora, emocionada ao relatar que, em uma semana particularmente difícil, foi acolhida pelas alunas com carinho. "Elas me fizeram sorrir, me senti parte."
Algumas mulheres chegam acompanhadas dos filhos, que se distraem entre as bancadas enquanto as mães testam novas receitas. No cardápio, bolos clássicos como o de cenoura com brigadeiro, brownie e o Red Velvet se misturam a tortas sofisticadas, como a de frutas vermelhas com branquinho. Mas o que se cozinha ali vai além: são também vínculos, autoestima, escuta.
"A gente mal se fala na comunidade, é só oi e tchau. Aqui, viramos amigas. Já estamos até combinando um churrasco com a professora", ri Raiane Silvya, 20 anos, dona de casa, mãe e uma das participantes mais entusiasmadas da turma.
Ela conta que sua filha é sua maior inspiração, e que pretende usar a confeitaria como fonte de renda. "Sou apaixonada por doces e salgados. Quero poder dar um futuro melhor para minha filha. Aqui eu me sinto viva, estou aprendendo e sonhando." Raiane conta, também, que cresceu naquele espaço, fez curso de Jiu-Jitsu e ficou no contraturno dos 6 aos 11 anos. Ela já até vendeu um bolo de morango com brigadeiro branco que aprendeu no curso.
Para outras, o curso representa também uma forma de terapia e pertencimento. "Não é por renda, é mais por mim. É terapêutico. Como meu filho é autista, não tenho muito tempo para trabalhar fora, então esse momento é só meu", diz Paola Lucero.
Terezinha de Jesus, 60 anos, moradora da comunidade há três décadas, resume com delicadeza o impacto de estar ali:
"A gente se conhece, mas ninguém vai na casa da outra. Aqui, a gente divide experiências. Eu já fazia bolos, mas vim aperfeiçoar. Vale a pena por estar com outras mulheres."
O curso foi viabilizado por meio de recursos da Vara de Execuções Penais e Medidas Alternativas, que destina verbas de penas pecuniárias para projetos de impacto social. A intenção do IVS é promover novas edições, conforme houver financiamento.
 

Instituto Vida Solidária nasce da Medicina e se enraíza na comunidade

Espaço também trabalha com saúde, educação e cidadania para as famílias

Espaço também trabalha com saúde, educação e cidadania para as famílias

Gabrieli Silva/JC
O Instituto Vida Solidária é mantido pela Associação Médica do Rio Grande do Sul (Amrigs) e atua há duas décadas como braço social da entidade. Sua sede, ao lado da Comunidade São Pedro, é um espaço onde saúde, educação, cidadania e convivência se entrelaçam. Atualmente, o IVS atende cerca de 400 famílias com oficinas, atividades culturais, atendimento médico e psicossocial, turno inverso para crianças de 6 a 11 anos, além de projetos voltados à infância, juventude e adultos em situação de vulnerabilidade.
Segundo Dilma Tessari, presidente do IVS, a missão da instituição é clara: promover dignidade e inclusão por meio de ações que transcendam a assistência e ampliem horizontes.
"A formação também é cuidado. Ao capacitar essas mulheres, estamos cuidando da saúde mental delas, fortalecendo vínculos sociais e gerando esperança. Isso é Medicina social, é compromisso com o bem-estar em sua forma mais ampla."
Com uma trajetória que começou pequena e hoje se consolida como referência em responsabilidade social, o IVS mostra como o conhecimento — mesmo o que começa com açúcar e farinha — pode mudar destinos. E como a atuação médica pode (e deve) ir além dos consultórios e hospitais, chegando ao território onde a vida acontece com todas as suas dores, delícias e possibilidades.

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