Uma lâmpada acesa pode parecer algo trivial para quem vive conectado à rede elétrica. Mas, em muitos cantos do Brasil e do mundo, acender a luz é um marco de transformação profunda. É esse impacto que move o trabalho do engenheiro agrônomo Fábio Rosa, fundador do Instituto Ideaas - Instituto para o Desenvolvimento de Energias Alternativas e da Auto Sustentação. Com sede em Porto Alegre, o Instituto nasceu da convicção de que energia é mais do que infraestrutura: é um direito e uma chave para superar desigualdades.
A semente desse trabalho foi lançada entre os anos de 1983 e 1988, quando Fábio Rosa, então recém-formado em Agronomia, levou energia elétrica de baixo custo a pequenos agricultores de Palmares do Sul, no Interior do Rio Grande do Sul. Utilizando um sistema simplificado de eletrificação rural, ele viabilizou acesso à irrigação, refrigeração e informação em regiões antes esquecidas pelo Estado. A iniciativa não apenas transformou a economia local, como se tornou referência nacional, servindo de base para a criação do programa Luz para Todos, lançado pelo governo federal em 2003. Esse primeiro projeto marcou o início de uma trajetória que alia engenhosidade técnica, inovação acessível e compromisso com a justiça social.
Criado no início dos anos 2000, o instituto acredita que energia não é apenas um direito básico, mas uma base para garantir educação, saúde, segurança e qualidade de vida. Seus projetos utilizam principalmente sistemas solares fotovoltaicos em regiões onde o acesso à energia é limitado ou inexistente.
"Energia não é só luz, é ferramenta de transformação social", defende Rosa. Para ele, cada instalação representa muito mais do que tecnologia: é a chance de uma criança estudar à noite, de uma mãe cozinhar com segurança, de um agricultor ampliar sua produção e de uma comunidade construir autonomia.
Um dos principais programas do Instituto é o Ilumine a Sua Vida, que leva energia solar a famílias em áreas isoladas. A iniciativa elimina o uso de lampiões e velas, reduzindo riscos de incêndios e problemas respiratórios, além de gerar economia no orçamento familiar. "Quando uma família acende uma luz pela primeira vez, o impacto é emocional, educacional, econômico", resume o fundador.
A atuação do Ideaas também ultrapassa fronteiras. Em parceria com organizações internacionais, o Instituto levou energia solar ao campo de refugiados de Kakuma, no Quênia. A experiência levou dignidade a milhares de pessoas em situação de extrema vulnerabilidade. Mais do que a instalação dos equipamentos, o projeto capacita os próprios moradores para manter e cuidar dos sistemas, garantindo autonomia e continuidade. "Não levamos só o equipamento, levamos conhecimento para que eles cuidem e se apropriem da tecnologia", completa.
Neste ano, o Instituto Ideaas também realizou a instalação de sistemas de energia solar no Quilombo dos Machado, localizado no bairro Sarandi, em Porto Alegre. A comunidade, duramente afetada pelas enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul, passou a contar com pontos de iluminação solar distribuídos em ruas e áreas estratégicas.
A ação foi viabilizada graças à doação de kits de iluminação solar pela empresa Signify, especializada em soluções de luz e conectividade. O material incluía lâmpadas solares portáteis, pequenas placas fotovoltaicas e lanternas recarregáveis, utilizadas de forma emergencial, especialmente nos períodos de interrupção do fornecimento de energia elétrica causados pelos eventos climáticos extremos.
Segundo Fábio Rosa, a escolha pelo Quilombo dos Machado se deve à forte organização comunitária local e à condição de território tradicional em situação de vulnerabilidade. "Levar energia solar para o quilombo foi uma forma de apoiar uma comunidade que resiste historicamente às violações de direitos e que, mais uma vez, esteve entre as mais afetadas pela crise climática", afirmou.
A importância da iniciativa é reforçada por Rogério Machado, conhecido como "Jamaica", liderança do quilombo. "Como ainda estamos em processo de regularização fundiária, muitas coisas não chegam até aqui. A luz e a água, por exemplo, são garantidas por nós mesmos. A iluminação solar tem um papel fundamental porque vem do sol, é nossa, fortalece a comunidade", afirma. "Essas lâmpadas continuam funcionando mesmo quando a energia convencional cai, então conseguimos manter as ruas e os acessos iluminados. Isso traz mais segurança e dignidade para quem vive aqui." Segundo ele, das 53 lâmpadas previstas inicialmente, cerca de 20 já chegaram à comunidade. A instalação vem sendo realizada de forma progressiva, priorizando os pontos mais escuros e de maior circulação.
O modelo de atuação do Ideaas une inovação, sustentabilidade e impacto social direto. Ao apostar em soluções adaptadas à realidade local, o Instituto demonstra que a responsabilidade social pode - e deve - andar junto com o combate às desigualdades e à crise climática. "A verdadeira inovação está em ouvir as necessidades das pessoas e usar a tecnologia como ponte para a dignidade", conclui Rosa.
Além do impacto social direto, o uso de fontes renováveis como a energia solar desempenha um papel central na luta contra as mudanças climáticas. Ao substituir o uso de combustíveis fósseis - ainda predominantes em muitas áreas isoladas - os sistemas solares contribuem para a redução das emissões de gases de efeito estufa. Cada kit fotovoltaico instalado em uma residência evita, em média, a emissão de centenas de quilos de CO₂ por ano, o equivalente ao plantio de dezenas de árvores. No Brasil, o acesso à energia elétrica é quase universal, com apenas 0,2% dos domicílios sem acesso em 2023. Entretanto, regiões como a Amazônia ainda enfrentam desafios significativos, com cerca de um milhão de pessoas vivendo sem eletricidade.