Suzana Vellinho Englert
Peço desculpas ao caro leitor. Diferentemente do que o título possa dar a entender, este artigo não é sobre apontar o dedo a alguém. Pelo contrário, é sobre colocar a mão na consciência — na minha e, quem sabe, na sua.
A vantagem de não ter nascido ontem é a capacidade de lembrar. Até agora, a grande referência de eventos climáticos foi a cheia de 1941. Lá se vão 83 anos de comparações com o fato que marcou gerações e mudou os rumos de Porto Alegre e outras cidades.
Alguém duvida que, a partir de agora, o grande marco de catástrofes naturais será 2024? Com o impacto de 90% dos municípios gaúchos, estamos diante de um fenômeno absolutamente paradigmal, que precisa ser avaliado em toda sua excepcionalidade. Caso contrário, o risco de cometermos injustiças é imenso.
Além de ter arrasado comunidades inteiras, as enchentes estão fazendo, por exemplo, o Aeroporto Salgado Filho — administrado por uma das mais competentes empresas multinacionais do setor — fechar suas portas até dezembro. Do mesmo modo, prédios erguidos por construtoras renomadas estão igualmente interditados. Muito mais do que discutir eventuais problemas de gestão, nossa energia deve estar em construir soluções diante de uma nova e dura realidade.
O prefeito de Porto Alegre tem buscado fazer o melhor, assim como outros prefeitos, o governador, os servidores e tantas outras lideranças. Nós todos, como sociedade, estamos fazendo tudo que está ao nosso alcance — milhares de herois anônimos se dedicaram a ajudar de maneira incansável e inspiradora. A sinergia dos resgates que salvaram vidas precisa seguir para a retomada.
A posição de crítico que algumas pessoas assumem se revela em passividade, enquanto a posição do colaborativo é propor soluções. Estamos propondo a resolução de um sistema. Não igual ao que era, mas, mediante as circunstâncias, de avaliarmos os parâmetros mais evoluídos dos que os vividos na enchente de 1941 e fazermos diferente. Afinal, que consciência social e ambiental queremos e devemos ter?
Antes de antecipar debates eleitorais ou aderir à sanha condenatória digital, sigamos trabalhando juntos. Além de inócuo — e, por vezes, injusto —, apontar culpados nos trava naquilo que é mais relevante neste momento: reconstruir, aprender, ter empatia e reinventar.
O ano de 2024 jamais será esquecido pela tragédia. Que seja também lembrado por ter sido um ano em que evoluímos tanto em nossa preparação para fenômenos naturais quanto em nossa capacidade de trabalhar juntos pelo interesse de todos.
Presidente da Associação Comercial de Porto Alegre (ACPA)