Após reuniões entre o prefeito de Bagé, Luiz Fernando Mainardi (PT) e conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) na terça-feira (6) em Porto Alegre, foi fechado um acordo para que a administração municipal reduza os gastos com pessoal, que em 2024, segundo auditoria do órgão, comprometeram 69,52% da Receita Corrente Líquida (RCL) do município — o índice mais alto entre todas as cidades gaúchas. O objetivo da atual gestão é reconduzir esse percentual ao limite legal de 54%, conforme estabelece a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Para evitar o colapso nas finanças, o TCE determinou que a prefeitura suspenda os pagamentos de reajustes seletivos concedidos em leis municipais recentes, interrompa nomeações para cargos criados ilegalmente e apresente um plano de compensação para despesas extras com pessoal. A Corte de Contas ainda apontou a possibilidade de instaurar um processo de tutela de urgência para barrar qualquer medida que amplie os gastos.
Mainardi defende que a reversão ocorra de maneira gradual. “Assim como levaram cinco anos para levar o índice de 52% a 70%, queremos usar os próximos anos para retornar ao patamar legal. Mas isso precisa ser feito com responsabilidade, sem penalizar quem trabalha e sem prejudicar ainda mais os serviços públicos”, declarou.
A situação fiscal de Bagé é considerada crítica pelo TCE, que emitiu um relatório de 22 páginas apontando irregularidades na condução financeira da prefeitura na gestão anterior, do ex-prefeito Divaldo Lara (PRD), que governou a cidade entre dois mandatos entre 2017 e 2024. O documento menciona que, entre 2021 e 2024, o governo municipal não apenas ignorou os limites legais, mas promoveu reajustes salariais seletivos e criou cargos comissionados em período vedado por lei, elevando de forma expressiva os gastos com pessoal. O crescimento ocorreu em ritmo muito superior ao aumento da receita.
Mainardi detalhou os primeiros passos que pretende dar para sanar a situação. “Recebemos a prefeitura com R$ 215 milhões em restos a pagar, além de R$ 275 milhões de dívida fundada. O gasto com pessoal estava completamente fora do controle”, disse. “Nos deram cinco dias para apresentar um plano de ação. Pedi mais cinco. Em até dez dias, teremos um plano estruturado para iniciar esse processo”, garantiu.
O prefeito também informou que a atual gestão já começou a cortar despesas. Dos cerca de 400 cargos em comissão existentes no governo anterior, apenas 160 foram mantidos. As funções gratificadas foram reduzidas de mais de 400 para 50. O pagamento de horas extras foi suspenso, e uma nova legislação acabou com o pagamento em pecúnia de licenças-prêmio. "Essas medidas já representam avanços importantes rumo à responsabilidade fiscal", afirmou.
O relatório do TCE sustenta que o elevado comprometimento da RCL com a folha de pagamento teve impactos diretos na prestação de serviços públicos, principalmente nas áreas de saúde e educação. Com menos recursos disponíveis, o município enfrentou dificuldades para ampliar a cobertura da atenção básica, manter estoques de medicamentos e realizar investimentos na infraestrutura escolar.
Ainda segundo o documento, Bagé está em situação fiscal pior do que qualquer outro município do Estado. O segundo município com maior comprometimento da receita com pessoal é Caçapava do Sul, com 59,92%, quase dez pontos percentuais abaixo de Bagé. Osório, terceiro colocado, tem índice de 57,31%.
Ex-prefeito se manifesta pelas redes sociais
Antes da reunião de Mainardi com o TCE, em 26 de abril, Divaldo Lara havia postado, em suas redes sociais, um vídeo de 1 minuto e meio criticando o atual prefeito pelas medidas em relação ao pagamento do funcionalismo municipal. Ele não foi localizado pela reportagem. Em entrevista ao jornal Zero Hora veiculada na segunda-feira (6), Lara justificou o crescimento nas despesas alegando que pagamentos extras feitos para o fundo de aposentadoria dos servidores forem contabilizados como despesa de pessoal, por exigência da Lei Complementar Federal nº 178/2021. Ainda segundo Lara, a nomeação de novos servidores eram uma estratégia para dar fôlego às finanças do município para que os novos funcionários passassem a contribuir para o fundo de previdência.