Enquanto alguns estados já utilizam Inteligência Artificial (IA) combinada com reconhecimento facial em operações de segurança pública, o Rio Grande do Sul ainda está estruturando o sistema que poderá viabilizar esse tipo de tecnologia. Uma portaria do Ministério da Justiça publicada no final de junho autorizou o uso, em situações específicas, de sistemas com IA capazes de identificar pessoas a partir da análise de imagens, mas, por ora, não há previsão de implantação no território gaúcho.
No Estado, o reconhecimento facial ainda não é utilizado de forma integrada nem mesmo em sua forma mais tradicional, sem apoio de IA. Segundo a Secretaria da Segurança Pública (SSP-RS), está em andamento uma licitação para integrar os sistemas de videomonitoramento já existentes em diversos municípios. A previsão é que essa rede unificada esteja operando até o fim de 2025. Nela, poderá haver pontos com reconhecimento facial, mas isso não significa que será feita a aplicação de inteligência artificial.
“Não existe uma Inteligência Artificial sendo criada especificamente para reconhecimento facial. A IA é uma ferramenta usada em várias frentes, como leitura de placas ou geração de relatórios. Mas, no caso das câmeras, o que está sendo feito é a integração dos sistemas”, explicou o órgão. A preocupação da pasta é evitar interpretações equivocadas de que o Estado esteja implantando soluções automatizadas para reconhecimento de rostos - o que, de fato, não está ocorrendo.
Porém, mesmo sem uso direto em câmeras, a IA aparece em outras áreas da segurança pública no Rio Grande do Sul. Na Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos, por exemplo, ferramentas baseadas com essa tecnoloia têm sido fundamentais para acelerar análises técnicas. Recentemente, o uso auxiliou à Polícia Civil a identificar um hacker envolvido em um ataque contra o Tribunal de Justiça.
“A IA nos permitiu cruzar informações e rastrear o caminho do ataque de forma muito mais rápida. Com dados como IPs e logs, conseguimos identificar o responsável em tempo recorde”, afirmou o delegado Marcos de David. Segundo ele, ferramentas similares também são usadas para processar grandes volumes de dados, como registros de ligações e localização de antenas telefônicas. “Era um trabalho que antes levava semanas. Hoje, conseguimos resolver em uma tarde”, comenta.
A portaria do Ministério da Justiça permite o uso de reconhecimento facial com IA em investigações criminais autorizadas previamente, buscas por desaparecidos e recaptura de foragidos. Fora dessas hipóteses, a norma exige justificativas técnicas e estudos de impacto, com foco na proteção dos direitos fundamentais. A proposta é evitar abusos e padronizar o uso da tecnologia no País.
Em São Paulo, a capital já implementou um sistema desse tipo. O programa Smart Sampa conta com mais de 31 mil câmeras espalhadas pela cidade, com IA capaz de identificar pessoas foragidas ou desaparecidas a partir da comparação facial. Desde o início da operação, até abril deste ano, o sistema permitiu a prisão de mais de mil foragidos e a localização de 60 pessoas desaparecidas. Os alertas são acionados apenas quando a correspondência facial supera 92% de confiança.
A diferença entre o uso com ou sem IA é técnico, mas importante. O reconhecimento facial tradicional se baseia em algoritmos fixos, como a distância entre olhos e o formato do queixo. Já os sistemas com IA são treinados com milhares de imagens e aprendem a reconhecer rostos mesmo com variações de iluminação, ângulo ou envelhecimento. A tecnologia é mais precisa, mas também levanta preocupações éticas.
No Rio Grande do Sul, a prioridade por enquanto é tornar os sistemas existentes compatíveis entre si. A meta inicial da SSP é permitir que qualquer agente de segurança possa acessar as imagens de diferentes municípios. O uso de reconhecimento facial com IA, se vier a acontecer, ficará para um segundo momento.