Porto Alegre,

Anuncie no JC
Assine agora

Publicada em 12 de Julho de 2025 às 14:02

Desatenção, inquietude e impulsividade? Saiba o que é TDAH

"O TDAH pode impactar a autoestima, relacionamentos interpessoais e a organização da vida diária", destaca o médico Antônio Geraldo, da Associação Brasileira de Psiquiatria

"O TDAH pode impactar a autoestima, relacionamentos interpessoais e a organização da vida diária", destaca o médico Antônio Geraldo, da Associação Brasileira de Psiquiatria

Freepik/Divulgação/JC
Compartilhe:
Luana Pazutti
Luana Pazutti
Muito provavelmente você já ouviu a frase “hoje em dia, todo mundo tem TDAH”. Se não, certamente já escutou que o transtorno é uma “invenção da modernidade” ou, pior ainda, que “esse tal de TDAH nem sequer existe”.
Muito provavelmente você já ouviu a frase “hoje em dia, todo mundo tem TDAH”. Se não, certamente já escutou que o transtorno é uma “invenção da modernidade” ou, pior ainda, que “esse tal de TDAH nem sequer existe”.
O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) está cada vez mais popular na boca do povo. Isso, contudo, não significa que a desinformação deixou de ser um problema. Pelo contrário, ainda há um longo caminho para fomentar a conscientização e incentivar a busca por diagnóstico.

Eis aí, o papel do Dia Internacional do TDAH, que é celebrado neste domingo, dia 13 de julho.
Mas, afinal, o que realmente significam essas quatro letras?

Para além de uma simples falta de atenção
Embora o nome possa indicar o contrário, engana-se quem pensa que o TDAH consiste necessariamente na falta de atenção. Na verdade, na maioria das vezes, trata-se de uma dificuldade de controlá-la ou direcioná-la para determinadas tarefas. Mas, ainda pode incluir uma série de outras manifestações.

Afinal, esse transtorno neurobiológico de desenvolvimento é caracterizado por um padrão persistente de sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade, que podem se apresentar de maneira conjunta ou isolada.

Além da dificuldade em prestar atenção a detalhes e manter o foco, os sintomas de desatenção incluem “cometer erros por descuido, não seguir instruções, esquecer tarefas, perder objetos com frequência, evitar atividades que exigem esforço mental prolongado”, destaca o médico Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Já os sintomas de hiperatividade e impulsividade costumam se caracterizar pela sensação constante de “estar a mil por hora”. “Agitação nas mãos e pernas, falar em excesso, correr em demasia, dificuldade em esperar a vez, interromper os outros e agir sem pensar nas consequências” são alguns dos sinais apontados pelo especialista.

Na prática, os efeitos desses sintomas são diversos. “O TDAH pode impactar a autoestima, relacionamentos interpessoais, a organização da vida diária como finanças e prazos, o controle das emoções e também maior risco de acidentes domésticos e uso abusivo de substâncias”, destaca o psiquiatra.

Na linha tênue entre a genética e o ambiente
Não há consenso sobre as causas exatas do TDAH, mas há evidências de que a condição é fruto de uma mistura de fatores genéticos e ambientais. Ou seja, para além de anomalias nos neurotransmissores, o TDAH é influenciado por uma série de outros fenômenos de desenvolvimento.

De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, estudos sugerem que hábitos pré-natais, incluindo consumo de álcool e tabaco, hipertensão, pré-eclâmpsia e estresse durante a gestação e após o nascimento podem favorecer a manifestação do transtorno.

Baixo peso ao nascer, prematuridade, adversidades familiares e maus-tratos também podem aumentar o risco de desenvolvimento do transtorno”, completa o psiquiatra.

“Mas, será que eu tenho TDAH?”
O diagnóstico do TDAH é basicamente clínico. Em outras palavras, não há exames laboratoriais que acusem a presença do transtorno. A investigação é baseada na entrevista psiquiátrica e na avaliação das observações comportamentais relatadas pelo paciente e por pessoas de seu convívio, incluindo pais e professores.

Não é à toa que o TDAH pode ser confundido com uma série de outras condições, incluindo transtornos de ansiedade, humor ou aprendizagem, como a dislexia. "É preciso estar atento aos sinais”, aponta o médico. Entre os pontos de atenção, destacam-se prejuízos no desempenho escolar ou profissional, esquecimentos frequentes, impulsividade e dificuldades persistentes em concluir tarefas.

“Quando afeta a vida diária da pessoa, é recomendável buscar um psiquiatra para uma avaliação. Quanto antes o diagnóstico for feito, melhor o prognóstico e consequentemente melhor será a qualidade de vida do indivíduo”, destaca Antônio Geraldo.

Embora o diagnóstico do transtorno possa ser efetuado em qualquer idade, o ideal é que seja feito na infância. De qualquer maneira, o psiquiatra afirma que até diagnósticos tardios exigem o mapeamento e a confirmação de sintomas na infância.

Feito o diagnóstico, o próximo passo é o tratamento, que, apesar de ser essencialmente medicamentoso, costuma envolver uma abordagem multidisciplinar. Além de acompanhamento psicológico, mudanças no estilo de vida, com a adoção de hábitos mais saudáveis, podem ser bastante benéficas.

Um longo caminho pela frente
Quando se trata de conscientização, ocorreram muitos avanços nas duas últimas décadas. No Brasil, criou-se a Lei 14.254, também conhecida como Lei do TDAH e Outros Transtornos de Aprendizagem, em dezembro de 2021.

A legislação determina que, ao identificar sinais precoces, escolas públicas e privadas devem encaminhar os estudantes para diagnóstico do TDAH com os psiquiatras da rede de saúde. Também prevê o desenvolvimento e a manutenção de um programa de acompanhamento.

Há ainda, contudo, uma longa trajetória para assegurar qualidade de vida digna aos portadores do transtorno. Embora seja inclusive reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e esteja presente na Classificação Internacional de Doenças (CID) como um transtorno psiquiátrico, o TDAH ainda é alvo de uma série de preconceitos.

Para Antônio Geraldo, “as informações errôneas compartilhadas em redes sociais” são grandes agravantes para esse cenário. O médico destaca que os portadores dessa condição tendem a ser vistos como “indisciplinados” ou simplesmente "mal criados". E, não para por aí.
O TDAH ainda sofre com os boatos e estigmas que cercam os temidos medicamentos controlados, que geralmente incluem componentes estimulantes. Embora sejam comprovadamente benéficas, desde que usadas com responsabilidade e orientação, as fórmulas costumam assustar as famílias, afastando-as da busca por um psiquiatra e contribuindo para a manutenção do subdiagnóstico no País
Por outro lado, o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria destaca que há uma tendência exagerada de patologização de sintomas normais da experiência humana. A busca por uma justificativa para todo e qualquer comportamento um pouco "fora do prumo" acaba favorecendo "diagnósticos errados ou superficiais e, por consequência, descredibilizam os verdadeiros casos”, completa Geraldo.
E, é daí que vem a famosa ideia errada de que "todo mundo tem TDAH". Mas, na próxima vez que ouvir isso, você já vai poder dizer que, na verdade, não é bem assim

Notícias relacionadas