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Publicada em 11 de Junho de 2025 às 20:38

Solteiros já são maioria no Brasil e relações duradouras ficam cada vez mais raras

Especialista aponta que excesso de conexões digitais tem dificultado vínculos mais profundos

Especialista aponta que excesso de conexões digitais tem dificultado vínculos mais profundos

EVANDRO OLIVEIRA/JC
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Gabriel Margonar
Gabriel Margonar
Neste Dia dos Namorados, uma reflexão: o número de brasileiros solteiros já supera o de casados, segundo dados do IBGE de 2023. São mais de 81 milhões vivendo sem união formal, ante cerca de 63 milhões com vínculo registrado. Em paralelo, cresce o total de lares com apenas um morador, que já passam de 11 milhões no País.
Neste Dia dos Namorados, uma reflexão: o número de brasileiros solteiros já supera o de casados, segundo dados do IBGE de 2023. São mais de 81 milhões vivendo sem união formal, ante cerca de 63 milhões com vínculo registrado. Em paralelo, cresce o total de lares com apenas um morador, que já passam de 11 milhões no País.
O Rio Grande do Sul tem um dos maiores percentuais de domicílios unipessoais, com 22,3% da população vivendo sozinha. Em Porto Alegre, a proporção chega a 29%, a mais alta entre todas as capitais. Os dados revelam uma mudança significativa no modo de viver, e de se relacionar.
Em um mundo onde quase tudo pode ser resolvido por uma mensagem instantânea, cresce a sensação de que, apesar de hiperconectadas, as pessoas estão emocionalmente mais distantes. A facilidade para conhecer alguém por meio de aplicativos contrasta com a dificuldade de construir vínculos afetivos mais profundos, estáveis e duradouros.
"As pessoas estão tendo mais dificuldade de se relacionar afetivamente nos dias de hoje. Há uma sensação generalizada de frustração e solidão, mesmo entre quem está cercado de conexões virtuais", analisa o psiquiatra Thiago Roza, professor da Universidade Federal do Paraná.
Para ele, as redes sociais e os aplicativos de relacionamento são parte central dessa dinâmica. De um lado, oferecem um universo de possibilidades. De outro, criam um ambiente de comparação constante, descartabilidade e idealização.
"Há uma ilusão de abundância. As pessoas acham que podem sempre encontrar alguém 'melhor', mais alinhado com suas expectativas. Isso gera um paradoxo: quanto mais opções, mais difícil escolher. E mais fácil desistir também", explica.
Essa lógica, segundo Roza, alimenta um tipo de envolvimento que ficou conhecido como situationships (relações indefinidas, no português), em que não há compromisso claro entre as partes. Apesar de parecerem leves ou práticas, essas relações muitas vezes geram frustração.
"Alguém acaba se envolvendo mais do que o outro. Mas como não há clareza ou profundidade, o vínculo se rompe rápido e sem espaço para amadurecimento. A repetição disso leva muita gente a evitar novas tentativas", completa o psiquiatra.
É o que também percebe o estudante Thomas Cardoso, 27 anos, morador de Porto Alegre. Solteiro, ele conta que prefere relações casuais — e que, por escolha pessoal, evita vínculos mais longos. Mesmo assim, reconhece que há um certo esgotamento na forma como as conexões se dão hoje.
"Já aconteceu de eu me envolver com alguém e perceber que a pessoa queria algo mais sério. Isso me trava. Prefiro deixar claro, desde o início, que busco algo leve. É uma forma de alinhar expectativas e evitar mágoas", conta ele, que diz usar tanto redes sociais quanto aplicativos para conhecer pessoas.
Nesse sentido, Roza observa que principalmente após a pandemia da Covid-19, cresceu o número de pacientes relatando um medo em comum: de se apegar, se mostrar vulnerável e reviver dores antigas. Isso se manifesta em comportamentos mais frios, distantes - um "afeto blindado", que funciona como proteção, mas também como barreira.
"Criar vínculos exige exposição, escuta e flexibilidade. Mas hoje tudo está acelerado e fragmentado. As pessoas estão mais intolerantes à frustração, e os vínculos, menos capazes de se sustentar", diz o psiquiatra.
Apesar do cenário, ele acredita que é possível reverter esse afastamento. O primeiro passo, segundo ele, é simples: sair do digital e voltar a ocupar espaços compartilhados, como cursos, grupos esportivos e rodas de conversa. Lugares em que as relações possam se desenvolver fora da lógica da performance e da pressa devem ser priorizados.
 

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