Diante do aumento expressivo nas hospitalizações por doenças respiratórias, sobretudo entre crianças, o governo do Rio Grande do Sul decretou, nesta segunda-feira, situação de emergência em saúde pública por 120 dias. A medida, que será publicada no Diário Oficial do Estado na terça, tem como objetivo reforçar a rede hospitalar e evitar a sobrecarga do Sistema Único de Saúde (SUS), já pressionado pela epidemia de dengue, especialmente em Porto Alegre e na Região Metropolitana.
A decisão ocorre em meio ao agravamento do cenário epidemiológico. Desde o início do ano, o Rio Grande do Sul já contabilizou 4.099 hospitalizações por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), de acordo com dados do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs). Desse total, 305 pacientes morreram. Um terço das internações (1.374) envolvem crianças com menos de cinco anos — faixa etária que também responde por 10 dos óbitos.
Com o decreto, hospitais que atendem pelo SUS passam a ter a obrigatoriedade de ampliar leitos clínicos e de terapia intensiva voltados ao tratamento da SRAG, causada por vírus como influenza, covid-19 e o vírus sincicial respiratório (VSR). O reforço inclui suporte ventilatório e expansão da capacidade em UTIs, especialmente na rede pediátrica.
A medida também permite que os municípios adotem ações emergenciais com maior rapidez, como a contratação de profissionais de saúde e a compra de insumos. Estado e prefeituras ainda podem solicitar recursos ao Ministério da Saúde para a criação de leitos voltados ao atendimento de pacientes com síndrome respiratória aguda grave.
O avanço das infecções tem sido rápido. Em um intervalo de cinco semanas, o número de hospitalizações por SRAG mais que dobrou: foram 194 registros na Semana Epidemiológica 14 (de 31 de março a 5 de abril), 392 na Semana 18 (de 28 de abril a 3 de maio) e 451 na Semana 19 (de 4 a 10 de maio). Os dados da Semana 20 ainda estão em consolidação, mas a expectativa é de crescimento.
"A circulação simultânea de vários vírus, somada à chegada do frio, agrava ainda mais o cenário. Estamos vendo um crescimento importante na procura por atendimento, o que pode levar à saturação da rede, especialmente nos serviços pediátricos", alerta Tani Ranieri, diretora do Cevs.
Entre os vírus, a gripe tem se destacado pela alta explosiva nos casos graves. As hospitalizações por influenza saltaram de 9 para 116 no mesmo intervalo — aumento superior a 1.100%. Em 2025, o Estado já registra 526 internações e 43 mortes provocadas pela doença. Também preocupa o avanço do VSR, com 495 internações neste ano, sendo 95% delas em crianças menores de cinco anos.
A situação é agravada pela epidemia de dengue, que também mantém os hospitais sob pressão. Com o acúmulo de atendimentos e a baixa adesão à campanha de vacinação contra a gripe, o risco de colapso no sistema motivou a adoção da medida emergencial. Mesmo assim, a curto prazo, de acordo com a Secretaria Estadual da Saúde, a tendência é de aumento nos casos.
"O inverno de 2024 já havia sido muito difícil. Neste ano, o frio está demorando a chegar, o que prolonga o período de transmissão dos vírus. Mas esse decreto nos permite agir com antecedência, antes que o sistema entre em colapso", afirma Tani.
Vacinação segue sendo a principal forma de prevenção
A baixa cobertura vacinal entre os grupos de risco (crianças, idosos e gestantes) acende mais um alerta. Até agora, menos de 30% desse público recebeu a dose contra a gripe, segundo a Secretário Estadual de Saúde. A vacina, por sua vez, é considerada fundamental para reduzir hospitalizações e mortes.
"A maioria dos hospitalizados por SRAG, segundo dados de anos anteriores, não havia se vacinado. A imunização reduz em mais de 90% os casos graves. Com a ampliação da vacina, é essencial que todos, especialmente os mais vulneráveis, se protejam", reforça Tani Ranieri.
O presidente da Associação Gaúcha de Medicina de Família e Comunidade (AGMFC), Arnildo Dutra de Miranda Junior, explica que muitos casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave começam com sintomas de uma gripe comum, mas evoluem para quadros críticos, afetando os pulmões e comprometendo a capacidade respiratória.
"A SRAG se manifesta, principalmente, com falta de ar, febre persistente e queda na saturação de oxigênio. Ela é mais frequente em crianças pequenas, idosos, gestantes e pessoas com comorbidades como asma, DPOC, doenças cardíacas e diabetes", detalha.
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Além da vacinação, Miranda ressalta medidas preventivas aprendidas durante a pandemia de covid-19, como higienização frequente das mãos, ventilação dos ambientes, distanciamento em locais fechados e atenção aos primeiros sintomas. "A maioria dos adultos saudáveis se recupera sem complicações, mas os grupos vulneráveis precisam estar mais atentos. Mesmo uma gripe aparentemente leve pode evoluir para um quadro grave se não houver proteção adequada", alerta o médico.