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Publicada em 03 de Junho de 2025 às 18:40

Líderes são decisivos para impacto ambiental positivo de negócios, diz consultor

Ricardo Voltolini é professor, autor sobre ESG, consultor e palestrante

Ricardo Voltolini é professor, autor sobre ESG, consultor e palestrante

ISABEL WHITAKER/IDEIA SUSTENTÁVEL/DIVULGAÇÃO/JC
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Loraine Luz
A sustentabilidade empresarial passou por um salto de visão nos últimos 15 anos. Primeiro, sob o conceito de responsabilidade social, os líderes se contentavam em apenas compensar os impactos sociais e ambientais de suas empresas. Há 10 anos, passaram a atuar para zerar os impactos. Nos últimos cinco, sob a expansão do ESG (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança), surgiu a ideia de deixar um resultado positivo para meio ambiente e sociedade – o conceito de regeneração.
A sustentabilidade empresarial passou por um salto de visão nos últimos 15 anos. Primeiro, sob o conceito de responsabilidade social, os líderes se contentavam em apenas compensar os impactos sociais e ambientais de suas empresas. Há 10 anos, passaram a atuar para zerar os impactos. Nos últimos cinco, sob a expansão do ESG (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança), surgiu a ideia de deixar um resultado positivo para meio ambiente e sociedade – o conceito de regeneração.
O resumo temporal é feito por Ricardo Voltolini, CEO da consultoria Ideia Sustentável, fundador da Plataforma Liderança com Valores e autor de livros como "Vamos Falar de ESG? - Provocações de um pioneiro em sustentabilidade empresarial" (Editora Voo, 2021) e "Conversas com Líderes Sustentáveis" (Senac, 2011).
Nos primeiros casos, destaca, as empresas estavam motivadas pela convicção (movimento de dentro para fora) de fazer diferença para um mundo melhor. Nos tempos de ESG, o movimento acontece por conveniência (pressão dos mercados e regulações) ou por constrangimento (pressão dos parceiros de negócio e clientes). "Nesses dois últimos casos, as empresas procuram fazer o mínimo para atender aos protocolos. Seus líderes não incorporam ESG à estratégia do negócio, procrastinam decisões que envolvem investimento presente, abrem mão de planejamento e não assumem compromissos com ações, metas e métricas", avalia.

Jornal do Comércio – Quais os maiores entraves que as empresas brasileiras ainda enfrentam para incorporar o ESG de forma autêntica e estratégica — e não apenas como discurso?
Ricardo Voltolini – Segundo o argumento das empresas resistentes ao tema em todo o mundo, a agenda ESG impõe burocracia, custo e desperdício de foco e energia que poderiam ser melhor utilizados para gerir o negócio. A principal reclamação é que as regulações pró-ESG e o seu pacote de obrigações (metas, métricas, compromissos) sobrecarregam a empresas e prejudicam a atividade econômica em tempos de crise. Isso explica o atual movimento anti-ESG, nascido nos Estados Unidos, mas com seguidores no Brasil, que resiste a ideias consideradas boas como a diversidade, equidade e inclusão, o uso de energias renováveis, o controle preventivo da cadeia de fornecimento e a descarbonização das operações. Um grande entrave à melhor incorporação no ESG nos negócios se refere ao pensamento econômico predominante nas empresas. Reprodutores de ideias da Escola de Chicago, do século passado, os líderes atuais ainda trabalham para obter a maior receita possível no menor tempo possível e ao menor custo possível. O problema é que não se consegue combinar menor tempo com menor custo sem deixar um enorme rastro de externalidades, como mudanças climáticas, esgotamento de recursos naturais e desigualdades. Orientados por uma visão imediatista (de entrega trimestral de resultados a acionistas), resistem em assumir no presente os custos da atividade empresarial para a natureza e a sociedade. E empurram a conta para as futuras gerações. Como diz Paul Polman, ex-CEO da Unilever e um porta-voz global do ESG, não faltam dinheiro nem tecnologia para gerar impacto positivo nos negócios. Falta liderança.
JC – Como pequenas e médias empresas podem começar a aplicar princípios ESG mesmo com recursos limitados?
Voltolini – Adotar ESG não depende de ter mais ou menos recursos. A extensão da responsabilidade de uma empresa é proporcional ao seu porte e aos seus impactos. Pequenas e médias empresas não são obrigadas a reportar práticas de ESG. Elas se aplicam preferencialmente às empresas de capital aberto. No entanto, a lógica de identificar os temas materiais e adotar práticas para eliminar, minimizar ou compensar os impactos ambientais, sociais e de governança mais críticos contribui para reduzir riscos e tornar mais eficiente a gestão das pequenas e médias empresas. Recomendo sempre que comecem com ações de ecoeficiência, como gestão de água, energia e desperdícios, porque isso não só melhora o meio ambiente, mas também resulta em redução de custos. Outro aspecto da gestão do S do ESG diz respeito ao cuidado com os colaboradores. As pequenas e médias empresas, mais do que qualquer outro segmento, sabem quão importante é manter os colaboradores e boas relações com a comunidade. Por isso, ganham muito quando cuidam de suas pessoas assegurando salário digno, condições de desenvolvimento, saúde (inclusive a mental) e segurança (inclusive a psicológica) no trabalho. E se beneficiam, na forma de bom ambiente de negócios, quando investem na conservação de uma praça ou em doações para iniciativas sociais do seu território.
JC – Em sua experiência com grandes corporações, quais práticas de sustentabilidade fazem diferença e podem servir de modelo a outras empresas?
Voltolini – Sempre funcionam melhor as práticas que decorrem de uma ligação muito clara com os temas materiais da empresa – impactos ambientais, sociais e de governança que se não forem bem cuidados podem gerar perdas financeiras para o negócio. Logo, as ações variam em grau de importância conforme o porte da empresa, o tipo de negócio e o seu estoque de passivos socioambientais. Na média, há um conjunto de práticas que devem ser observadas, com maior ou menor ênfase, em qualquer empresa. Na dimensão ambiental, a ecoeficiência (melhor uso de recursos como água e energia, mais circularidade, menos resíduos e desperdícios) e a descarbonização, para a redução das emissões de gases de efeitos estufa – grande desafio no século 21. Na dimensão social, destaco desenvolvimento integral dos colaboradores, salário digno, diversidade, equidade e inclusão, saúde mental, direitos humanos, investimento social nas comunidades e cadeia de valor responsável. E, na governança, o código de ética, as políticas de compliance, a estrutura de governança da sustentabilidade e o reporte das ações auditado por terceira parte.
JC – Qual o papel do consumidor e da pressão social na consolidação de práticas ESG nas empresas brasileiras?
Voltolini – É muito importante, mas há uma expectativa muitas vezes exagerada em relação a ele. As regulações de mercado têm se mostrado instrumentos de pressão mais bem-sucedidos. Explico: há mais de duas décadas acompanho as pesquisas que mostram a evolução do comportamento de consumo consciente pelo brasileiro. Há uma curva ascendente, pelo menos no que se refere à intenção de premiar e punir empresas segundo o seu compromisso com a sustentabilidade, principalmente entre as novas gerações. Entre a intenção e a atitude concreta, porém, ainda parece haver um abismo, devido a um conjunto complexo de fatores – custo, cultura, incentivo material, falta de hábito, valorização efetiva do tema. As regulações de mercado que vieram com maior força neste período de ESG têm funcionado melhor como pressão.

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