De Caxias do Sul
Governos e empresas de todos os continentes têm acelerado a adoção de medidas para reduzir as emissões e adaptar as cadeias produtivas a uma economia de baixo carbono. O tema ganhará ainda mais relevância na COP30, que colocará o Brasil no centro das decisões globais sobre clima, e mobilizará ainda mais a indústria nacional com metas, novas tecnologias e integração de cadeias. Nesse contexto, o 1º Fórum de Transição Energética e Descarbonização, realizado durante a Electric Move, em Caxias do Sul, reuniu líderes industriais para mostrar soluções concretas de redução de pegada de carbono em produtos, processos e logística.
Especialista em competitividade setorial do Sebrae RS, Fabiano Dallacorte contextualizou tendências como nearshoring e friendly shoring e o papel da tecnologia para entregar customização, velocidade e custo. Ele defendeu a fabricação inteligente, da biomimética a exoesqueletos e impressão 3D em metal, e mostrou como a produtividade impacta as emissões. "O primeiro passo para a redução é a adoção da manufatura enxuta. Depois, coragem para investir e, finalmente, implantação de sensoriamento, visualização de dados e manutenção preditiva", detalhou.
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Um dos painéis foi centrado em cases de redução da pegada de carbono em produtos e processos industriais, com detalhamento de rotas de descarbonização disponíveis à indústria. César Augusto Ferreira, chief technology innovation officer da Randoncorp, comparou ganhos de motores elétricos aos de combustão e apresentou o portfólio de "produtos verdes" da companhia: suporte de paralama, freio Z came, plataforma modular e sapata ferroviária, com avaliação de ciclo de vida via SimaPro.
As metas da empresa são claras: diminuir em 55% a emissão de gases de efeito estufa até 2030; em 75% até 2035 e atingir neutralidade zero em 2040. Na infraestrutura, a companhia instalou 102 placas fotovoltaicas em unidades e centros de distribuição e substituiu geradores a diesel por subestação de energia.
A Fras-le, uma das empresas do grupo, implementou a caldeira verde, que opera com biomassa no lugar de gás, evitando a emissão de aproximadamente 10 mil toneladas de CO2 por ano. Ao defender que "eletrificar é um caminho e descarbonizar é uma jornada rumo ao futuro", Ferreira reforçou a necessidade de visão sistêmica, combinando eficiência, materiais, energia limpa e logística otimizada.
Com a ambição de atingir neutralidade zero até 2050, a ArcelorMittal (unidade de aços planos - América do Sul) já evitou a emissão de 680kt de CO2 ao longo de seu histórico de projetos. O plano mantém altos-fornos em operação com adaptações tecnológicas, incluindo co-injeção de gás natural, maximização de sucata, biocarbono e energia renovável, além de captura e armazenamento de CO2 com potencial de milhões de toneladas.
Marcos Mayer, gerente de projetos de descarbonização e novos negócios, destaca a compensação como pilar estratégico para o setor siderúrgico e a liderança em certificações: foi a primeira das Américas a ser reconhecida com o selo ResponsibleSteel. A companhia também desenvolveu o programa XCarb, que impulsiona o mercado de soluções siderúrgicas sustentáveis para apoiar metas de clientes e ampliar a transparência da cadeia.
A Tramontina vem olhando para a gestão ambiental há mais de três décadas. Ao longo desse tempo, dois projetos recentes se destacam pelo pioneirismo: uso de biometano, em parceria com a Ultragaz, e o hidrogênio verde. Com a primeira operação industrial do estado em funcionamento desde agosto, o uso de biometano representa de 2,5% a 3% do consumo nas plantas, visando à redução na emissão de até 310 toneladas de CO2 por mês.
O uso de hidrogênio verde, com produção e compressão na planta da empresa, conta com três fases. Giovane Capitani, diretor corporativo administrativo, e Lizandra Rostellato Marin, gerente de sustentabilidade, destacaram que nas fases um e dois, a empresa prevê a produção de 462kg/dia de H2 verde, o abastecimento de mais de 250 máquinas, como veículos autônomos que atuam, principalmente, na intralogística, empilhadeiras e veículos industriais; uso máximo de 5,5m³/dia de água pluvial; e redução de aproximadamente 600t de CO2 emitidos por ano. A etapa três visa ao abastecimento no transporte rodoviário pesado.
O especialista do Instituto Senai de Química e Meio Ambiente, Luciano Braga Souto, apresentou um caminho para a realização do diagnóstico de descarbonização: conhecer as fontes de emissão e oportunidades, avaliar a viabilidade técnica, econômica e ambiental, e definir prioridades e horizontes de ação. O especialista reforçou que dados não expõem as vulnerabilidades das empresas, mas constroem transparência, atributo cada vez mais valorizado pelo mercado. Citou iniciativas do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material de Caxias do Sul e Região, em parceria com o Senai, para apoiar inventários corporativos dos associados, que visam qualificar o diálogo com fornecedores, reduzindo assimetrias de informação e acelerando a adoção de boas práticas em toda a cadeia produtiva.
Produtos alinhados com as tendências de mercado
O segundo painel, sobre cases de formas sustentáveis de propulsão: uso de combustíveis alternativos, mostrou soluções de mobilidade produzidas em Caxias do Sul. Luciano Resner, diretor de engenharia & design da Marcopolo, expôs um plano de mobilidade sustentável com forte ênfase em pesquisa e desenvolvimento, automação e modernização fabril.
Nos últimos três anos foi investido valor superior a R$ 300 milhões e mais de 100 projetos de modernização estão em andamento para o próximo triênio. No portfólio da empresa, possibilidades como o Rail Híbrido (diesel/elétrico), Audace Fuel Cell (hidrogênio), Attivi Integral (100% elétrico), Volare Híbrido (etanol/elétrico) e Volare Fly 10 GV (GNV/biometano).
Com histórico de desenvolvimento de alternativas desde 2001, a Agrale entende que não há solução única, mas que a melhor escolha em combustíveis alternativos depende da matriz energética e do perfil operacional de cada país, estado e cidade. Razão para a empresa oferecer diversas alternativas, como micro-ônibus a GNV, tratores a biodiesel/GLP, Marruá 4x4 100% elétrico, chassi para biometano e operações de trambus em Buenos Aires, entre outras. "A empresa percebe a multienergia como aceleradora na descarbonização do transporte", frisou William Menegotto, gerente geral de engenharia.
A Arrow Mobility vem puxando a revolução nas entregas urbanas: o ONE, primeiro veículo 100% elétrico da marca, foi criado em 2020 e homologado em 2022, mesmo ano em que foi lançado na Feira Internacional do Transporte, em São Paulo. Em 2023, a empresa firmou contrato com o Mercado Livre. Nos anos seguintes, fez a primeira exportação para a Argentina e conquistou novos clientes, incluindo Amazon, Revo e BR Supply. Em julho de 2025, surgiu o Arrow 2, veículo menor e mais ágil, pensado para múltiplas viagens diárias nos grandes centros urbanos, atendendo o modelo de entrega no mesmo dia da compra.
O portfólio da empresa conta com outros três modelos e lançamentos programados para 2026, 2027 e 2028. "Serão produtos que entregarão mais rapidez, autonomia e outros diferenciais, combinando eficiência operacional, baixas emissões, inteligência artificial e tecnologia embarcada para elevar a produtividade", afirmou Jocelei Salvador, head de engenharia.