Enquanto a reforma tributária avança, o futuro passa a ser discutido. No caso de incentivos fiscais estaduais, a regra é clara: eles deixarão de existir frente ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR). A ideia por trás disso é de acabar com a “guerra fiscal” entre os estados brasileiros, o que criaria condições desiguais de atração de investimentos. Mas tanto a secretária estadual da Fazenda, Pricilla Santana, quanto o presidente do Comitê Gestor do Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS), Flávio César, garantem que as novas regras compensarão os incentivos fiscais estaduais.
“A Receita Federal está trabalhando exatamente nisso, onde todos aqueles incentivos que são por prazo e com coisa certa para entregar serão recepcionados e, se tiver algum resíduo, vai ser devidamente compensado e isso ficará justamente a cargo da Receita”, informou Pricilla durante coletiva de imprensa realizada nesta sexta-feira (3) durante a Semana Fazendária, que acontece no Farol Santander. O comentário da secretária foi considerado “muito contundente” por César.
De uma maneira geral, a secretária avaliou positivamente a mudança para o FNDR. “Vai ser um conjunto de recursos crescente e a gente vai poder efetivamente promover a política de desenvolvimento. Uma das grandes vantagens da reforma tributária para os estados é que ela rompe com a lógica de guerra fiscal, de ficar utilizando a alíquota do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para atrair determinados investimentos que, do contrário, não viriam. Então, numa óptica absolutamente econômica, distorce as vantagens que determinado estado, determinada localidade tem para receber um ativo”, considerou Pricilla.
Enquanto a secretária pontuou que esse novo modelo de desenvolvimento será “mais racional, mais agregador e com efeitos multiplicadores”, sendo capaz de gerar “mais crescimento e desenvolvimento econômico”, César ponderou os benefícios da novidade do ponto de vista regionalizado. Para ele, as economias locais poderão se desenvolver a partir de atributos próprios.
“A reforma tributária vai conceder oportunidade para os estados se fortalecerem através da sua vocação. No Mato Grosso do Sul, por exemplo, há quatro grandes indústrias de celulose e uma quinta sendo instalada. Além disso, tem os setores de frigoríficos, sucroalcooleiro e temos agora, chegando muito forte, a citricultura. Então, é a oportunidade para que os estados possam se organizar e se preparar para no médio e no longo prazo se consolidarem nas suas vocações”, acrescentou César.
Comitê Gestor do IBS é criado em meio a impasses
O projeto de lei complementar que cria o Comitê Gestor do IBS, presidido por César, foi aprovado pelo Senado na terça-feira, 1º de outubro. Sob sua responsabilidade ficará a arrecadação e a distribuição do novo imposto entre os entes federados. O Conselho Superior, sua instância máxima, será composto por 27 representantes indicados por estados e Distrito Federal e 27 pelos municípios.
A organização das eleições para os representantes municipais gerou, todavia, disputas recentes entre a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) e a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), na escolha pela seleção dos representantes dos executivos municipais que seriam indicados para compor o órgão. Na ocasião, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), que é vice-presidente da FNP, chegou a desfiliar a capital gaúcha da CNM diante do impasse.
O fato é que o Comitê Gestor do IBS foi criado e já possui tanto Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) quanto conta bancária. Agora, a sua composição não está definida. Nessa perspectiva, por enquanto, o Conselho Superior será composto inicialmente apenas por representantes dos Estados e do Distrito Federal. As eleições dos 27 representantes municipais estão suspensas até que o impasse entre CNM e FNP seja solucionado.
César considerou que a criação do Comitê foi “emblemática e histórica”. “Depois de muitos meses de intenso trabalho dentro dessa esfera, com estados e municípios em parceria com o governo federal, conseguimos aprovar o PLP (Projeto de Lei Complementar) 108, que traz toda a concepção do Comitê Gestor que já está em fase adiantada de implementação porque a Lei Complementar 214 instituiu um comitê gestor provisório”, celebrou o presidente do órgão.
Ele enfatizou, ainda, que o Rio Grande do Sul está tendo o que denominou como um protagonismo na transição e organização da reforma tributária. Como exemplo disso, relembrou a atuação gaúcha frente à criação e à implementação da nota fiscal eletrônica, que foi tornada obrigatória com a nova legislação.
CBS passa pela preparação das empresas
Enquanto a maior parte das discussões que envolvem o governo passa pelo IBS, que substituirá o ICMS, as empresas dão conta de outro imposto, a Contribuição Sobre Bens e Serviço (CBS), que unifica o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). A transição para esse novo imposto ocorrerá de forma gradual entre 2026 e 2033.
As empresas que não conseguirem cumprir com as novas obrigações fiscais do ano-teste de 2026, pelo texto-base aprovado pelo Senado, serão intimadas a resolver as pendências antes que uma multa seja imposta definitivamente. Assim, será dado um prazo de 60 dias para que o pedido seja atendido e, em caso de cumprimento, a penalidade será extinta.
“A forma como construímos a reforma tributária no momento da regulamentação e da implementação, com diálogo com empresas e com a sociedade está facilitando muito (a preparação das empresas). Não vamos avisá-los depois do sistema estar pronto e, sim, estamos construindo com eles. Estou bastante animado e estimulado de que vai ser um sucesso essa reforma tributária”, considerou o secretário especial da Receita Federal do Brasil, Robinson Barreirinhas.
Barreirinhas responde críticas ao split payment
Além da criação dos novos impostos e da criação do Comitê Gestor, um terceiro ponto nevrálgico da reforma tributária é a criação de um novo sistema de pagamentos. A ideia é que ele reduza a sonegação e aprimore a cobrança de impostos. Um dos módulos da plataforma, o split payment, permitirá que o valor dos tributos seja direcionado em tempo real para o governo, estados e municípios, mas sua implementação tem sido um dos principais alvos de críticas por parte do empresariado, que também levanta dúvidas sobre o sistema.
“É um tipo de temor em que há sempre duas coisas. Uma, é a ansiedade natural de quando há algo novo. Mas tem também aquelas pessoas que estão de má-fé e querem gerar ansiedade por interesses escusos. Mas vamos ter um prazo de transição para isso também e vai passar a valer mesmo a partir de 2027 nas operações entre fornecedores e outras empresas, no varejo vai ficar para depois. Vai ter tempo para as pessoas se adaptarem a isso”, rebateu e explicou Barreirinhas.
O secretário especial acrescentou que “empresas de criminosos, noteiras, por exemplo, que não existem e estão lá para emitir nota têm que ficar preocupadas mesmo”. Porque, conforme defende, o surgimento do split payment “vai sim beneficiar o bom contribuinte, mas vai ser duro com esses criminosos”.