A Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados realizou nesta quinta-feira (18), em Brasília, uma audiência pública para debater os “subsídios públicos destinados à geração de energia a partir do carvão mineral”. Um dos questionamentos feitos no encontro foi quanto a recursos que são repassados pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) à termelétrica gaúcha Candiota 3.
Conforme definição do governo federal, a CDE é “um fundo com grande aporte de consumidores privados, que financia uma série de políticas do setor de energia”. Esse encargo setorial é pago através das contas de luz. O gerente de Transição Energética do Instituto Internacional Arayara, John Fernando de Farias Wurdig, informa que, entre os meses de junho, julho e agosto, Candiota 3 recebeu cerca de R$ 40 milhões através da CDE.
O Instituto Arayara pediu explicações da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre os pagamentos milionários à termelétrica, mesmo a usina tendo ultimamente exportado energia para a Argentina e não abastecido o mercado brasileiro. Wurdig considera que, pelo contexto atual, a perspectiva é que Candiota 3 tenha “um futuro curto”. Ele recorda que a licença ambiental da usina vence em abril de 2026. “Vai ser muito difícil um processo de renovação dessa licença, porque tem muitas condicionantes não atendidas”, comenta o engenheiro ambiental.
Ele afirma que só de multas a pagar a usina tem uma quantia de mais de R$ 100 milhões a ser desembolsada. Wurdig enfatiza que é preciso investir recursos na transição energética na região do município de Candiota, para que não ocorra desemprego com a desativação da usina. “E a gente não vê isso, só o discurso para continuar o subsídio”, critica o integrante do Instituto Arayara,
Por sua vez, o diretor-presidente do Instituto Arayara, Juliano Bueno, solicitou à Comissão de Legislação Participativa para que seja realizada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os montantes pagos de forma errônea e não devolvidos pelo setor carbonífero no que tange aos recursos financeiros recebidos da CDE. Já a diretora-executiva da entidade, Nicole Figueiredo, defendeu que o Brasil lidere o protagonismo na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) para o fim de novas usinas a carvão em âmbito global, assim como dos subsídios aos combustíveis fósseis. Além disso, sugere que o País integre a Power Past Coal Alliance (PPCA) que é um grupo de 186 nações, cidades, regiões e organizações que visam acelerar a eliminação gradual do emprego do carvão nas termelétricas.
Fazendo o contraponto, o presidente da Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS), Fernando Zancan, destaca que o tema de criticar benefícios a fontes fósseis de energia é antigo. No entanto, no caso do carvão, ele questiona o uso do termo “subsídio” para o mineral. O dirigente sustenta que o apoio da CDE não pode ser considerado como subsídio. “É um mecanismo financeiro para manter a cadeia produtiva toda operando e operando quando tem necessidade. Quando tem muita chuva, diminui o despacho das usinas (a carvão), com pouca chuva vai para o máximo”, argumenta Zancan.
Ele também enfatiza que a única termelétrica a carvão atuando hoje que pode usufruir da CDE é Candiota 3. Outro ponto salientado pelo representante da ABCS é que a validade do benefício para a térmica é até 2027. Se a usina tiver um novo contrato de fornecimento de energia, não deverá mais contar com a CDE. “A audiência (em Brasília) não é para falar de subsídio, mas para cortar os contratos (das térmicas brasileiras a carvão)”, diz Zancan.
Sobre a COP30, o presidente da ABCS argumenta que a conferência será um momento em que cada um exporá suas propostas e narrativas, ou seja, “cada um venderá seu peixe”. Dentro desse cenário, Zancan adianta que as empresas do setor estão trabalhando tecnologias para reduzir a pegada de carbono. “Independentemente de qualquer narrativa, a gente entende que vão ficar vivos (os complexos a carvão) e sendo carbono neutro”, prevê o dirigente. Ele reforça que a ideia não é acabar com o uso do carvão, mas sim suas emissões.
A audiência na capital federal foi decorrência de uma solicitação da deputada Talíria Petrone (PSOL-RJ). Ela salienta, de acordo com a Agência Câmara de Notícias, que ainda está em análise um veto sobre a Lei das Eólicas Offshore. Esse veto remove emendas que prorrogam até 2050 os benefícios ao carvão e ao gás natural. A decisão, na avaliação da parlamentar, é fundamental para manter a coerência da política energética nacional com as metas climáticas. Talíria lembra ainda que o Projeto de Lei 219/25, em análise na Câmara, proíbe novos subsídios ao carvão mineral e extingue os atuais.