Levando em conta a chuvarada que caiu em Porto Alegre na noite do último sábado, é sem dúvida tentador transformar a resenha sobre o show do Paralamas do Sucesso em um desfile de trocadilhos. Afinal, todo mundo precisou dos para-lamas para superar a jornada até o Araújo Vianna - e dessa superação resultou uma noite de muito sucesso, com toda a certeza. Mas, se me permitem, vou tentar puxar a história toda por outro lado, reconhecendo o esforço de todos os envolvidos para que, mesmo com os perrengues, a noite fosse a mais agradável possível. Em outro cenário, com outra banda e outro público, poderia ter dado tudo errado - mas não deu, e a banda pode deixar a cidade aliviada e satisfeita de ter acrescentado mais um muito bom show ao seu já ótimo retrospecto na cidade.
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O público, sem dúvida, fez a sua parte. Mesmo com o clima carrancudo, o auditório estava lotado, e muita gente ficou de pé nas laterais do palco para acompanhar o show. É justo dizer que a capital gaúcha e os Paralamas seguem vivendo uma relação apaixonada, com incansáveis demonstrações de carinho mútuo: mais uma vez, o vocalista/guitarrista Herbert Vianna e o baterista João Barone fizeram questão de lembrar a importância de Porto Alegre na história de quatro décadas da banda, além de frisarem a alegria que sentiam com a recepção animada e dançante da plateia.
O público, sem dúvida, fez a sua parte. Mesmo com o clima carrancudo, o auditório estava lotado, e muita gente ficou de pé nas laterais do palco para acompanhar o show. É justo dizer que a capital gaúcha e os Paralamas seguem vivendo uma relação apaixonada, com incansáveis demonstrações de carinho mútuo: mais uma vez, o vocalista/guitarrista Herbert Vianna e o baterista João Barone fizeram questão de lembrar a importância de Porto Alegre na história de quatro décadas da banda, além de frisarem a alegria que sentiam com a recepção animada e dançante da plateia.
Paralamas do Sucesso fez show extenso e repleto de hits para o público de Porto Alegre
TÂNIA MEINERZ/JC
Uma noite de declarações de amor, mas que teve sim os seus problemas. O show começou com cerca de 40 minutos de atraso, e não antes de um alarme falso: as luzes se apagaram, os telões começaram a exibir o vídeo de abertura e tudo se apagou instantes depois, deixando o público de pé e no escuro, tanto no literal quanto no figurado. Após momentos de incerteza, as luzes do Araújo Vianna voltaram a se acender, e foram quase dez minutos mais até que tudo se apagasse novamente e, na segunda tentativa, o velho sucesso Vital e Sua Moto pudesse dar início de fato à apresentação.
Público interagiu com as luzes dos celulares durante o show
TÂNIA MEINERZ/JC
Mais de uma vez, Herbert Vianna perguntou gentilmente aos presentes se estavam ouvindo bem a banda - em uma delas, aproveitou a deixa para puxar uma salva de palmas em agradecimento à equipe técnica. Poderia ser algo casual, mas quem prestou atenção percebeu o desconforto do músico com algumas dificuldades técnicas, que parecem ter sido constantes durante toda a noite. Trocou duas ou três vezes de guitarra no meio das músicas, e parecia estar 'apanhando' da pequena mesa de som que usava para controlar os timbres e regulagens do instrumento - que, por vezes, soava baixinho e quase sumia na potência do resto da banda.
Banda lendária do rock nacional fez show em celebração aos 40 anos de carreira
TÂNIA MEINERZ/JC
Ao que parece, o retorno de Herbert também não estava funcionando a contento, e foi nítido que a banda por vezes lutava para manter o tempo das canções, talvez porque o homem de frente não conseguisse escutar bem o que ele próprio estava tocando. Canções um pouco mais complicadas, como Alagados e O Beco, foram as que mais sentiram esse descompasso - a segunda, em especial, ficou claramente mais rápida no meio do caminho, de tal forma que alguns talvez nem tenham reconhecido a faixa quando a banda começou a tocá-la. Difícil dizer exatamente o que houve: talvez a passagem de som tenha sido problemática, talvez as oscilações de energia tenham estragado parte do equipamento, vai saber. Mas, para quem olhou e escutou de forma menos apaixonada, ficou claro que a banda tocou boa parte da noite meio que na ponta dos pés, como se tomasse todo o cuidado do mundo para que o show não desandasse de vez.
Engana-se, porém, quem acha que esses poucos parágrafos são indicadores de um show ruim. Pelo contrário: o profissionalismo e a sabedoria de quatro décadas de estrada aparecem com mais clareza justamente nas situações mais difíceis, e os Paralamas do Sucesso foram extremamente competentes para levar a noite da melhor maneira. Mesmo desconfortável, Herbert em momento algum foi grosseiro ou deu sinais ostensivos de desagrado, demonstrando elogiável serenidade diante dos problemas - algo facilitado pela performance excelente de Barone e do baixista Bi Ribeiro, que seguraram a onda com a competência de quem conhece o jogo de cor e salteado.
Repertório da noite de sábado contou com mais de 30 músicas, em um setlist no qual os clássicos não faltaram
TÂNIA MEINERZ/JC
Quanto ao público, estava tão feliz de estar diante dos ídolos que imagino que muita gente nem notou problema nenhum, deleitando-se com a profusão de hits que surgiam um atrás do outro. Sucesso, de fato, é algo de que os Paralamas entendem bem: Cinema Mudo, Trac-Trac (anunciada por Herbert com um "vamos ver se vocês conseguem cantar um refrão em espanhol"), Romance Ideal, Cuide Bem do Seu Amor, Aonde Quer que Eu Vá, Ela Disse Adeus, Melô do Marinheiro, Uma Brasileira... Uma coletânea interminável (no melhor sentido) do rock brasileiro, o que não impediu momentos mais densos (como na sequência das pesadas e sérias Calibre e Selvagem) e momentos de contemplação coletiva, como na belíssima Lanterna dos Afogados, em que os celulares da plateia foram incontáveis fontes de luz impedindo a escuridão total.
Tão positivo foi o saldo da noite chuvosa em Porto Alegre que o Paralamas se permitiu até uma certa descontração na reta final: depois do bis de praxe, com as indefectíveis Caleidoscópio e Meu Erro, vieram covers despojados de Legião Urbana (Que País é Esse?) e The Clash (Should I Stay or Should I Go), tocadas com a leveza de quem já tinha garantido a vitória a essa altura. Sinal de que, quando plateia e palco jogam junto, o saldo é sempre positivo.
Mesmo com problemas técnicos, vocalista e guitarrista Herbert Vianna manteve a serenidade e fez boa apresentação
TÂNIA MEINERZ/JC