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Publicada em 16 de Abril de 2024 às 15:57

Deborah Colker constrói uma ponte entre clássico e primitivo com espetáculo 'Sagração'

Novo espetáculo da Companhia de Dança Deborah Colker, Sagração reúne obra célebre de Stravinsky e cosmogonias originárias em única apresentação no Teatro do Sesi

Novo espetáculo da Companhia de Dança Deborah Colker, Sagração reúne obra célebre de Stravinsky e cosmogonias originárias em única apresentação no Teatro do Sesi

/FLAVIO COLKER/DIVULGAÇÃO/JC
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Adriana Lampert
Adriana Lampert Repórter
Foi em uma viagem para o Xingu, durante o Kuarup, e no encontro com as aldeias indígenas Kalapalo e Kuikuro, que a bailarina e coreógrafa Deborah Colker conheceu o diretor de cinema Takumã Kuikuro. Na ocasião, ele contou a ela "como o povo do chão recebeu o fogo do Urubu Rei". Essa história é dançada e acompanhada por narração do próprio cineasta e faz parte da coleção de cosmogonias que a artista reuniu para montar a dramaturgia do espetáculo Sagração, montagem que comemora os 30 anos da Companhia de Dança Deborah Colker, e que terá única apresentação no Teatro do Sesi, nesta sexta-feira (19), às 21h. Os ingressos custam entre R$ 19,80 (popular e limitado) e R$ 200,00 (plateia baixa).
Foi em uma viagem para o Xingu, durante o Kuarup, e no encontro com as aldeias indígenas Kalapalo e Kuikuro, que a bailarina e coreógrafa Deborah Colker conheceu o diretor de cinema Takumã Kuikuro. Na ocasião, ele contou a ela "como o povo do chão recebeu o fogo do Urubu Rei". Essa história é dançada e acompanhada por narração do próprio cineasta e faz parte da coleção de cosmogonias que a artista reuniu para montar a dramaturgia do espetáculo Sagraçãomontagem que comemora os 30 anos da Companhia de Dança Deborah Colker, e que terá única apresentação no Teatro do Sesi, nesta sexta-feira (19), às 21h. Os ingressos custam entre R$ 19,80 (popular e limitado) e R$ 200,00 (plateia baixa).
Livre adaptação de A sagração da primavera, do compositor russo Igor Stravinsky, a montagem dirigida por Deborah unifica a música clássica com ritmos brasileiros, e é inspirada por visões ancestrais sobre a origem do mundo. "Sagração é um desejo antigo: por conta da minha formação musical como pianista, iniciada na infância, eu sempre soube que essa obra de Stravinsky – estreada em Paris, no ano de 1913, com coreografia de Vaslav Nijinsky e produção de Sergei Diaghilev para os Ballets Russes – rompeu as estéticas da música e da dança do início do século XX, causando uma confusão danada", comenta a coreógrafa. "Trazer minha versão para essa obra significa me aproximar de um movimento muito importante que aconteceu naquele momento. Todo o artista tem essa necessidade, de romper estruturas, de experimentar novos caminhos."
A coreógrafa, em parceria com o diretor musical Alexandre Elias, introduziu à partitura instrumental de Stravinsky a sonoridade pujante das florestas e ritmos brasileiros, como Boi bumbá, coco, afoxé e samba. Aos acordes de instrumentos de orquestra, o diretor musical adicionou flauta de madeira, maracá, caxixi e tambores. Os paus de chuva também entram em cena no arranjo executado ao vivo pelos bailarinos. 
Deborah afirma que, quando decidiu recontar esse clássico, percebeu que teria de ser a partir da cosmovisão de povos originários do Brasil. "Stravinsky foi responsável por pontos de ruptura e provocação entre o erudito e o primitivo, abrindo espaço para a música e a dança contemporâneas", reforça a bailarina, lembrando que a composição musical de A sagração da primavera é considerada revolucionária por introduzir estruturas rítmicas e harmônicas nunca antes utilizadas em partituras. "Quando ele escreveu essa obra, foi influenciado pelos povos originários russos, pela música folk, pela música pagã; ele se aproximou dos camponeses, saiu do acadêmico."
A artista avalia que essa ponte entre o clássico e o primitivo proposta na obra original e na sua versão representa os pontos de evolução da humanidade. "Isso se revela no roteiro do espetáculo, que inicia com a 'avó do mundo', passando pelo surgimento da bactérias, dos herbívoros, dos quadrúpedes, da caça e origem do fogo, do Homo erectus, do neandertal, do Homo sapiens; até chegar em passagens do livro Gênesis, com Eva e a serpente, o descobrimento do corpo humano, Abraão e seu barco, a agricultura, os conflitos em comunidade com a ideia de propriedade, e a destruição da floresta", destaca. Na história de Sagração, entre as 14 cenas, ainda há a volta da "avó do mundo" e o espaço para o sonho.
"Evoluir é sacrificar. O ser humano, inevitavelmente, está sacrificando a natureza, e temos que olhar para ela, entender que dependemos dela para viver. Ninguém quer jogar fora as conquistas tecnológicas, mas temos que ter o bom senso, com tanta gente no mundo, de pensar como é que a gente cuida do nosso planeta", comenta Deborah. "É meu dever, como artista, escolher e trazer esses assuntos para a reflexão", emenda, anunciando que Sagração também completa uma trilogia de sua Companhia, formada pelos dois últimos espetáculos executados pelo grupo: Cão sem plumas (2017) e Cura (2021), ambos já apresentados na Capital gaúcha.
"Ao longo desses anos, assistimos e participamos de muitas transformações na cultura, na política e na economia. Chegamos até aqui porque temos este espírito de evolução, que é um tema muito precioso para esse novo espetáculo", avalia o diretor executivo João Elias, que em 1994 fundou a companhia de dança com Deborah Colker. Em cena, 15 bailarinos compõem o corpo dançante do espetáculo, em formatos coreográficos diversos: grupo, solo, duo, trio, entre outros. Para contar a história, integrando a cosmovisão indígena com o evolucionismo darwinista - desde a espécie unicelular (com as bactérias crescendo, se arrastando e tomando formas diferentes até o ser humano atual e seus conflitos), a coreógrafa se utiliza de 90 bambus que dançam com os bailarinos, enquanto outros 80 bambus fixos complementam o cenário (somando 170 bambus no espaço cênico).
O céu, a água, o mar e a terra também ganham representações pelas cores escolhidas para iluminar o espetáculo: azul, verde, amarelo, vermelho, laranja. "Eu nunca trabalhei com tanta cor", revela Deborah. Ao longo de suas três décadas de atividades, a Companhia de Dança dirigida pela artista realizou mais de 2 mil apresentações, em mais de 100 cidades, de 35 países, totalizando um público de cerca de 4 milhões de pessoas. Com Sagração, o grupo já se apresentou no Rio de Janeiro (onde ocorreu a estreia mundial da montagem), Curitiba, Jaraguá do Sul (SC) e Florianópolis. Depois de Porto Alegre, na segunda-feira (22), o espetáculo terá uma segunda apresentação em solo gaúcho, no Teatro Feevale, em Novo Hamburgo.

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