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Teatro
Antônio Hohlfeldt

Antônio Hohlfeldt

Publicada em 15 de Janeiro de 2024 às 23:02

Reencontrando Elis, com emoção e fidelidade

O espetáculo "Elis, a Musical" é uma das atrações do Porto Verão Alegre

O espetáculo "Elis, a Musical" é uma das atrações do Porto Verão Alegre

PEDRO IVO OLIVEIRA/DIVULGAÇÃO/JC
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Antonio Hohlfeldt
Abrindo a temporada de artes cênicas na cidade, ocorreram os primeiros espetáculos do Porto Verão Alegre e a temporada de "Elis, a musical", centralmente interpretada por Laila Garin (eventualmente substituída por Lilian Menezes, como ocorreu no sábado), a partir de texto de Nelson Motta e Patrícia Andrade, com direção de Dennis Carvalho.
Abrindo a temporada de artes cênicas na cidade, ocorreram os primeiros espetáculos do Porto Verão Alegre e a temporada de "Elis, a musical", centralmente interpretada por Laila Garin (eventualmente substituída por Lilian Menezes, como ocorreu no sábado), a partir de texto de Nelson Motta e Patrícia Andrade, com direção de Dennis Carvalho.
"Elis, a musical" é um tour de force extremamente bem realizado, primeiro, pela seleção de eventos, não chegando, por exemplo, à morte da cantora portoalegrense, mas destacando episódios que mostram as diferentes facetas da artista, tanto sua personalidade, quanto sua carreira. Por exemplo, as relações entre ela e Ronaldo Bôscoli (desenhando sua liderança feminista que vai marcar seu tempo) ou com César Camargo Mariano (de quem ela decide se separar em busca de outros horizontes). No campo profissional, o início meio contra a vontade, no programa "Clube do Guri", na rádio Farroupilha, em Porto Alegre; depois, a viagem para o Rio de Janeiro, o primeiro contrato com gravadora, a estréia no Beco das Garrafas, os shows iniciais e a decisão de sempre ela mesma decidir sobre sua carreira.
Uma escolha extremamente acertada dos roteiristas foi valorizar o lado musical da artista, ou seja, o enredo costura episódios que exploram a intervenção da intérprete Laila Garin que dá corpo e voz à personagem Elis Regina. Afinal, Elis era uma cantora, havia que valorizar sua imensa galeria de obras que gavou. Aqui, a função do diretor é fundamental, desde a caracterização da jovem e inexperiente cantora, com uma peruca que é perfeita e relembra fielmente a figura adolescente da Vila do IAPI, até as quase sempre difíceis e muitas vezes preconceituosas decisões a serem tomadas em sua carreira, evidenciando que Elis enfrentou os desafios de todo o cantor estreante, e sobretudo artista mulher, de maneira que sua história não foi fácil. Por isso, o roteiro do espetáculo é importante: a seleção dos episódios nos devolve a uma época tormentosa, em plena ditadura: por exemplo, o episódio em que se busca obrigar Elis Regina a cantar num show promovido pelo Exército e a reação de Henfil, "enterrando" simbolicamente a cantora, episódio que depois ambos ultrapassariam, aliás, por iniciativa dela, em passagem emocionante, presente no espetáculo.
A direção musical e os arranjos de Delia Fischer e Claudia Abreu são elementos importantes do espetáculo, porque recriam as sonoridades desenvolvidas por Elis e que se tornariam sua marca registrada. Laila Garin foi meticulosa na recriação da personagem, desde pequenos cacoetes e gestos, como o mexer nos cabelos, ou o sorriso que sempre se apresentava franco e aberto, quanto à busca dos registros e tonalidades vocais, de modo que há momentos em que, se o espectador estiver de olhos fechado, o que é difícil, porque o espetáculo é esfuziante, mas vamos lá, se o espectador estiver de olhos fechados, é como se Elis se corporificasse no palco.
O movimento coreográfico criado por Alonso Barros e a cenografia de Marieta Spada garantem ritmo contínuo e certamente fatigantes para os intérpretes, mas cativantes para a platéia que, repetidamente, aplaude em cena aberta. A celeridade e o ritmo de troca de espaços cênicos, graças ao desenho inteligente e eficiente de Marieta Spada, nos transportam para tempos e espaços variados, de maneira que o musical mantém-se fiel ao próprio conceito da antiga comédia musical: uma série de esquetes que recortam determinados aspectos da realidade. A diferença, aqui, é que eles compõem uma narrativa articulada em torno da biografia da cantora, no que se concretiza inclusive com o auxílio dos figurinos de Marília Carneiro e a iluminação de Felício Mafra.
Muitas vezes premiado desde sua estreia, há uma década, a remontagem do espetáculo evidencia que ele continua atual, profundamente emocionante, contagiante, devendo-se muito de sua qualidade à verdadeira dedicação e entusiasmo que todo o elenco evidencia.
Leandro Melo (Lennie Dale), Flávio Tolezani (Ronaldo Bôscoli), Cláudio Lins (César Camargo Mariano), Santiago Villalba (Miele e Tom Jobim), Fernando Rubo (Jair Rodrigues), Pablo Áscoli (Henfil) e Bruno Ospedal (Nelson Motta) são alguns dos nomes do elenco, que se destacam por incorporarem personagens conhecidos e importantes na carreira de Elis. Mas a força do espetáculo decorre, fundamentalmente, de um trabalho de equipe, admirável, que se deve, evidentemente, à direção.
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