Com mais de 84 milhões de processos em tramitação e um crescimento médio anual de 10% no número de ações, o sistema judiciário brasileiro enfrenta um dos maiores desafios de eficiência do mundo.
Projeção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é de que seriam necessários mais de dois anos para zerar o estoque atual de processos, mesmo sem a entrada de novos casos. A situação se agrava com o volume crescente de provas audiovisuais, que demandam tempo e recursos humanos para análise e transcrição.
Para enfrentar esse cenário, o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) está apostando em uma solução baseada em inteligência artificial generativa, desenvolvida pela Xertica.ai, empresa especializada em transformação digital na América Latina.
A ferramenta reduziu em até 90% o tempo necessário para a análise de vídeos, liberando os promotores de tarefas operacionais e permitindo uma atuação mais estratégica. A solução já impacta diretamente mais de 35 milhões de cidadãos e pode ser replicada por outras instituições do sistema de justiça em todo o país.
A necessidade de mudança era urgente. Em 2023, o MPRS registrou mais de 300 mil novos casos criminais. A estrutura operacional, limitada e ainda bastante manual, não acompanhava o ritmo. Em um caso emblemático, dois dias de depoimentos gravados em vídeo permaneceram anos sem degravação, e o julgamento só ocorreu após a prescrição dos crimes.
“A adoção dessa solução marca uma nova fase na atuação do Ministério Público gaúcho. A inteligência artificial tem nos ajudado a acelerar a tramitação de casos complexos, reduzir gargalos operacionais e garantir uma atuação mais eficiente e transparente em defesa da sociedade”, destaca o subprocurador-Geral de Justiça de Gestão Estratégica do MPRS e responsável pelo projeto, João Claudio Sidou.
Selecionada por meio de edital público, a solução da Xertica.ai venceu quatro das cinco frentes propostas e foi construída em conjunto com os promotores, servidores e técnicos do MPRS.
Entre os recursos estão a transcrição automática com diarização, resumos automáticos de depoimentos, identificação de contradições, extração de teses defensivas e análise de sentimentos e vieses cognitivos. A solução opera sobre a infraestrutura da Google Cloud Platform.
De novembro de 2024 a maio de 2025, mais de 23.400 vídeos foram processados, o que representou uma economia de mais de 11.500 horas de trabalho humano.
O country manager da Xertica.ai no Brasil, Gustavo de Paula, comenta que o projeto com o MPRS representa um marco no uso de IA no setor público. “Ao reduzir drasticamente o tempo de análise de provas audiovisuais e permitir decisões mais assertivas, contribuímos não apenas para a agilidade dos processos, mas também para sua equidade e transparência”, afirma.
Ele aponta, ainda, que a IA responde à crescente demanda por Justiça, diante de uma estrutura que não acompanhou esse crescimento. “A inteligência artificial preenche essa lacuna ao automatizar tarefas operacionais, permitindo que os profissionais se concentrem nas decisões realmente estratégicas.”