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Publicada em 15 de Agosto de 2025 às 18:34

Você sabe o que é responsabilidade compartilhada na residência médica?

Durante a residência médica, as decisões são compartilhadas entre o residente e uma equipe de médicos e preceptores

Durante a residência médica, as decisões são compartilhadas entre o residente e uma equipe de médicos e preceptores

Freepik/Divulgação/JC
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Luana Pazutti
Luana Pazutti
A  residência médica é fundamental para a formação de especialistas em diversas áreas da medicina, possibilitando a consolidação dos conhecimentos adquiridos ao longo da graduação. De acordo com a Lei nº 6.932/1981, essa etapa “constitui uma modalidade de ensino de pós-graduação” e pode ser definida, essencialmente, como um “treinamento em serviço”.
residência médica é fundamental para a formação de especialistas em diversas áreas da medicina, possibilitando a consolidação dos conhecimentos adquiridos ao longo da graduação. De acordo com a Lei nº 6.932/1981, essa etapa “constitui uma modalidade de ensino de pós-graduação” e pode ser definida, essencialmente, como um “treinamento em serviço”.
Engana-se, contudo, quem pensa que essa etapa é obrigatória para o exercício da profissão. Pelo contrário, o médico recém graduado já está apto para exercer o ofício e, consequentemente, já deve responder civil, ética e criminalmente por seus atos durante os atendimentos. 
“Tem gente que se forma e começa a trabalhar. Não faz residência. É responsável pelos seus atos. Quando alguém entra num programa de residência médica, também é responsável pelos seus atos, mas de uma forma solidária”, explica o pneumologista Eduardo Garcia, que é presidente da Comissão de Ética do Médica da Santa Casa de Porto Alegre. 
Durante a residência médica, que costuma durar entre dois e cinco anos, as decisões não cabem somente ao residente, mas também a uma equipe de médicos e preceptores. É aí que entra a chamada “responsabilidade solidária”. Esses profissionais devem orientar os atendimentos, incentivando o desenvolvimento de um conjunto de habilidades, conhecimentos e competências essenciais
“O médico residente pode participar de procedimentos médicos, desde que sob supervisão e de acordo com sua capacitação e nível de treinamento”, explica a coordenadora da Comissão de Residência Médica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Adriani Oliveira Galão. 
Essa supervisão, entretanto, não isenta o residente do compromisso que assumiu ao receber o diploma. “Do ponto de vista ético, ele é médico. Então, tem todas as responsabilidades de um médico. Tem que seguir o que diz na legislação como qualquer outro médico”, afirma Garcia. E isso também vale para possíveis erros. 
Em caso de erro médico, quem deve responder?
Depende de cada caso. A advogada Monique Magalhães, que é especialista em defesa médica, destaca que a responsabilidade civil, ética e criminal sobre o ato está atrelada à maneira como a decisão foi tomada.
“Se há ali uma responsabilidade do residente, sem que tenha tido consenso ou autorização do médico preceptor, ele vai responder em relação aos atos dele. Afinal, ele praticou além do que deveria sem supervisão”, explica.
A situação muda, entretanto, quando a decisão é tomada em consenso entre o residente e seu supervisor. Nesse caso, a responsabilidade é compartilhada. “Agora, se o preceptor mandou o residente realizar algum serviço, que, às vezes, ele até não concorda, mas tem que realizar porque está sob supervisão. Provavelmente, não será responsabilizado”, afirma a advogada.
Há ainda casos em que a responsabilidade paira sob o hospital. “Se houve erro por falta de insumo, a gente nitidamente vê que houve uma falha na prestação do serviço médico, não pelo médico staff ou pelo residente, mas sim pela instituição”, completa Monique.
Muitos médicos, poucas vagas
Embora não seja obrigatória, a residência médica é o “caminho mais seguro e efetivo” para o exercício da profissão, de acordo com o vice-presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), Eduardo Neubarth Trindade. No entanto, chegar até essa etapa pode ser mais desafiador do que parece. 
Na última década, o Brasil encarou um aumento significativo na oferta de cursos de medicina. Somente entre 2010 e 2023, foram criadas 209 escolas médicas no País, incluindo 149 particulares e 60 públicas. Esse montante é superior ao total de escolas inauguradas em 200 anos, segundo dados do Conselho Federal de Medicina (CFM). Entre 1808 e 2010, foram fundadas apenas 180 escolas.
Hoje, o número de profissionais recém formados aptos para ingressar no mercado de trabalho é crescente. Por outro lado, a oferta de vagas em residências médicas não acompanhou a mesma tendência. Enquanto a quantidade de estudantes de medicina aumentou em 71% entre 2018 e 2024, a de médicos residentes cresceu somente 26% durante o mesmo período, de acordo com um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
A pesquisa, intitulada Panorama da Residência Médica: Oferta, Evolução e Distribuição de Vagas (2018-2024), aponta ainda que a defasagem entre egressos de medicina e oportunidades para o primeiro ano de residência se agravou, passando de aproximadamente 3,8 mil vagas em 2018 para 11 mil em 2024. 
Como resultado, em novembro de 2024, havia cerca de 210 mil médicos generalistas no País. Isto é, profissionais que não realizaram residência médica nem obtiveram especialização junto à Associação Médica Brasileira (AMB).  
Para Trindade, eis aí a importância de qualificar o ensino durante a graduação. “Nós temos que garantir que mesmo aqueles que não conseguem vagas de residência médica sejam bons médicos. Esse é o grande desafio. Não podemos banalizar nem precarizar a graduação”, destaca. 

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