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Publicada em 29 de Outubro de 2025 às 00:05

Pejotização exige prudência e ética dos profissionais da contabilidade

Cabe ao profissional de Contabilidade explicar aos seus clientes as regras que legitimam a contratação de pessoas jurídicas e alertar quando houver risco de ultrapassar os limites legais

Cabe ao profissional de Contabilidade explicar aos seus clientes as regras que legitimam a contratação de pessoas jurídicas e alertar quando houver risco de ultrapassar os limites legais

/Freepik/Divulgação/JC
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Osni Machado
Osni Machado Colunista
A pejotização, prática em que profissionais prestam serviços como pessoas jurídicas em vez de empregados formais, tem se tornado um tema cada vez mais recorrente nas discussões trabalhistas e tributárias — e o setor contábil está no centro desse debate. O conselheiro do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRCRS), Cristiano Crivelaro Dickel, alerta que o fenômeno traz implicações complexas para empresas e profissionais, exigindo atenção redobrada à legislação e aos princípios éticos da profissão.
A pejotização, prática em que profissionais prestam serviços como pessoas jurídicas em vez de empregados formais, tem se tornado um tema cada vez mais recorrente nas discussões trabalhistas e tributárias — e o setor contábil está no centro desse debate. O conselheiro do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRCRS), Cristiano Crivelaro Dickel, alerta que o fenômeno traz implicações complexas para empresas e profissionais, exigindo atenção redobrada à legislação e aos princípios éticos da profissão.
Segundo Dickel, o principal risco da pejotização está na possibilidade de a Justiça do Trabalho reconhecer o vínculo empregatício entre contratante e contratado. “A relação terceirizada pode ser descaracterizada, gerando custos retroativos com direitos, multas e juros”, afirma. Além disso, a empresa pode ser responsabilizada solidariamente caso a pessoa jurídica contratada possua empregados e descumpra suas obrigações trabalhistas. Para os profissionais contábeis, há ainda o risco de instabilidade financeira e complicações fiscais, especialmente quando a pejotização é usada apenas para mascarar vínculos formais de trabalho.
Apesar dos riscos, Dickel ressalta que a pejotização não é necessariamente irregular. “Ela é legal quando há efetiva prestação de serviços autônomos, com liberdade técnica e sem subordinação típica de emprego”, explica. O problema ocorre quando a relação é apenas formalmente empresarial, mas na prática o trabalhador cumpre ordens diretas, horários fixos e metas diárias, características que configuram vínculo empregatício segundo a CLT.
Nesse contexto, o contador tem papel fundamental ao orientar seus clientes. Cabe ao profissional explicar as regras que legitimam a contratação de pessoas jurídicas e alertar quando houver risco de ultrapassar os limites legais. “A contabilidade deve fornecer subsídios técnicos para que o empresário tome decisões eficientes dentro da legalidade”, observa o conselheiro.
Do ponto de vista tributário, a pejotização costuma reduzir encargos sociais e trabalhistas, como INSS e FGTS, além de diminuir a carga de Imposto de Renda. Esse fator, segundo Dickel, explica parte do interesse crescente por esse modelo, tanto por empresas quanto por profissionais. “Há um movimento claro de expansão da pejotização, impulsionado pela busca por redução de custos e maior autonomia nas relações de trabalho”, comenta.
As vantagens para as empresas incluem economia e simplificação de processos, já que muitas optam por terceirizar atividades secundárias, reduzindo o envolvimento direto com gestão de pessoal. Para os profissionais, há ganhos em flexibilidade, autonomia e liberdade para negociar honorários. “O modelo pode incentivar uma mentalidade empreendedora, com o profissional gerindo sua carreira e suas finanças de forma independente”, destaca.
Contudo, essa flexibilidade vem acompanhada de responsabilidade. O conselheiro enfatiza que o contador pode ser responsabilizado em casos de pejotização irregular, se comprovada sua participação ativa ou omissão diante de fraudes. As sanções podem incluir penalidades civis, fiscais, administrativas e, em situações extremas, criminais. “O Código de Ética do Contador e o Código Civil preveem hipóteses de responsabilização quando há conduta indevida”, adverte.
O cenário tecnológico também amplia os cuidados necessários. Com o avanço do eSocial, PIX e cruzamento automatizado de dados pela Receita Federal, aumentaram as autuações ligadas à pejotização. “A Receita investe fortemente em inteligência artificial e automação, o que torna o monitoramento praticamente em tempo real e eleva a capacidade de identificar irregularidades”, explica Dickel.
Diante desse contexto, os escritórios contábeis devem adotar postura equilibrada, unindo prudência jurídica e compromisso ético. “Os contadores precisam deixar claro que reconhecem a validade da contratação de pessoas jurídicas, mas não podem endossar práticas simuladas”, alerta. O posicionamento técnico e ético do profissional é o que definirá, em muitos casos, se haverá ou não responsabilização.
Com a reforma tributária, o tema tende a ganhar novos contornos. Para Dickel, as mudanças poderão reduzir a atratividade financeira da pejotização, já que o novo modelo deve aumentar a carga tributária sobre o setor de serviços. “Por outro lado, a não cumulatividade plena e o reconhecimento de créditos tributários na contratação de PJs podem criar um novo equilíbrio, tornando a prática novamente vantajosa em determinados casos”, pondera.

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