"O Programa 'Refaz Reconstrução' veio para facilitar a regularização das dívidas estaduais, devido o Rio Grande do Sul possuir cerca de R$ 55,2 bilhões em débitos de ICMS", destaca o advogado tributarista e sócio-diretor da MGT Gestão Tributária, Eduardo Bitello. O especialista avalia a iniciativa como muito positiva para o fortalecimento da economia do Estado e para o restabelecimento de empresas gaúchas que foram impactadas principalmente pela catástrofe climática que ocorreu há exatamente um ano.
De acordo com Bitello, 72% destes débitos com o governo do Estado estão em fase de cobrança judicial, sendo que as empresas que se encontram nesta situação estão pressionadas a realizarem o pagamento destes valores. O advogado tributarista lembra que o Refaz Reconstrução é aplicável a todos os contribuintes que possuam ICMS vencido até 31 de dezembro do ano passado, independentemente de qualquer outro critério. "É um programa bem abrangente, mas só para ICMS".
Bitello explica que 60%, deste do débito das empresas, equivalem a juros, encargos e multas, tornando a dívida mais onerosa para o contribuinte. O especialista destaca também as dificuldades financeiras que as empresas vêm enfrentando, com a pandemia de covid-19, as enchentes, os períodos de seca no Rio Grande do Sul e a inflação elevada.
"Tudo isto contribui muito para o acúmulo de débitos tributários juntamente com a complexidade da gestão tributária, por isso que o Programa Refaz Reconstrução veio em boa hora para facilitar a regularização das empresas", salienta. Ele comenta que o governo do Estado poderia estabelecer um prazo maior para que empresas gaúchas façam a adesão ao Refaz Reconstrução, lamentando o término do programa no último dia 30 de abril.
O JC Contabilidade entrevistou Eduardo Bitello para detalhar alguns aspectos técnicos do Programa "Refaz Reconstrução", instituído pelo Decreto nº 58.067, de 18 de março de 2025.
JC Contabilidade - Quais são as melhores estratégias para aproveitar os benefícios fiscais?
Eduardo Bitello - As melhores estratégias para aproveitar os benefícios fiscais começam com uma premissa fundamental: nunca assumir um compromisso que a empresa não possa honrar. Mais do que escolher a modalidade com maior desconto, é essencial realizar um diagnóstico financeiro completo, avaliando com realismo a capacidade de pagamento e o fluxo de caixa.
Contab - As empresas devem avaliar qual é a melhor modalidade?
Bitello - A decisão sobre qual modalidade aderir — seja pagamento à vista ou parcelado — deve estar alinhada com a realidade financeira e as perspectivas da empresa. Embora a modalidade 1, com até 95% de desconto, seja a mais vantajosa financeiramente, ela exige preparo para um desembolso à vista. Por isso, planejamento é essencial. Além disso, contar com o apoio de um especialista contábil ou tributário é fundamental para avaliar os riscos, as obrigações e identificar a estratégia mais adequada para o negócio. A adesão ao programa deve ser um passo consciente e bem fundamentado, para garantir não apenas a regularização fiscal, mas também a sustentabilidade da empresa no médio e longo prazo.
Contab - Como a medida pode influenciar à saúde financeira e a competitividade do setor empresarial gaúcho?
Bitello - De diversas maneiras, como: melhorar a saúde financeira das empresas, o reequilíbrio do fluxo de caixa e o principal, a saída da inadimplência. Visto que, com a saída da inadimplência há a reintegração ao mercado, a sobrevivência da empresa e o estímulo da retomada econômica. Assim, o Refaz Reconstrução não é apenas um alívio fiscal; é uma política pública estratégica que pode ser decisiva para preservar negócios, empregos e a capacidade produtiva do Rio Grande do Sul em um momento crítico.
Contab - Qual é o principal desafio dos contribuintes?
Bitello - No meio da turbulência, como a enchente, por exemplo, o maior problema é quando o contribuinte tem débito. E, quando ele tem débito, ele perde a chamada "regra da idade fiscal", que na prática é a certidão negativa de débitos. Sem essa certidão, ele não pode participar de licitações, não tem acesso a financiamentos bancários, e isso complica muito a vida da empresa, que acaba não gerando o capital. Então, eu acho que esse é o principal desafio: conseguir fazer um acordo para regularizar a situação. Outro grande desafio é quando ele contrata uma assessoria especializada, porque existem quatro modalidades de acordo, e não é simplesmente "entrar para entrar". Se ele fizer um acordo sem analisar direito, pode acabar comprometendo o fluxo de caixa da empresa. Isso pode inviabilizar o negócio e levar até à exclusão do programa, fazendo com que ele perca o dinheiro investido no acordo. Além disso, se ele sai do acordo, o débito volta atualizado pela taxa Selic, o que pode ser um problema ainda maior.
Contab - A regularidade fiscal é fundamental?
Bitello - Sim. Quando uma empresa faz um acordo, ela recupera a sua regularidade fiscal e, deste modo, passa a ter acesso a diversos benefícios que o governo oferece. Sem essa regularidade, esses benefícios ficam bloqueados, e a empresa perde várias vantagens importantes. Isso gera um grande problema. Quando uma companhia está com a certidão negativa suspensa, além de ter o acesso ao crédito bancário negado, ela também não pode participar de licitações. Além disso, perde o acesso a benefícios fiscais que o estado concede, como o crédito presumido. Por exemplo, o ICMS, que normalmente é 17%, pode cair para 12% ou até 7%, dependendo do setor e do segmento da empresa. Isso é muito comum em indústrias, especialmente no setor de água e saneamento.
Contab - Há outras vantagens, como evitar a penhora?
Bitello - À medida que pode influenciar a saúde financeira da empresa é a seguinte: quando ela possui a Certidão Negativa de Débitos, ela tem acesso ao crédito presumido e também deixa de sofrer medidas executórias, como penhora online. Além disso, a empresa passa a ter acesso a linhas de crédito governamentais, como a linha da Financiadora de Estudos e Projetos (Fnep), que é uma modalidade de empréstimo do governo destinada a quem está com a situação cadastral regularizada. Portanto, estar regular traz uma série de benefícios, não apenas para evitar as execuções fiscais, mas também para proteger o patrimônio da empresa. Por exemplo, evita a penhora online e a desconsideração da personalidade jurídica, que é quando os débitos da empresa podem recair sobre a pessoa física dos sócios. Em resumo, manter a regularidade fiscal é fundamental para a saúde financeira e a segurança jurídica da empresa.