"A Instrução Normativa (IN) nº 2.219/2024, da Receita Federal, que previa modernização da fiscalização do Pix, estendendo o monitoramento das transações aos bancos digitais, fintechs e instituições de pagamento, revogada em 15 de dezembro, gerou incertezas junto à população", cita o presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRCRS), Márcio Schuch.
Uma das principais preocupações é o impacto dessa revogação na credibilidade do sistema fiscal brasileiro. O Pix, criado em 2020, já se consolidou como um dos meios de pagamento mais utilizados no País, com milhões de transações diárias. No entanto, mudanças constantes nas normativas podem afetar a confiança dos usuários e dificultar a adaptação de instituições financeiras.
O governo federal editou a Medida Provisória nº 1.288, de 16 de janeiro de 2025, que dispõe sobre medidas para ampliar a efetividade do sigilo e proibir a cobrança de preço superior ou encargos adicionais nas transações realizadas via Pix, equiparando-o ao pagamento em espécie. A MP reforça princípios constitucionais, como o sigilo bancário e a isenção de tributos nas transferências realizadas via Pix, além de estabelecer que qualquer prática de diferenciação de preço por meio desse arranjo de pagamento será considerada abusiva, sujeitando os infratores às penalidades previstas no Código de Defesa do Consumidor.
Em sua análise, Schuch avalia que a IN 2.219/2024, que estabelecia a fiscalização das transações via Pix a partir de janeiro de 2025, não apresentava mudanças significativas. "Na minha opinião, a IN 2.219/2024, que previa a fiscalização do Pix e entrou em vigor em 1º de janeiro de 2025, não trazia grandes novidades. No entanto, foi revogada pela Receita Federal em razão de boatos sobre uma suposta taxação do Pix", ressalta.
A Receita Federal, segundo Schuch, recebe informações dos bancos tradicionais e de diversas outras instituições financeiras sobre as transações via Pix e cartão de crédito já há bastante tempo. Com a revogação da IN nº 2.219, passa a vigorar a anterior, ou seja, a IN nº 1.571, de 2015. Embora o Pix não seja diretamente mencionado na norma, há uma relação indireta com esse sistema de pagamento devido à natureza das informações financeiras coletadas.
O dirigente explica que, com regras anteriores retomadas, os limites para o reporte de movimentações financeiras ao Fisco voltam a ser mais baixos do que os estipulados pela regra revogada. Segundo Schuch, com a crescente digitalização, o debate sobre segurança e transparência nas transações eletrônicas tem ganhado relevância. "Além das questões tributárias, os especialistas apontam para a importância de proteger os dados dos usuários, especialmente considerando o aumento de casos de golpes e fraudes envolvendo o Pix".
A novidade, segundo o dirigente, seria a entrada de alguns outros meios de pagamentos pré-pagos, incluindo, por exemplo, a moeda eletrônica, ou seja, neste caso, a Receita Federal também antecipa a criação do "Real eletrônico" que vai acontecer no futuro - neste caso incluindo as transações via bancos digitais, fintechs e instituições de pagamento.
Na análise feita por Schuch, a transição para o "Real eletrônico", prevista para os próximos anos, faz parte do esforço do Banco Central para modernizar o sistema financeiro nacional. "O projeto Drex visa integrar moedas digitais de forma segura, ampliando as possibilidades de pagamento e reduzindo os custos operacionais", diz.
CRCRS defende campanha de combate à informalidade
O objetivo da Receita Federal com a medida era criar novos instrumentos de modernização que acompanhassem a evolução das transações digitais. Como as normativas abrangem operações financeiras em geral, o Pix já estava incluído no monitoramento previsto por normativas anteriores. "Apenas no primeiro semestre de 2024, o Pix movimentou R$ 29 bilhões, segundo a Febraban, o que reforça a necessidade de aprimorar o acompanhamento e intensificar o combate à sonegação fiscal", diz o presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRCRS), Márcio Schuch.
"A situação atual levou a população a reflexões também em relação aos pronunciamentos do governo desmentindo possíveis tributações sobre o Pix. A população direcionou o seu olhar para algo que já existia, porém, sem dar a devida atenção ao seu significado", analisa. Ele diz que as pessoas passaram a fazer questionamentos sobre quais motivos levaram a Receita Federal a indicar valores, considerados relativamente baixos, transacionados via Pix para serem reportados à e-Financeira. "Isso não consta no texto da IN que foi revogada", destaca.
Schuch considera legítimo e importante que a sociedade acompanhe mais de perto o desenrolar das ações do governo. "Ainda mais agora em que estamos passando por mudança com a reforma tributária. Há um lado positivo no fato de as pessoas estarem preocupadas com a questão arrecadatória, que também faz parte do ser cidadão", analisa.
Outro ponto destacado por ele é que, independentemente da IN, a Receita Federal tem, dentro de seus encargos, que deliberar de qual modo irá realizar o seu trabalho de fiscalização. A IN iria ampliar o alcance da fiscalização, incluindo novas entidades, especialmente aquelas que gerenciam contas de depósito, contas de poupança, contas de pagamento do tipo pré-paga ou pós-paga e contas em moeda eletrônica. Essas alterações reforçariam o combate à sonegação fiscal e a práticas ilícitas, como a evasão de divisas e a lavagem de dinheiro, alinhando a legislação à realidade do mercado financeiro atual.
Questionado sobre o grande índice de informais no País e o uso do Pix em suas operações financeiras, Schuch diz que são necessárias, em primeiro lugar, medidas para tirá-los dessa informalidade para flexibilizar a tributação desses empreendedores. "A solução não é diretamente aumentar a fiscalização, mas a própria Receita Federal tem um programa de conformidade, sendo que o primeiro passo é incentivar os empreendedores para que se organizem e se formalizem para depois fiscalizar", diz, ao destacar que as ações seriam muito mais pedagógicas e poderiam ser promovidas via Ministério do Desenvolvimento Econômico.