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Publicada em 05 de Janeiro de 2024 às 14:41

Para a Unesco, pessoas comprometidas mudam o mundo

Marlova destaca papel importante de grupos empresariais na área da filantropia

Marlova destaca papel importante de grupos empresariais na área da filantropia

Tânia Meinerz/JC
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Patricia Knebel
Patricia Knebel
Ela nasceu em Uruguaiana (RS), mas hoje se divide entre Brasília e o mundo. Já perdeu as contas de quantos países, culturas e pessoas conheceu ao longo dos seus 27 anos na Organização das Nações Unidas (ONU). Mestre em Serviço Social, Marlova Jovchelovitch Noleto começou na sua carreira dentro da instituição no Unicef e, desde 2018, é a diretora e representante da Unesco no Brasil. No escritório, na capital do País, dedica-se a pautas como a promoção de uma educação de qualidade para todos, dos direitos humanos, da redução das desigualdades sociais, do avanço das ciências, da liberdade de expressão e da diversidade cultural. Romena, Marlova nasceu em uma família multicultural. "Eu acredito que isso foi muito determinante para a minha visão de mundo, compreendendo a importância do quanto a cultura e o lugar onde a gente nasce e cresce nos ajudam a construir nossa história", analisa. Da mesma forma, o fato de a sua mãe ser professora e bibliotecária fez com que Marlova crescesse em um universo com muito acesso à leitura e à cultura, uma família também comprometida com ideais de justiça social. "Isso também condicionou a escolha da minha profissão e do que eu queria fazer na vida. Me sinto muito feliz e realizada, porque o meu trabalho me permite fazer o que eu mais gosto, que é trabalhar por um mundo mais justo, inclusivo e humano", analisa.
Ela nasceu em Uruguaiana (RS), mas hoje se divide entre Brasília e o mundo. Já perdeu as contas de quantos países, culturas e pessoas conheceu ao longo dos seus 27 anos na Organização das Nações Unidas (ONU). Mestre em Serviço Social, Marlova Jovchelovitch Noleto começou na sua carreira dentro da instituição no Unicef e, desde 2018, é a diretora e representante da Unesco no Brasil. No escritório, na capital do País, dedica-se a pautas como a promoção de uma educação de qualidade para todos, dos direitos humanos, da redução das desigualdades sociais, do avanço das ciências, da liberdade de expressão e da diversidade cultural. Romena, Marlova nasceu em uma família multicultural. "Eu acredito que isso foi muito determinante para a minha visão de mundo, compreendendo a importância do quanto a cultura e o lugar onde a gente nasce e cresce nos ajudam a construir nossa história", analisa. Da mesma forma, o fato de a sua mãe ser professora e bibliotecária fez com que Marlova crescesse em um universo com muito acesso à leitura e à cultura, uma família também comprometida com ideais de justiça social. "Isso também condicionou a escolha da minha profissão e do que eu queria fazer na vida. Me sinto muito feliz e realizada, porque o meu trabalho me permite fazer o que eu mais gosto, que é trabalhar por um mundo mais justo, inclusivo e humano", analisa.
Empresas e Negócios - Vivemos um mundo exponencial, de novas tecnologias e muita aceleração. Na sua visão, quais os riscos disso para a humanidade?
Marlova Jovchelovitch Noleto - A velocidade do acesso à informação determina que as pessoas lidem de maneira diferente com as grandes questões da humanidade. O mundo está muito exposto à desinformação. Vivemos uma guerra de narrativas. Na Unesco, sempre alertamos as pessoas de que elas precisam estar muito atentas sobre que tipo de notícias consomem e quais são as fontes. É fundamental checar a veracidade dos fatos. Durante a pandemia, vimos o perigo da desinformação a ponto de, em muitos casos, essa ser a diferença entre a vida e a morte, quanto se falou que as vacinas não funcionavam. No final, elas salvaram vidas, permitindo que o mundo pudesse voltar a sua normalidade. A retomada das viagens, dos encontros presenciais, tudo isso só foi possível graças às vacinas, ao avanço e ao progresso da ciência. Precisamos reconhecer o quanto o avanço científico é importante para a humanidade.
E&N - Como a Unesco tem se posicionado em relação ao impacto de temas de temas de futuro, como a Inteligência Artificial?
Marlova - A Unesco tem uma área focada em antecipar futuros e, com isso, apoiar a nossa capacidade de nos anteciparmos e nos prepararmos para as mudanças, que é a Futures Literacy (Alfabetização de Futuro). Como uma organização que tem também funções normativas, nos preocupamos em lidar com tudo isso e envolver os países para que possamos discutir e aprovar recomendações importantes. Em fevereiro deste ano, a Unesco discutiu a necessidade da criação de um ambiente de mais confiança para a internet. Realizamos uma conferência na nossa sede, em Paris, falando sobre quais são os requisitos e as principais recomendações que os países têm para que se construa esse ambiente de confiança. E, claro, um dos temas importantes que temos discutido é o uso da Inteligência Artificial (IA) a partir de recomendações éticas. É muito importante entender em que contexto a IA vai, cada vez mais, ocupar um papel fundamental nas nossas vidas e compreender de que maneira lidaremos com as implicações disso. No futuro, estaremos falando sobre decisões que vão ser tomadas sobre vida e sobre morte por uma máquina, sobre quem tem prioridade em determinadas situações. Isso precisa ser melhor debatido.
E&N - Vivemos um mundo desigual, e a tecnologia acaba amplificando isso muitas vezes. Qual é o caminho para tentarmos construir uma nova realidade?
Marlova - O mundo exige uma revisão dos padrões de desenvolvimento. Percebo, com muita alegria, que os empresários hoje têm mais preocupações com a sustentabilidade, com as boas práticas de governança, com o social. O conceito ESG (Environmental, Social and Governance) nos alerta para isso. A responsabilidade social corporativa vem crescendo cada vez mais. Grandes corporações brasileiras têm seus institutos, suas fundações. Nós também vemos famílias de grandes empresários onde a filantropia se tornou uma prática. Um bom exemplo é o Instituto Península, que é da família do Abílio Diniz. O grupo Suzano faz um trabalho fantástico na área social, bem como as iniciativas do Banco Bradesco, o Banco Itaú e a Fundação Banco do Brasil. O mundo empresarial, hoje, tem um compromisso muito genuíno em olhar para os modelos de desenvolvimento.
E&N - Você comentou na nossa conversa que o Brasil é um país onde a gente não pode falar em médias, porque a desigualdade provoca uma assimetria muito grande.
Marlova - Exatamente. Nos fóruns internacionais dos quais participo, sempre costumo dizer que o Brasil não é um país que nos permite falar em média. As médias nos darão uma visão muito equivocada da situação, porque, mesmo no Rio Grande do Sul, que todo mundo olha como um estado muito rico, nós também temos bolsões de muita pobreza e miséria. No Maranhão e o Piauí, estados onde o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é mais baixo, têm regiões de extremo desenvolvimento. Sempre gosto de citar que o melhor resultado do ENEM, do ensino médio, é de uma escola pública do Piauí, a Dom Barreto. Existem IDEBs (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de excelência no Nordeste. Então, as pessoas, às vezes, têm aquela visão estereotipada e ultrapassada de que o Nordeste não está suficientemente desenvolvido. Isso não é verdade. Tem locais muito desenvolvidos, com excelentes resultados, e locais, também, de extrema pobreza.
E&N - Que lições e aprendizados a desigualdade deve trazer?
Marlova - A desigualdade nos cobra um preço e ela precisa ser enfrentada. E esse não é um fenômeno exclusivo do Brasil, é mundial. Claro que alguns países já chegaram a outro estágio de desenvolvimento, e aí a desigualdade é muito menor. Os países que, hoje, tem uma melhor qualidade de vida são países onde a desigualdade é muito pequena. Então, isso também nos ensina lições que precisam ser aprendidas. Menos desigualdade, melhor qualidade de vida, menos problemas de segurança. Em que mundo nós queremos viver? Essa é uma pergunta que nos cabe fazer.
E&N - Mesmo com todo esse cenário desafiador, você é otimista quanto ao futuro?
Marlova - Eu sou otimista, sim, porque acredito que a humanidade, ao longo da sua existência, tem dado provas de que precisamos continuar a sonhar que o mundo pode ser um lugar melhor para todos, e que para isso cada um precisa fazer a sua parte. Onde houver miséria, destruição, terrorismo, tragédias naturais também vai haver um grupo de pessoas comprometidas, dispostas a ajudar e a reconstruir. E é isso que a humanidade tem nos mostrado. Foi dos escombros da Segunda Guerra que nasceu as Nações Unidas e também a Unesco, que foi uma das primeiras agências criadas depois da própria criação da ONU. E o lema das Nações Unidas, o nosso mote, é não deixar ninguém para trás. É realmente ter um compromisso para que o mundo possa ser um lugar melhor para todos. Eu acredito que são as pessoas comprometidas que mudam o mundo.
E&N - A pandemia mudou muito os parâmetros da sociedade?
Marlova - A pandemia alterou completamente as expectativas, as visões de mundo. Nos impôs, como primeiro resultado, a necessidade de redescobrir a solidariedade. Nós não estamos sós no mundo, não vivemos só. E, assim como a pobreza e a miséria não conhecem fronteiras, elas são transnacionais, elas migram, o vírus também não conhecia fronteiras. O mundo acordou diante disso, e percebeu o quanto a inovação é importante, o quanto a ciência tem um papel fundamental. O progresso científico ele impacta na vida, porém, não é alcançável da mesma maneira para todos. Então, de novo, a desigualdade cobra um preço. Hoje, existe a necessidade do mundo se comprometer muito com a inovação, com o progresso da ciência, para que isso seja, de fato, alcançável por todos. E aí, eu acho que a pergunta que nos cabe fazer é: quem cabe no todos? Quando nós dizemos um lugar melhor para todos, nós estamos falando de quem? É preciso que, de fato, todos estejam unidos e que haja um compromisso em reduzir a pobreza, reduzir a fome, a desigualdade, promover a diversidade, promover a inclusão.
E&N - Muitas startups estão surgindo com uma inclinação para impacto social. Qual o papel da nova geração de empresas mudar o mundo?
Marlova - Não faz sentido hoje uma empresa nascer se não tiver um compromisso muito grande com a transformação do mundo, com a redução das desigualdades, com as melhores práticas de governança corporativa, com o conceito ESG muito enraizado, e eu acho que a gente está percebendo que isso também é uma realidade aqui no Brasil. Os empresários aumentam o seu compromisso com as práticas de uma boa governança, com o desenvolvimento sustentável, com a questão social, quando eles percebem que isso também tem um impacto real no seu modelo de negócios. 
 

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