A expectativa de uma safra recorde nos Estados Unidos, combinada à menor demanda chinesa e a um câmbio menos favorável, deve manter pressão sobre os preços do milho no Brasil nos próximos meses. A avaliação faz parte do Agro Mensal, relatório divulgado pela Consultoria Agro do Itaú BBA, que aponta aumento da oferta global e dificuldades para sustentação das cotações no mercado doméstico.
De acordo com o Departamento de Agricultura norte-americano (USDA), os estoques finais dos EUA devem subir 59% na safra 2025/26, passando de 42 milhões para 53,8 milhões de toneladas, resultado da combinação de área maior, produtividade recorde e revisão positiva para a produção, agora estimada em 425 milhões de toneladas. Esse movimento amplia a oferta global e pressiona os preços internacionais, que já acumulam quatro quedas mensais consecutivas na Bolsa de Chicago (CBOT). Em agosto, a cotação recuou 5,6%, para US$ 3,85 por bushel.
No cenário interno, a Conab revisou para cima a produção de milho da safra 2024/25, agora estimada em 139,7 milhões de toneladas. O incremento de 8 milhões de toneladas veio principalmente da 2ª safra, que atingiu 112 milhões de toneladas. Apesar da maior disponibilidade, a comercialização no Brasil segue cadenciada, com produtores segurando vendas na expectativa de novas altas, semelhantes às registradas em 2024, quando a cotação do dólar saltou de R$ 4,70 para R$ 6,30 no segundo semestre.
Segundo o Itaú BBA, o contexto atual é diferente. A valorização do dólar tem sido limitada, e os armazéns precisam ser liberados até janeiro para a entrada da soja, o que deve forçar maior volume de vendas e reforçar a pressão sobre os preços.
Mesmo diante da colheita da 1ª safra avançada, os preços internos reagiram em agosto em algumas regiões devido à retração vendedora. Em Sorriso (MT), o milho subiu 6,7%, para R$ 44 a saca, enquanto em Campinas (SP) houve leve alta de 0,4%. Para a consultoria, esse fôlego tende a ser temporário diante do cenário global mais ofertado.
Outro fator que reforça a pressão internacional vem da China. O USDA projeta produção de 295 milhões de toneladas para 2025/26, mantendo o país em patamares elevados de autossuficiência, resultado de ganhos de produtividade associados ao uso de milho transgênico. Isso deve manter as importações em níveis mais baixos, reduzindo o papel do gigante asiático como comprador de excedentes globais.
Para o Itaú BBA, o cenário indica que o produtor brasileiro precisará reavaliar estratégias de comercialização. A expectativa de novas altas pode não se concretizar diante da combinação de estoques recordes nos EUA, câmbio mais baixo e menor demanda externa, em um mercado que caminha para maior equilíbrio entre oferta e consumo.
No campo, o plantio da safra de verão 2025/26 avança, especialmente no Sul. No Rio Grande do Sul, o avanço do plantio e a força do consumo interno dão outro contorno ao mercado. Segundo o coordenador da Câmara Setorial do Milho da Secretaria da Agricultura, Jefferson Camozzato, cerca de 50% da área estimada para a safra de verão já foi semeada, com expectativa de atingir 60% até o final desta semana. Os trabalhos estão mais adiantados em regiões como Sananduva, Lagoa Vermelha, Ibiraiaras e Itapejara, enquanto áreas de maior altitude, como Vacaria e São José dos Ausentes, terão plantio mais tardio.
A Emater-RS projeta 785 mil hectares cultivados com milho nesta safra de verão, um crescimento de cerca de 9% em relação ao ciclo anterior. Para Camozzato, que também coordena a Comissão do Milho da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), com essa ampliação a produção estadual deve ser suficiente para atender a maior parte da demanda local, estimada em 7 milhões de toneladas, impulsionada especialmente pelos setores de aves e suínos.
Historicamente, o Estado precisa importar de 1,5 milhão a 2 milhões de toneladas de outras regiões do Brasil ou de países vizinhos para suprir o consumo. Neste ano, porém, a expectativa é de menor dependência externa.
“O consumo interno é muito forte e garante mercado para o milho gaúcho. A pressão internacional pode ser menor para os produtores do Estado”, avaliou.
Camozzato destacou ainda que os preços no Nordeste gaúcho têm se mantido em torno de R$ 60 a saca por vários dias, patamar sustentado pela demanda local. Além do consumo animal e humano, ele lembrou que a cultura ganha nova relevância com as perspectivas de uso do milho para a produção de etanol, o que pode ampliar alternativas de escoamento no futuro.
Apesar disso, o dirigente da Farsul ressalta que a safra ainda depende do comportamento climático e do acesso a crédito, considerado escasso neste início de plantio.
“O produtor está descapitalizado e endividado. O que todos esperam é que tenhamos uma boa safra para garantir renda e abastecimento”, finalizou.