Thiago Copetti, especial JC
Com a cotação em baixa, horizonte de exportações incerto e a possibilidade de estiagem no final deste ano, o novo ciclo da soja deve ser semeado em área menor do que em todas as últimas cinco safras. E, com a perda de nutrientes do solo nas áreas atingidas pelas enxurradas do ano passado, a produção também poderá apresentar menor produtividade, alerta o presidente da Associação dos Produtores de Soja do Brasil no Rio Grande do Sul (Aprosoja/RS), Ireneu Orth. “Com tantas incertezas sobre questões climáticas, mercado e preços ruins, parte das áreas da Metade Sul, por exemplo, deve voltar a abrigar a criação de gado. Na pecuária, mesmo que chova ou tenha estiagem, se pode preparar o pasto com silagem e reservar para o futuro”, explica Orth. Em entrevista ao podcast JC Agro, gravado diretamente da Expointer, o dirigente avaliou este e outros temas relativos ao mercado nacional e internacional da oleaginosa.
Jornal do Comércio - Estamos dando início ao plantio da safra 2025/2026. Qual cenário e perspectivas para a semeadura e a colheita?
Ireneu Orth - Existem situações distintas entre o Rio Grande do Sul e o restante do Brasil, especialmente no Centro-Oeste e no Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Aqui, em função dos problemas climáticos, tivemos prejuízos muito grandes nos últimos anos, e muito produtor está descapitalizado e endividado. Parte, também, inadimplente e sem acesso ao crédito. A situação é bem complicada para o próximo plantio no Rio Grande do Sul. No Centro-Oeste e no Matopiba a situação é diferente, porque houve problema há mais tempo. Nos últimos cinco anos, porém, justamente no período em que nós tivemos problemas, o preço estava alto, em cerca de R$ 220 o bushel (atualmente está em R$120) e, fora do Estado, os produtores se capitalizaram. Quem fez boa gestão está equilibrado. Aqui mesmo, quem tem feito boa gestão, principalmente quem avançou um pouco em termos de investimento, tem problemas. Essas frustrações preocupam todo o Estado. Além do produtor, essa crise alcança também o comércio e indústria, de um modo geral, e os órgãos públicos, com menos geração de recursos, como impostos.
JC - As enxurradas de 2023 e de 2024 afetaram a qualidade do solo em muitas regiões, levando embora anos de investimentos em fertilizantes e nutrientes. Devemos esperar uma produtividade menor?
Orth - De um modo geral, sim. Mas são situações diferenciadas dentre propriedades e de agricultor para agricultor. Em áreas mais consolidadas já se conseguiu investir para plantar com tecnologia razoável e manter o solo equilibrado. Mas há erosões em grandes propriedades, especialmente na Metade Sul do Estado, onde as áreas são maiores, o custo é muito elevado para quem está descapitalizado. As chuvas levaram embora muito adubo e matéria orgânica, e a seca também prejudica as condições do solo. Então, teremos áreas com pouca tecnologia, onde o solo está praticamente exaurido, e isso vai afetar a produção total no Estado. Nós que imaginávamos poder voltar a ser o segundo maior produtor do Brasil, vamos ter dificuldade para chegar a esse ponto na safra que se avizinha. Em safras normais, o Paraná deverá continuar mantendo a segunda posição. Hoje, nessa última safra, a terceira posição foi do Goiás.
JC - Após tantos anos de problemas climáticos, onde o Rio Grande do Sul se posiciona entre os grandes produtores nacionais?
Orth - Estamos em quarto lugar, correndo o risco de, logo em seguida, se continuarmos nessa produtividade baixa e grandes perdas, perdermos terreno até para a Bahia. Mas, se tivermos uma safra normal, o que já seria muito bom, nós temos chance, sim, de chegar ao segundo lugar ou próximo ao segundo lugar, que é do Paraná, mas não nesse novo ciclo. O estado de Goiás tem mais chance de crescer, porque a área é mais recente, tem áreas por abrir e irrigação muito avançada. Os sistemas de irrigação nessas regiões já estão, proporcionalmente, tão grandes ou até maiores do que no Rio Grande do Sul. Nossa área de expansão, que seria a Metade Sul do Estado, é a região que menos chove.
JC - Cotações e custos de produção mudam ano a ano. Ao longo de cinco ciclos de perdas no Estado, qual o impacto desses fatores?
Orth - Hoje, estamos pouco acima de US$ 10 o bushel, isso representa, em reais, um preço médio em volta de R$ 120 a R$ 130 a saca. Já chegamos a US$ 13 o bushel e, na época, há cerca de três anos, o dólar estava em cerca de R$ 6. Com isso, a saca chegou a R$ 180, R$ 200, no melhor momento de comercialização do ano. Não foi toda a safra assim, mas foi o preço mais alto que se atingiu, justamente em um momento em que o Rio Grande do Sul não tinha muita soja para vender. Ou seja, o produtor gaúcho não conseguiu se capitalizar naquele momento. E, um detalhe que é importante, os custos dos insumos subiram, e quem põe o preço dos insumos é o fabricante, é o mercado. E, quando a soja desceu, esses preços dos insumos não desceram. Então, os custos permaneceram altos, como o dos fertilizantes. É um fator que deixa pouca renda para o produtor, que se descapitalizou em função de ter pouco produto para vender na alta da commodity, e chegamos nessa situação que chegamos. Já no Centro-Oeste e no Matopiba a safra foi boa e eles aproveitaram o preço, o que equilibrou a situação financeira do produtor que, antes, também enfrentou perdas climáticas. Fato que não aconteceu no Rio Grande do Sul.