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Publicada em 17 de Junho de 2025 às 17:47

Pecuária mira qualidade e coordenação para amplificar ganhos no futuro

Lygia Pimentel vê momento atual como janela ideal para compra de gado e preparação para valorização do produto em 2026

Lygia Pimentel vê momento atual como janela ideal para compra de gado e preparação para valorização do produto em 2026

CLAUDIO MEDAGLIA/ESPECIAL/JC
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Claudio Medaglia
Claudio Medaglia Repórter
Com um olhar voltado para o futuro da carne bovina, a XX Jornada NESPro & Congresso Internacional de Criadores, iniciada nesta terça-feira (17) em Porto Alegre, foi aberta com reflexões sobre mercado, sanidade animal, clima político internacional e os rumos estratégicos da pecuária brasileira. O evento, promovido pelo Núcleo de Estudos em Sistemas de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva (NESPro) da Ufrgs, em parceria com o Instituto Desenvolve Pecuária, deixou, já na largada, um recado importante: o momento é favorável para ampliação dos planteis, mas precisa ser analisado com estratégia, para saber a hora certa de parar de comprar. 
Com um olhar voltado para o futuro da carne bovina, a XX Jornada NESPro & Congresso Internacional de Criadores, iniciada nesta terça-feira (17) em Porto Alegre, foi aberta com reflexões sobre mercado, sanidade animal, clima político internacional e os rumos estratégicos da pecuária brasileira. O evento, promovido pelo Núcleo de Estudos em Sistemas de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva (NESPro) da Ufrgs, em parceria com o Instituto Desenvolve Pecuária, deixou, já na largada, um recado importante: o momento é favorável para ampliação dos planteis, mas precisa ser analisado com estratégia, para saber a hora certa de parar de comprar. 
A abertura ficou por conta da veterinária e CEO da Agrifatto, Lygia Pimentel, que traçou um panorama técnico sobre o ciclo pecuário brasileiro. Segundo ela, o País vive o fim da fase de baixa — o que, embora represente margens apertadas para o pecuarista, configura uma janela ideal para aquisição de gado a preços menores e preparação para um novo momento de valorização, previsto para 2026.
Já temos três anos de liquidação de fêmeas. Isso reduz a oferta de bezerros e sinaliza a reversão do ciclo”, afirmou Lygia.
O alerta é claro: o grande desafio será ter oferta quando os preços subirem e, mais adiante, saber a hora de parar, evitando comprar gado no pico de preços projetado para 2027.
A analista destacou a diversificação do mercado externo como pilar de sustentação dos preços internos. A China, que antes respondia por até 60% das exportações brasileiras, agora representa cerca de 37%, abrindo espaço para EUA e México.
Essa diluição do risco China foi fundamental. Exportar é o que tem segurado a precificação num mercado interno ainda estagnado”, observou.
No entanto, o acesso a crédito continua restrito, com taxa Selic alta, inflação resistente e margens em queda. No RS, a rentabilidade da pecuária segue parâmetros similares aos dos demais Estados e caiu de 45% para até 17%, dependendo da região.
Mas, mesmo importando carne mais barata de outros Estados, o RS preserva sua identidade na carne de alta qualidade, destacou Lygia.
Esse mercado premium já foi conquistado e cresce. Quem provou, não volta atrás”, observou, considerando que essa é uma característica que pode ser potencializada nas ações comerciais dos produtores e frigoríficos gaúchos.

Painelistas divergem do fim da vacinação contra aftosa

Um dos temas mais debatidos no Congresso foi o novo status sanitário do Brasil como país livre de febre aftosa sem vacinação. Embora reconheça o esforço sanitário, Lygya fez críticas à retirada da vacina.
O Uruguai vacina e acessa mercados como Japão e Coreia do Sul, pretendidos pelo Brasil. A vacina era mais uma camada de proteção. Retirá-la não é garantia de melhores preços e pode expor o país a riscos.
Essa visão foi compartilhada por Fernando Mattos, ex-ministro da Agricultura do Uruguai, que conversou com o Jornal do Comércio antes de palestrar no evento.
A vacinação é estratégica. O Uruguai manteve o status com vacinação e não ficou atrás nos mercados de elite. O Brasil está assumindo um risco importante ao abrir mão dessa defesa sanitária, especialmente com fronteiras porosas e pouca vigilância”, disse.
Mattos apontou "falta de coordenação" entre os países do Mercosul para que possam estabelecer maior valorização aos seus produtos, mesmo sendo responsáveis por mais de 55% das exportações mundiais de carne bovina.
Vamos às feiras como concorrentes, mas poderíamos ser formadores de preço. Ainda operamos como commodity, favorecendo os compradores”, apontou.
Ele também destacou as vantagens naturais e genéticas para a produção de carne de qualidade, sobretudo no RS e Uruguai, com clima temperado, raças europeias e pastagens naturais. No entanto, alertou para a necessidade de investimento em pesquisa para reduzir os impactos do inverno nas pastagens e encurtar o ciclo de produção, o que também teria efeito positivo nas emissões de gases do efeito estufa.
Mattos encerrou sua fala com tom realista ao olhar para o futuro do segmento: “A conjuntura geopolítica é delicada, mas o futuro da demanda por carne bovina é promissor, especialmente com o crescimento da classe média no Sudeste Asiático. Nossa região tem um papel central nisso.”

'Sem vacinação, risco da reintrodução da febre aftosa no Brasil é alto e preocupante'

Ex-ministro da Agricultura do Uruguai criticou falta de coordenação no Mercosul para valorizar carne bovina no mercado internacional

Ex-ministro da Agricultura do Uruguai criticou falta de coordenação no Mercosul para valorizar carne bovina no mercado internacional

CLAUDIO MEDAGLIA/ESPECIAL/JC
Palestrante de abertura da XX Jornada NESPro & Congresso Internacional de Criadores, o ex-ministro da Agricultura do Uruguai, Fernando Mattos falou ao Jornal do Comércio sobre riscos sanitários, coordenação regional e o papel do Mercosul na geopolítica da carne.
Jornal do Comércio – O senhor é otimista ou cauteloso quanto ao futuro da pecuária?
Fernando Mattos – Sou otimista no longo prazo. A demanda por carne bovina tende a crescer, especialmente no Sudeste Asiático. Mas, diante do atual cenário geopolítico, com guerras e instabilidade comercial, temos que ser cautelosos no curto prazo.
JC – O novo status sanitário do Brasil, livre de febre aftosa sem vacinação, pode ser uma vantagem?
Mattos – Em tese, sim. Mas ainda não vimos essa vantagem se materializar em acesso a mercados. O Uruguai, mesmo vacinando, já exporta para Japão e Coreia. O risco da reintrodução da doença no Brasil, sem vacina, é alto e preocupante.
JC – O senhor vê o Mercosul com papel de liderança no mercado global de carne?
Mattos – Deveria ter. Somos mais de 55% das exportações globais, mas ainda atuamos de forma descoordenada. Isso nos tira poder de barganha. Precisamos construir uma voz única, formar preços e negociar tarifas de forma conjunta.
JC – E quanto ao diferencial da carne do Sul?
Mattos – É nítido. Clima temperado, raças europeias e manejo mais controlado. A carne do Rio Grande do Sul e do Uruguai tem padrão superior e pode buscar mercados premium – mas ainda falta marketing e estrutura para isso.

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