Segundo o especialista em Alimentos e Bebidas do Sebrae/RS, Roger Klafke, que coordena cerca de 800 projetos envolvendo toda a cadeia da área – desde o agronegócio e indústria até o varejo – a notícia prejudica os setores envolvidos. “No momento, principalmente os bares e restaurantes vêm passando por uma situação muito difícil, sendo que muitos empresários estão endividados por terem se visto obrigados a ir atrás de crédito e adequar modelos para o delivery”, explica.
Klafke observa que mais de 50% do varejo em gastronomia possui débitos em atraso, envolvendo tributação e parcelas de financiamentos. “Este tipo de prática prejudica os que estão em recuperação, e os bons pagam pelos ruins.” O especialista ressalta que “muito provavelmente” os casos envolvendo a denúncia são “isolados”, e frisa que tanto os empresários do ramo como os consumidores têm ferramentas para evitar cair em fraudes.
De acordo com o especialista, o Sebrae trabalha em parceria com o Sindicato da Hotelaria e Gastronomia de Caxias do Sul, justamente oferecendo cursos de boas práticas na fabricação, com normas e exigências legais, entre uma série de cuidados que os gestores precisam observar ao lidar com alimentos. “Inclusive há normas para lidar com fornecedores, para garantir a entrega dos alimentos para o cliente de maneira segura, e muitas empresas da Serra gaúcha têm participado destes cursos, que têm instrutores qualificados”, pondera. A entidade também oferece consultoria que ajuda na normatização destes processos.
“Sempre foi um desafio fazer o controle de perecíveis e com a inflação, que está elevando o preço dos produtos, este desafio fica ainda maior para reduzir o desperdício”, observa o técnico do Sebrae. Ele adverte que é preciso que os empreendedores que não trabalham com este tipo de orientação devem atentar para alguns tópicos: “Não dá para comprar de qualquer um e é preciso verificar se os produtos são bem manipulados e bem armazenados. Como acompanhamos as empresas dentro dos projetos, temos certeza de que estas estão cumprindo o protocolo".
Atentar para a embalagem, se tem data de validade e procedência – com informações e selo de qualidade – do produto; verificar a forma de acondicionamento da carga quando chega na empresa e solicitar a nota fiscal do fornecedor são processos básicos, emenda o gestor de projetos de gastronomia do Sebrae na Serra Gaúcha, Gustavo Rech. Essas e outras dicas são repassadas para dezenas de empresas de Caxias, que recebem informações de gestão e educação empreendedora, acesso a mercado e assessoria técnica, dentro de programas de alimentos seguros, com consultoria específica para este setor.
“Todo empresário da gastronomia deveria fazer um programa como este”, opina o proprietário do Baitakão, João Antonio Leidens. À frente do negócio, que, entre outras opções, tem uma hamburgueria há 49 anos, ele afirma que passou por treinamentos com o Sebrae/RS na época em que era microemprededor. “Começamos com um trailer de lanche e alguns anos mais tarde passamos por uma consultoria, que nos ajudou a implementar boas práticas, que não só melhoraram a qualidade dos nossos produtos como alavancaram o negócio”, afirma Leidens. Hoje em dia, o Baitakão também serve a la carte e buffet.
Dentre os cuidados que o restaurante mantém ativos desde 2005, a cozinha e o refeitório estão adaptados, incluindo prateleiras, câmeras frias, mesas tudo em inox, com iluminação adequada para proteger os alimentos.
“Investimos na assessoria do Sebrae e depois no custo de implementação: hoje temos uma sala só para manipulação de carne, outra só para higienização de verdura, outra só para massas e doces. Também instalamos um programa onde o alimento circula corretamente pela cozinha para não cruzar o que é sujo com o que é limpo”, exemplifica.
Leidens afirma que as boas práticas passam também pela compra dos produtos. “É fundamental ter certeza da procedência da carne: de onde vem o boi, como é manipulada até chegar no varejo. Nós, além de mantermos o mesmo fornecedor há anos, também vamos até o local verificar os processos.”
Em Pelotas, o programa chamado Juntos para Competir, implementado em parceria das regionais do Senar e Sebrae com a Farsul, visa organizar e desenvolver as principais cadeias produtivas do Rio Grande do Sul, através da capacitação e de uma maior integração do setor, melhorando a qualidade dos produtos e agregando valor à produção agropecuária. “Atendemos 20 agroindústrias e entre elas, dez são de embutidos e carnes”, calcula a gestora de projetos responsável por coordenar a iniciativa pelo Sebrae/RS, Márcia de Azevedo Rodrigues.
Ela alerta que o varejista deve olhar o selo do produto na hora da compra, buscando o nome do responsável técnico. “Onde há seriedade, sempre tem um médico veterinário que fiscaliza o processo”, garante. “No entanto, sabemos que existem casos de abigeatários. Mas isso significa que quem comprou saiba disso. Por isso, para o empresário não se prejudicar é fundamental saber onde é seguro comprar.”
No caso das empresas inclusas no projeto Juntos para Competir, todas têm o acompanhamento do Sebrae na hora de verificar a procedência dos produtos, garante Márcia. “Garantimos 100% de ajuda e responsabilidade na entrega e estamos inclusive pensando em criar uma selo do projeto para as empresas participantes – é uma forma de dar reconhecimento a quem busca qualidade e também de deixar o consumidor mais tranquilo.”
Márcia também pondera que casos de “oportunistas mancharem um negócio sério, que é produção de alimentos, incluindo carne e leite, não são novidade. Há um tempo atrás aconteceu com a cadeia do leite”, recorda.
Aos empresários, os técnicos do Sebrae aconselham não comprar produtos em lugares sem referência. “Existem formas de saber a procedência da carne e outros produtos perecíveis, pois há fiscalização municipal, estadual e federal de alimentos feitas pelo Sistema de Inspeção Municipal, pelo Sistema Unificado Estadual de Sanidade Agroindustrial Familiar, Artesanal e de Pequeno Porte e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.”
Já no caso dos consumidores, uma forma de garantir segurança na compra é buscar empresas conhecidas e consolidadas, “com preço justo”. “É possível perceber o estabelecimento, buscar empresas de referência, que cumpram os protocolos de segurança”, reforça Klafke. “Normalmente, as empresas abrem suas cozinhas para visitação, e o consumidor pode assim observar os processos de produção destes locais, além de olhar de perto o ambiente do restaurante, inclusive se dispõe de álcool gel e cumpre os protocolos sanitários.” No caso de produtos que chegam pelo delivery, uma boa forma de verificar a qualidade é atentar para o condicionamento e embalagem, além do visual e odor dos alimentos.
“Acredito inclusive que com o advento dos aplicativos de entrega de comida, a competição tenha acirrado, e o pessoal busca por promoções. É uma equação difícil para empresas que fazem um trabalho sério”, avalia. Ele destaca que, na dúvida, “suspeitar de algumas iniciativas” pode ser um caminho para se proteger. “Em geral, é difícil chegar em um preço muito baixo do mercado”, sinaliza.