Cristiano Vieira
Em 25 de fevereiro de 1996, morria Caio Fernando Abreu, um dos mais admirados e geniais escritores gaúchos. Sua obra ainda ecoa forte nos dias de hoje. O Jornal do Comércio convidou amigos para relembrar um pouco da personalidade e da trajetória da figura esguia de olhos penetrantes que tantos trabalhos marcantes deixou na cultura brasileira.
Luciano Alabarse, diretor e coordenador do Porto Alegre Em Cena:
FOTO JONATHAN HECKLER/JC
"20 dias, 20 anos, 200... A ausência de Caio me ensinou uma coisa: amor não tem prazo, a memória guarda no presente do indicativo aqueles seres amados que partiram antes. Nesse tempo, o mais notável é a constatação de que sua obra não perdeu fôlego. Pelo contrário. A legião de admiradores, notadamente de gerações que sequer conviveram com ele, aumentou consideravelmente. São leitores ávidos que desfrutam cada palavra, cada frase e livro do Caio. Ele, que tinha paciência total com aqueles que se debruçavam sobre suas palavras, fez por merecer: sua obra é visceral, urgente, busca a felicidade humana sem pudores ou mentiras. Esse é o grande mérito de tudo o que o Caio escreveu. Ninguém pense que era fruto de inspiração o que ele editava: muito trabalho, muito rascunho, muita transpiração envolvia suas palavras, sua vontade de marcar a literatura com uma obra de refinado gosto. Conseguiu, e é uma felicidade ver sua obra circulando pelos quatro cantos do Brasil, recolhendo e ampliando admiradores. O Caio, que partiu, nos deixou um legado vivo, vibrante, importante e cheio de méritos. Caio era e continua sendo o máximo!"
Marcos Breda, ator:
FOTO MARCELO G. RIBEIRO/JC
"Quem não vive tem medo da morte. Caio Fernando Abreu gostava muito deste LP (o bom e velho vinil) de 1988, de Ney Matogrosso, e comentou comigo, certa vez, que concordava com esta afirmação e principalmente com seu reverso: Quem vive não tem medo da morte. Duas décadas depois de sua partida, a obra de Caio F. continua viva e não teme a morte. Mais viva do que nunca. Ler seus livros hoje é uma experiência de extrema atualidade, tal como era na época em que foram escritos. Talvez até mais, porque a distância e o tempo permitem vislumbrar ainda melhor sua grandeza e transcendência. Artistas maiúsculos como Caio Fernando Abreu (e também Ney Matogrosso) conseguem essa proeza através de suas obras porque falam, com propriedade, sensibilidade e extremo talento, daquilo que é atemporal e humano - de todo e qualquer humano - desde sempre e para sempre. Longa vida a Caio Fernando Abreu."
Cida Moreira, compositora, cantora e atriz:
FOTO ANA PAULA APRATO/ARQUIVO/JC
"Caio, você foi nossa voz, foi a lucidez contemporânea que elucidou para todos nossa geração, espremida entre tantos brasis, tão louca e transgressora, tão necessitada de significado dentro da poesia. Suas palavras continuam cortando nossos pulsos, num sangramento constante. Sobrevivemos a você, resistimos ao tempo, mas sua palavra sobreviverá a tudo, lançará holofotes poderosos para os que ainda querem ser, para quem não desistiu e nem desistirá, pois você está conosco e com as gerações que virão. Sua palavra é perfeitamente alinhada com sua vida e com sua morte. Naquele 25 de fevereiro, pensei que havíamos morrido um pouco com você, mas não: renascemos para continuar, em nome de uma fé inabalável, na vida que escolhemos ter. Caio F... Continuo amando você como no primeiro dia que te vi. Para sempre, sua C. M."
Grace Gianoukas, atriz, diretora e produtora:
FOTO GABRIELA DI BELLA/ARQUIVO/JC
"Quando o Caio me conheceu, em Porto Alegre, ficamos amigos e, algum tempo depois, dividíamos uma casinha em São Paulo. Ele me adotou como aprendiz e me acolheu numa São Paulo dos anos 1980, num Brasil da abertura, cheio de possibilidades. Teve uma forte influência na minha formação. Fez isso por mim e por muitos artistas. Ele ofertava bússolas que apontam para coragem. Era uma pessoa de personalidade forte, sensual, inteligente, ferino, engraçadíssimo, tranquilo, às vezes intransigente, de um romantismo sem piedade, com uma capacidade inacreditável de traduzir suas observações em palavras exatas. A presença do Caio está impregnada na minha consciência - é energia em expansão. Duas por três, passo por ruas onde não existem mais os cinemas, os teatros, os bares que frequentávamos e gargalhávamos, a lanchonete onde ele, generoso, dividia comigo um X filet de frango/creme de milho nos tempos de dureza. E isso era um extraordinário jantar. Nesses 20 anos de sua ausência física, a cidade de São Paulo mudou um pouco, está mais desumana, as pessoas estão mais histéricas, mais caretas, mais fúteis, os publicitários tomaram o poder, as pequenas livrarias se transformaram em megastores. Mas sempre há um fio de luz, as minorias estão organizadas, a sociedade está de pé e tem também gente aprendendo a 'plantar e saborear morangos' e, talvez, os strawberry fields voltem a florescer e frutificar como os girassóis e as roseiras abençoadas pela energia de Caio Fernando Abreu".
Canções e momentos reunidos no palco do santander cultural
Na quarta-feira, o Santander Cultural recebe o espetáculo Canções e momentos de Caio F., dirigido e comentado ao vivo por Luciano Alabarse, com Simone Hasslan (teclado e voz), Muni (voz) e Pingo Alabarse (textos). A ideia é mostrar ao público a pequena produção de Caio como letrista (músicas de Ricardo Severo e Kledir), canções que outros compuseram para ele (Adriana Calcanhotto) e músicas que marcaram os mais de 30 anos de amizade entre Caio e Luciano Alabarse (de Sueli Costa e Dolores Duran, por exemplo). A atividade ocorre no grande hall, às 19h, com ingressos a R$ 12,00.
Mais conteúdo no dia 25
No dia 25 de fevereiro, o hotsite especial 20 anos sem Caio Fernando Abreu irá reunir vídeos de amigos, de pessoas que conviveram com o escritor e de fãs. Uma galeria de fotos exclusivas e inéditas vai mostrar Caio Fernando Abreu em cenas de família. Os leitores poderão relembrar ainda a sua obra.