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Governo Federal

- Publicada em 15 de Janeiro de 2019 às 21:23

Decreto de Bolsonaro facilita posse de armas

Presidente se referiu à caneta como 'arma' para garantir direito à defesa

Presidente se referiu à caneta como 'arma' para garantir direito à defesa


EVARISTO SA / AFP/JC
Com críticas a governos anteriores, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou, na manhã de ontem, o decreto que facilita a posse de armas no Brasil. A medida foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União na tarde desta terça-feira, com efeito imediato.
Com críticas a governos anteriores, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou, na manhã de ontem, o decreto que facilita a posse de armas no Brasil. A medida foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União na tarde desta terça-feira, com efeito imediato.
Sem mencionar diretamente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro disse que governos anteriores negaram o direito à população da posse de armas. "O governo à época buscou negar o direito. O povo decidiu por comprar armas e munições, e não podemos negar o direito", disse. Ele se referia ao referendo do desarmamento, feito durante o primeiro governo Lula (PT), em 2005. À época, 63% da população votou a favor do comércio de armas. Bolsonaro, então deputado, era coordenador regional da Frente Parlamentar pelo Direito da Legítima Defesa.
"Para lhes garantir esse legítimo direito à defesa, eu, como presidente, usarei essa arma (em referência à caneta)", disse no momento da assinatura.
O presidente esclareceu que o decreto assinado ontem trata apenas da posse de armas e afirmou que outras medidas podem ser feitas pelo Legislativo. "Esse nosso decreto trata especificamente da posse da arma de fogo. Outras coisas dependeriam de mudanças na lei, o que os deputados federais vão tratar."
A assinatura foi feita em um evento no Palácio do Planalto que contou com a presença de ministros e de integrantes da bancada da bala no Congresso Nacional.
O texto estende o prazo de validade do registro de armas de cinco para 10 anos e retira a obrigatoriedade de que um delegado da Polícia Federal (PF) autorize a posse (veja o quadro a seguir). Essa alteração foi feita para atender a uma das principais críticas feitas pelos defensores de uma maior flexibilidade. Eles alegavam que, anteriormente, a PF concedia ou não a posse com base em uma avaliação subjetiva.
Há, ainda, uma limitação de compra de quatro armas por pessoa, com exceção daqueles que comprovarem a necessidade de possuírem uma quantidade maior, alegando, por exemplo, número de propriedades.
O decreto vai atingir moradores de cidades violentas, de áreas rurais, servidores públicos que exercem funções com poder de polícia e proprietários de estabelecimentos comerciais. Também serão beneficiadas pessoas que, atualmente, estão em situação de irregularidade, como prazo expirado para o registro.
Há, ainda, a exigência de que pessoas que tenham crianças, adolescentes ou pessoas com deficiência mental em casa apresentem uma declaração de que a residência possui cofre ou local seguro com tranca para armazenamento. A facilitação da posse de armas é uma promessa de campanha de Bolsonaro. Poucos dias antes de assumir a presidência, ele usou as redes sociais para informar que usaria um decreto para modificar as regras.

MP para recadastramento será editada até final do mês

Uma Medida Provisória (MP) que determinará o recadastramento de armas que estão em situação irregular será editada até o final do mês, de acordo com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM). O período de recadastramento irá, inicialmente, até dezembro de 2019, podendo ser renovado por mais um ano. O recadastramento não está determinado no decreto assinado ontem, que facilita que cada cidadão tenha a posse de até quatro armas de fogo.

No Congresso, 187 projetos de lei tentam mudar estatuto

O Estatuto do Desarmamento, lei federal vigente desde dezembro de 2003, está prestes a ver a ofensiva mais intensa visando a sua alteração, ou até mesmo revogação. Além do decreto para facilitar a posse de armas, o governo Jair Bolsonaro (PSL) quer negociar com o Congresso mudanças mais profundas.
No parlamento, encontrará ambiente fértil: de 2003 ao ano passado, 362 propostas de lei foram apresentadas com intenção de alterar o estatuto; 187 seguem em tramitação.
Os dados são de levantamento do Instituto Sou da Paz. O foco tem sido atacar restrições à concessão do porte de arma de fogo - a autorização para se andar armado na rua - e facilitar a permissão para diferentes categorias profissionais. Tratam ainda da criação de um porte rural de arma de fogo, o aumento de penas para quem for flagrado cometendo crimes com armas e a revogação de competência da Polícia Federal, devolvendo as atribuições às polícias estaduais.
"Há uma miríade de projetos que tentam enfraquecer a política de controle de armas. Poucos são bons", diz o coordenador de relações institucionais do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli.

Deputados da bancada da bala se dividem sobre novas regras

A possibilidade de uma pessoa adquirir quatro armas de fogo para ter em casa rendeu críticas de parte de integrantes da chamada "bancada da bala", como é conhecido o grupo de parlamentares cuja origem são forças policiais, Forças Armadas ou da área de segurança pública.
Segundo decreto divulgado ontem pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL), cada brasileiro poderá ter direito a quatro armas ou mais. Para alguns dos deputados a medida é um "exagero".
"Quatro pistolas em casa é muito, não tem necessidade", disse o deputado Capitão Augusto (PR-SP), que fez carreira na Polícia Militar. "No caso de defesa pessoal, ter no máximo duas já está de bom tamanho. Se estivesse especificado que poderiam ser quatro armas, sendo uma de cano longo, duas armas de porte menor e uma quarta um pouco maior... Agora se não especificar, a pessoa tem direito a quatro pistolas, é exagerado", disse.
Também com origem na Polícia Militar, o deputado Capitão Wagner (PR-CE) disse que essa medida pode permitir que pessoas tenham um "arsenal" dentro da própria residência, o que ele enxerga com certa preocupação. "Eu acho muita arma. Você pode ter um arsenal em casa. O próprio profissional da segurança tem uma limitação", argumentou.
A questão deve gerar divergências dentro da própria bancada. "Eu não acho que é exagerado. O criminoso quando entra numa residência, ele não entra com uma arma só. Eles podem entrar com cinco ou seis armas", defendeu o deputado Capitão Derrite (PP-SP), que também fez carreira na Polícia Militar de São Paulo.
Outra questão divergente é a exigência que pessoas com crianças, adolescentes ou deficientes mentais em casa tenham que armazenar a arma em cofre ou local seguro com tranca. "A pessoa que tem o direito de ter o posse de arma é o principal interessado em armazenar em um local seguro", criticou Capitão Augusto. Contudo, a medida foi elogiada pelo Capitão Derrite. O Policial Militar diz ter um cofre em casa justamente para armazenar sua arma. 

Perguntas e respostas

Entenda o que muda a partir do decreto do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que flexibiliza a posse de armas de fogo e passa a valer desde já.
Qual é a principal mudança trazida pelo decreto?
O Estatuto do Desarmamento estabelece que é preciso comprovar a efetiva necessidade da arma para que a posse seja autorizada. Antes, cabia à Polícia Federal (PF) avaliar se o requerente do registro realmente tinha necessidade de ter uma arma. Agora, o governo federal estabeleceu que é considerado que há necessidade efetiva em uma lista de situações, como, por exemplo: 1) para residentes de áreas urbanas de estados com índice de homicídios maior de 10 por 100 mil habitantes no Atlas da Violência de 2018 (que traz dados de 2016); e 2) para residentes de áreas rurais.
Portanto, na prática, o decreto considera que todas as pessoas do País necessitam de uma arma. Isso significa que qualquer um pode ter uma arma?
Não. Ainda é preciso cumprir os requisitos estabelecidos no Estatuto do Desarmamento: ser maior de 25 anos, ter ocupação lícita e residência certa, não ter sido condenado nem responder a inquérito ou processo criminal e comprovar a capacidade técnica e psicológica para o uso do equipamento.
Há alguma mudança em relação ao porte de armas?
Não. O decreto dispõe apenas sobre a posse. O porte - ou seja, a autorização para transportar e carregar a arma consigo, fora de casa ou do local de trabalho - continua proibido. As exceções são membros das Forças Armadas, polícias, guardas, agentes penitenciários, empresas de segurança privada, entre outros. Para obtê-lo, é preciso demonstrar a necessidade do porte por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física.
O tempo de revisão da autorização da posse mudou?
Sim. Antes, era preciso renovar a posse a cada cinco anos. Agora, será necessário fazer isso a cada 10 anos. Isso também vale para quem já tinha arma regularizada antes do decreto. A renovação será feita junto ao Comando do Exército, e não mais com a PF.
Há um limite de quantas armas por pessoa?
O decreto estabelece que é possível ter até quatro armas. Contudo, a pessoa pode requerer o registro de mais armas, desde que comprove que tem necessidade. No discurso logo após a assinatura, Bolsonaro se referiu brevemente a pessoas com diversas propriedades como uma das possíveis circunstâncias. Titulares ou responsáveis legais de estabelecimentos comerciais ou industriais são considerados, pelo novo decreto, como pessoas que teriam necessidade de armas, se desejarem.
Há alguma medida de segurança que deve ser adotada por quem quer ter uma arma?
É preciso apresentar declaração de que a residência possui cofre ou local seguro com tranca, mas isso só é necessário para quem mora com crianças, adolescentes ou pessoa com deficiência mental. Mas o texto fala em "declaração", não em "prova", e não há nenhuma menção à fiscalização das residências para verificar se isso está sendo cumprido.
O novo decreto diz que "presume-se a veracidade dos fatos e das circunstâncias afirmadas na declaração de efetiva necessidade", a qual será examinada pela PF. O que isso significa na prática? A PF continua tendo a palavra final?
Sim, a Polícia Federal tem a palavra final. O que mudou é que, antes, a pessoa que requeria arma apresentava os argumentos que comprovavam que teria efetiva necessidade para tal. Pelo texto de agora, são elencados os requisitos que precisam ser atendidos. O delegado ainda pode negar, mas nega com base em pontos detalhados.
Em que circunstâncias a autorização para posse pode ser negada ou revogada?
Se a pessoa mentir na declaração de efetiva necessidade, mantiver vínculo com organização criminosa ou se agir como uma espécie de "laranja" - a pessoa solicita o registro, mas, na verdade, a arma será usada por quem não se enquadra nos requisitos necessários para a obtenção da licença.
O que acontece com quem é pego com arma de fogo sem registro?
O decreto assinado ontem não altera esse item, regulado pelo Estatuto do Desarmamento. A pena para quem possui ou porta uma arma ou munição sem a devida licença é de dois a quatro de prisão, mais multa. Se a arma for de uso restrito (caso do fuzil, por exemplo), a pena é de três a seis anos, mais multa. Também é proibido emprestar, alterar numeração ou sinal de identificação da arma.
E para quem atira?
A pena por atirar, disparar arma de fogo ou acionar munição em "lugar habitado ou adjacências" é crime inafiançável e rende de dois a quatro anos de cadeia e pagamento de multa. Isso também vale para quem tem o registro da posse, ou seja, não é porque a arma é legal que pode ser disparada em qualquer lugar. As exceções são em casos de legítima defesa, estado de necessidade e em "estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito", previstos no Código Penal como fatores de exclusão de ilicitude.
O comércio de armas é permitido?
Sim. No Estatuto do Desarmamento, estava prevista a realização de um referendo, em 2005, para que a população respondesse à seguinte pergunta: "O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?". Com 63,94% dos votos válidos, o "não" ganhou. Com isso, o comércio permaneceu legal no País.