Governador do Estado entre 1983 e 1986, Jair Soares foi o último integrante do PP a chegar ao Palácio Piratini. Desde a rápida ascensão e a posterior eleição da senadora Ana Amélia Lemos (PP) em 2010, o partido voltou a sonhar com a conquista do posto mais alto do Executivo estadual.
Ele avalia que a senadora está fazendo um mandato de destaque, que a credencia a sonhar com o governo do Estado. Outro ponto forte da possível candidata seria a capacidade de mobilizar novas lideranças, como tem feito em diversos municípios em que o partido está organizado no Estado.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o ex-governador ainda avalia que a viabilidade eleitoral de Ana Amélia é tão grande que, ao invés de precisar se vincular a um palanque nacional, a candidata é que está sendo requisitada pelos presidenciáveis Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB).
Jair Soares, mesmo evitando fazer análises dos governadores que o sucederam, avalia que o governador Tarso Genro (PT) ainda não provou que sua gestão foi privilegiada pela relação com a presidente Dilma Rousseff (PT), como o petista prometeu durante a campanha. Para o progressista, nem a aprovação da renegociação da dívida será capaz de mostrar os benefícios do alinhamento entre os governos estadual e federal. O ex-governador faz também uma análise da situação de penúria das finanças que irá enfrentar o vencedor das eleições de outubro.
Jornal do Comércio – Há uma mobilização muito forte das bases do PP pela candidatura da senadora Ana Amélia Lemos ao Palácio Piratini. Ela é unanimidade no partido?
Jair Soares - A senadora Ana Amélia desempenha um papel representando o Rio Grande do Sul, no Senado, de uma forma extraordinária. É uma das melhores senadoras que já tivemos. E, para alegria nossa, ela é um dos nomes consensuais dentro do partido que pode vir a disputar a eleição neste ano, face ao grande trabalho que ela fez de arregimentação partidária, colhendo novos eleitores para integrarem o nosso partido. Ela tem se destacado pela alta popularidade.
JC – Mesmo que o PP integre nacionalmente o governo Dilma Rousseff (PT), no Estado parece só vislumbrar apoio a Aécio Neves ou a Eduardo Campos. Qual dos dois, na sua avaliação, poder trazer mais votos para a candidatura ao governo estadual?
Jair Soares – Olha, vamos partir do pressuposto de que nossa candidata seja a senadora. Até agora não há uma definição clara em matéria de pesquisa se levarmos em conta esse aspecto. Ela se situa muito bem e acho que quem precisa do apoio dela no Estado são os candidatos à presidência da República. Não é essa visão que trago de dentro do partido, é a visão de um político que olha o quadro, vê a fotografia do momento.
JC – Qualquer um teria seu palanque favorecido com ela?
Jair Soares – Ela desfruta de uma posição que é altamente vantajosa. Ela tem hoje uma situação muito cômoda, porque politicamente e partidariamente é unanimidade o nome dela. E, perante a opinião pública, devido ao desempenho dela, pelas entrevistas dela, pelos posicionamentos que ela tem tido, pelas andanças pelo interior do Rio Grande do Sul, sentimos que ela está muito bem politicamente. Ela vai ser a novidade, como foi para o Senado. E também com relação às mulheres, que sempre se falou em valorizar as mulheres, mas na verdade nunca valorizaram. A mulher ainda luta para ter seu espaço. Já tivemos experiência com uma mulher, que foi a governadora Yeda (Crusius, PSDB), que, no meu ponto de vista, foi muito bem de gestão. Também nós temos aquela coisa na cabeça de alternância no poder, acho que está no nosso DNA, nós gostamos de mudar para ver se melhora, então, eu ficaria por aí...
JC – Mas de qualquer forma, quem pode trazer mais votos para a candidatura do PP, Aécio ou Campos?
Jair Soares – Achei o discurso de Campos um pouco diferente no sentido político, uma palavra nova, mas não tenho com ele a amizade que tenho com o Aécio. E conheço também a obra do Aécio em Minas Gerais. Claro que não concordo com tudo que ele fez lá, sou muito favorável ao servidor público. Nesse aspecto o partido está meio dividido. Assim... 50% está com Aécio e 50% está com Campos.
JC – E na sua avaliação, a posição que ela deve ter em relação a esse governo, deve ser de oposição ou tentar dialogar como uma terceira via, que não necessariamente parte para um enfrentamento com o governo. Como é que o senhor acha que ela deve se posicionar?
Jair Soares - A senadora Ana Amélia tem um estilo próprio e ela vai usar este estilo, ou seja, ela vai traçar um programa para o Rio Grande do Sul e vai procurar fazer com que o eleitor conheça esse programa. Para poder disputar, ela não vai se preocupar em analisar um governo que ainda não terminou, porque não podemos perder de vista. Um governo só pode ser avaliado depois que ele termina, quando se esgota, aí pode dizer “não fez isso, mas fez aquilo” “fez aquilo, mas não fez isso tudo”, se o governador atual for concorrer à reeleição, na minha opinião, se eu fosse candidato, eu ia me esquecer do governo dele pra poder mostrar o que eu quero fazer no governo com a minha equipe de trabalho, porque está inacabado e pode ser que uma coisa que vai se criticar esteja em andamento. Quem conhece hoje a situação é o que está no exercício do cargo. Não tem ninguém que conheça mais o retrato do Rio Grande do Sul sob o ponto de vista econômico e social do que o governador. E se ele não tiver esse conhecimento, enfim... Não é bom que ele não tenha conhecimento. Em uma eleição, temos que ir para um debate para vender aquilo que a gente quer fazer, porque não adianta você criticar. Você tem que ter uma proposta de trabalho. Eleição é o momento. Então, acho que, se nossa senadora for a nossa candidata e ela trouxer um programa de governo que seja bem feito, que seja possível fazer, vai ter algo para vender. Ela precisa ter uma boa proposta, de coisas que sejam factíveis.
JC – Sobre o governo Tarso, o senhor faz alguma avaliação?
Jair Soares – Não. Não avalio governo que não terminou.
JC – E como avalia seu empenho pela renegociação da dívida?
Jair Soares – Estou do lado dele. Sobre a dívida do Estado, quando depus na Assembleia, em um seminário, levei meu relatório, com os dados consolidados dos meus quatro anos de governo. Mostrei que o Estado perdeu naquela época o parâmetro, não há referência, porque tivemos mudança de moeda. Perdemos 15 zeros, em último plano, dividiu nosso patrimônio por 2.750. Então, essa dívida do Rio Grande do Sul está paga há muitos anos.
JC – Se a dívida é renegociada, pode favorecer a campanha do governador?
Jair Soares – Eu não acho. Veja bem, (Antônio) Britto (PMDB) trouxe uma negociação com o Proes, entrou R$ 5 bilhões, e não se reelegeu. Eleição é uma coisa difícil de prognosticar, se vai beneficiar ou não, porque todo mundo esperava que o tratamento do governo federal com relação ao governo estadual, por serem do mesmo partido, teria tudo resolvido. E, se for resolvido, era o esperado. Se não for, é que não é esperado. É normal isso para ele, não vai somar nada. Não quero tirar méritos dele. Não analisei depois de mim nenhum governo. Não gosto, porque depois dizem: “Então, por que você não fez?”.
JC – Mas a sua análise, então, é de que progresso na questão da dívida não traria ganhos para Tarso?
Jair Soares – Essa é uma proposta que ele disse na campanha, de que a facilidade com o entrosamento com o governo federal seria uma realidade, o que, lamentavelmente, não é para nós rio-grandenses. Gostaria que fosse realidade, o Estado estaria em melhores condições, não teríamos esse problema dos precatórios, com esse absurdo que está havendo agora, até falcatruas dentro do precatório, não estaríamos com o aumento da nossa dívida. Porque o Estado tem coisas que ele não pode deixar de fazer. São compulsórias, são fundamentais e se não tem recursos dentro da arrecadação, que está comprometida, eu disse em 6 de dezembro de 2006, em um dos jornais de Porto Alegre, em uma entrevista, que eu teria pena do próximo governante, teria pena. Fiz um discurso na Assembleia mostrando que o governo estava engessado, porque tinha que gastar até 60% com pessoal, nós estamos nesse limite. Tem que gastar 35% com educação, obrigatoriamente, já são 95%, estão faltando 5%, mas tem que gastar 12% na saúde, tem que pagar a dívida... Veja, se 60% é com pessoal, 35% com educação, sobra 5%, como é que vai tirar 12% pra saúde? Não tem, o cobertor é curto. O Estado tem que ser um Estado necessário, tem que cumprir aquilo que é primordial, constitucional, que é o direito de ir e vir, o direito à saúde, dever, obrigação do Estado, e o direito à Justiça. Em outras áreas, o Estado pode ser parceiro, o Estado pode traçar políticas, normas, mas não pode botar dinheiro. Primeiro, que não tem.
JC – Na eleição para a prefeitura de Porto Alegre em 2012, quando a senadora Ana Amélia defendia apoio a Manuela d’Ávila, do PCdoB, houve forte resistência em função da história dos dois partidos, um sucedâneo da Arena e o outro comunista. Essa crítica pode ser trazida à tona no caso de uma aliança com o PSB?
Jair Soares – Olha, desde o movimento de 64, que cometeu o maior erro que foi a extinção dos partidos. Além da extinção, outro grande erro é o segundo turno. Porque no primeiro turno, você defende o programa partidário, cada um vai defender o programa partidário e depois se coliga com um programa que não casa com o programa dele, porque nós defendemos o direto de propriedade, a livre iniciativa etc, se o outro partido não defende isso, como é que vamos coligar? Eu concorri sozinho, mas naquele tempo não tinha... E não quis fazer acordo com outros partidos, porque o eleitor é sábio. Se ele me deu 25 deputados, mas não me deu maioria, eu como ia mandar projetos que no meu entendimento só seriam para o bem do Rio Grande, mandei e cumpri com minha obrigação. A extinção dos partidos, o segundo turno e depois a coalizão, que ultimamente os governos têm feito, com todos os partidos, que o país que quer viver um Estado Democrático...
JC – O PP chegou a ser convidado por Tarso Genro para integrar o Executivo.
Jair Soares – Sim, mas veja bem, um Estado Democrático de Direito, tem que ter situação e oposição. A oposição é uma necessidade. A oposição não precisa ter inimigos do outro lado, a oposição é um dever até constitucional da própria legislação, que obriga que o deputado, juntamente com os órgãos, como o Tribunal de Contas, façam a fiscalização externa do governo. Tanto é que um deputado estadual ou federal não precisa de licença para entrar em qualquer repartição pública para fazer fiscalização, porque é este o papel dele. A partir do momento em que não há oposição, quem nos salva é a imprensa, que faz as denúncias. Hoje a oposição é caudatária das denúncias feitas pela imprensa, esse que tem sido o quadro. Então essa questão de partidos e coligações se tornou uma coisa que deixa o eleitoral confuso: “Mas como é que pode um partido que defende essas posições se unir com outro antagônico?”. Não é algo que se possa compreender.
Perfil
Jair de Oliveira Soares, 80 anos, é natural de Porto Alegre. Ingressou no antigo PSD quando fazia política estudantil. Graduado em Odontologia e Direito, também atuou como corretor de imóveis. Entretanto, foi no serviço público que fez carreira. Era funcionário concursado do Estado quando foi chamado para trabalhar na Secretaria de Obras Públicas durante o primeiro governo (1955-1959) de Ildo Meneghetti. Ainda integrou o Instituto Riograndense do Arroz (Irga) e atuou em diversos cargos na Assembleia Legislativa. Com o bipartidarismo após o golpe militar, filiou-se à Arena. Foi presidente da Comissão Estadual de Compras, secretário estadual da Administração e secretário da Saúde. Em 1978, concorreu pela primeira vez a um cargo eletivo. Elegeu-se deputado federal. No Congresso, foi chamado pelo presidente João Figueiredo para ser ministro da Previdência, cargo que ocupou de 1979 a 1982. Neste ano, já no PDS, venceu a primeira eleição direta na redemocratização para o governo do Estado, batendo Pedro Simon (PMDB), Alceu Collares (PDT) e Olívio Dutra (PT). Depois, foi vereador em Porto Alegre, deputado federal e deputado estadual. Não conseguiu a reeleição em 2006, pelo PP. Atualmente, é presidente - no segundo mandato - da Fundação Walter Peracchi de Barcellos, que é ligada à Brigada Militar - é o primeiro civil que coordena a instituição.