Luiz Carlos Bohn
Enquanto o Rio Grande do Sul enfrenta perdas bilionárias e luta para reconstruir pontes, estradas e empresas arrasadas pelas enchentes, uma curiosa bonança se esgueira nos corredores do poder.
Apenas para citar um exemplo: depois de a Assembleia Legislativa, em 26 de fevereiro de 2019, aprovar emenda constitucional que extinguiu a licença-prêmio para todos os servidores públicos gaúchos, alguns órgãos que decidiram, longe dos holofotes da democracia, ressuscitar o privilégio. Por meio de portarias, recriaram três meses de folga a cada cinco anos, ou indenizações em dinheiro, sem se submeter ao crivo dos 55 deputados, nem dos onze milhões de gaúchos que pagam a conta.
Quem manda no dinheiro dos gaúchos? O eleitor representado no Parlamento ou corporações blindadas por regulamentos caseiros? Do lado de cá, o pequeno comerciante fecha o caixa no vermelho, parcela imposto em sessenta vezes e ainda paga juros de pós-guerra para reabrir a porta da frente. Do lado de lá, brotam férias de luxo, retroativos milionários e a certeza de que o erário é um buffet self-service onde se repete o prato sem olhar a fila.
É aceitável que, em um Estado com tantos desafios no passado recente e no futuro próximo, se crie - por canetada - um privilégio rechaçado pelo povo gaúcho e pelo Parlamento? É democrático ignorar a própria Constituição Estadual para premiar quem deveria fiscalizar despesas, não multiplicá-las?
A Fecomércio-RS, guardiã de mais de 600 mil estabelecimentos de comércio, serviços e turismo, reafirma seu compromisso com os princípios do Estado democrático de direito, assim, entendemos que qualquer benefício a ser custeado pelo dinheiro do pagador de impostos deve ser debatido abertamente na Assembleia Legislativa, diante da sociedade.
Empreender já é ato de coragem; sustentar privilégios alheios jamais deve fazer parte do negócio.
Presidente do Sistema Fecomércio-RS/Sesc/Senac e IFEP