André Malta Martins
Entre os princípios informadores da República Federativa do Brasil no que diz respeito às relações internacionais consta a observância da autodeterminação dos povos e da não-intervenção, conforme dispõe o art. 4º, inc. III e IV, da Constituição Federal.
Por conta dessas diretrizes uma parcela da opinião pública defende que o governo brasileiro deveria logo reconhecer a vitória de Nicolás Maduro sobre Edmundo González, candidato da oposição, por cerca de 700 mil votos, de acordo com dados preliminares veiculados pelo Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, espécie de Tribunal Superior Eleitoral daquele país.
Embora não se possa afirmar categoricamente que tenha havido fraude, ainda é cedo para que o presidente Lula reconheça o terceiro mandato de Nicolás Maduro, que já vem liderando a Venezuela desde a morte de Hugo Chávez em 2013.
De fato, em razão dos variados e graves indícios que depõem contra a lisura das eleições, como a falta de divulgação dos boletins de votação, a ausência de observadores internacionais, a pane repentina no site do Conselho Nacional Eleitoral e o impedimento de residentes em outros países de votarem (migrantes), é recomendável que o Brasil assuma uma posição de cautela e que consiga encontrar um ponto de equilíbrio entre o respeito à soberania do país vizinho, sem abandonar o compromisso com a “cooperação entre os povos” e com a “formação de uma comunidade latino-americana de nações” (art. 4º, inc. IX e parágrafo único da CF/88), integração que só é possível com o cumprimento do pluralismo político e do sufrágio universal, pois o que passa a estar em jogo agora não é apenas a credibilidade do processo eleitoral venezuelano, mas a credibilidade do próprio governo brasileiro, na medida em que o eleitorado terá razões de sobra para não aprovar eventual chancela do Itamaraty diante do recrudescimento da desconfiança e até mesmo da pressão internacional por uma recontagem de votos.
Advogado