Ricardo Lins Portella Nunes
A indústria é o principal consumidor firme de gás natural no Brasil e, para uma parcela expressiva das empresas que produzem em solo gaúcho, a tarifa justa e competitiva desse insumo é condição determinante para a sustentabilidade operacional das fábricas.
Se olharmos em específico para os setores energointensivos - reunidos em importantes polos produtivos do Rio Grande do Sul, como: químicos, automotivo, ferro e aço, papel e celulose, metalmecânico, entre outros, temos um universo de indústrias representativas, as quais são diretamente afetadas pelas variações de tarifa deste energético, impondo verdadeira ameaça às suas operações, impactando, inclusive, na competitividade da cadeia, pois sabe-se que uma boa parte dos produtos finais produzidos por esses segmentos constituem insumos para diversos outros setores industriais.
Dentro do seu direito legítimo de defesa de interesse da indústria, e visando o desenvolvimento econômico do Estado, a Fiergs contestou a proposta da Sulgás apresentada à Agergs, na qual era postulado pela concessionária aumentar em 73,58% a tarifa da distribuição de gás natural para o período 23/24 (em 2022, a tarifa já havia aumentado 32,91%). Nas contribuições, a Fiergs demonstrou que a memória de cálculo apresentada pela concessionária continha erros de fórmulas que produziram números superestimados, além de custos não permitidos pelo contrato, que culminariam num resultado de lucro líquido de quase R$ 280 milhões, apenas em 2023.
Referido aumento seria tão desproporcional que, só no exercício de 2023, a Sulgás recuperaria 89% de todos os seus ativos, quando o contrato de concessão lhe garante, no máximo, uma remuneração equivalente a 20% a.a. sobre investimentos e mais 20% sobre seus custos - remuneração esta que é muito superior ao que pratica o atual mercado em livre concorrência.
Acertadamente, a Agergs acolheu as contribuições feitas pela Fiergs e aprovou uma revisão tarifária dentro dos parâmetros do contrato que regula esta concessão. Se não fossem feitas as correções na memória de cálculo, o monopólio acumularia lucro líquido após IRPJ/CSLL de quase R$ 280 milhões somente em 2023. O estudo da Fiergs conclui que o Poder Público não poderia permitir que o lucro líquido após IRPF/CSLL fosse superior a R$ 80 milhões, valor este que representa cerca de 25% dos seus investimentos, e que está em linha com o que o contrato assegura.
Por todo o impacto direto que as variações tarifárias deste insumo provocam na competitividade das indústrias, a proposta de revisão tarifária em tela reforça questionamentos quanto à lógica remuneratória do atual contrato de concessão da Sulgás. É desejável, portanto, que, enquanto não sejam aprimoradas as regras do contrato de concessão vigente, a Agergs, como agência independente, siga trabalhando na regulação de uma tarifa justa e equilibrada, traçando um olhar para melhor eficiência com respeito aos custos que são incluídos na base remuneratória da tarifa e que estabeleça um mecanismo adequado de acompanhamento da eficiência econômica e operacional da atividade de distribuição, delimitando os investimentos dentro dos níveis da oferta de gás natural, evitando, assim, onerar a tarifa de distribuição para os consumidores.
Coordenador do Conselho de Infraestrutura da Fiergs (Coinfra)