Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Opinião

artigo

- Publicada em 15 de Janeiro de 2014 às 00:00

E agora você?


Jornal do Comércio
Aposentado, trabalhador, contribuiu toda vida. Seu nome era José. E agora, José? Há cerca de dois anos perdeu sua mulher. Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho. Para afogar a saudade adquiriu um cachorro. Perfeita escolha. O cachorro era literalmente seu melhor amigo. Certo dia seu José sentiu uma dor no pescoço, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode. Resolveu ir ao médico no posto de saúde. A consulta durou pouco mais de um minuto. Exames, remédios, marcação de novas consultas. Passando na farmácia do SUS recebe a notícia de que ali não tem remédios, estão em falta. Quase de noite volta para sua casa, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José?
Aposentado, trabalhador, contribuiu toda vida. Seu nome era José. E agora, José? Há cerca de dois anos perdeu sua mulher. Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho. Para afogar a saudade adquiriu um cachorro. Perfeita escolha. O cachorro era literalmente seu melhor amigo. Certo dia seu José sentiu uma dor no pescoço, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode. Resolveu ir ao médico no posto de saúde. A consulta durou pouco mais de um minuto. Exames, remédios, marcação de novas consultas. Passando na farmácia do SUS recebe a notícia de que ali não tem remédios, estão em falta. Quase de noite volta para sua casa, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José?
No outro dia, conversando com a secretária, seu José é informado de que exame pelo SUS haverá somente daqui a seis meses. “Como assim?”, pensa seu José. “Em seis meses já posso estar morto”. De cabeça baixa volta para casa. Se você gritasse, se você gemesse, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse... Mas você não morre, você é duro, José! E agora, José? Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio - e agora? Quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora? E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, você que é sem nome, que zomba dos outros. Você que faz versos, que ama, protesta? E agora, José? Cinco meses depois a secretária do posto de saúde liga para a casa de seu José. O sobrinho do velhinho é quem atende e avisa que fazia uma semana que seu José e seu cachorrinho haviam morrido. “Ah! Obrigada”, é a resposta da secretária. Em sua frente outro seu José querendo marcar um exame... E agora José? E agora, você? 
Professor e mestrando em Letras pela Universidade de Santa Cruz do Sul/Bolsista Fapergs
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO