Ouvimos e falamos há tantos anos em educação para o trânsito. E sabemos também que quem realmente precisa desta educação não está “nem aí”. O “nem aí” eu chamo de megalomania ou onipotência. Ou seja, é possível “educar” o megalômano ou a onipotência quando uma de suas características principais é a ausência de autocrítica e uma intolerância ou uma vontade permanente de não aprender com a experiência? O onipotente não quer aprender e nem sabe o que é isto: afinal, “ele já sabe tudo”. Eu não tenho dúvidas de que quem se coloca em situação de perigo, e/ou sua família ou o outro, ou ainda não cuida da manutenção mínima do seu carro, dirige sob o efeito de álcool ou outra droga desrespeita as regras de trânsito, ou acha que só os outros são causadores de acidentes e desgraças é um ser que não está “nem aí” para a vida. Pior, ele nem sabe disto. Aliás, por que estariam conectados com a vida (fragilidade e instabilidade) se são criaturas tão “superiores”? Isto vale para a agressividade na escola, para a violência (qualquer que seja), fanatismos. Sempre que alguém se sente ou se acha superior e assim procede, ou seja, vive delirantemente, não nos esqueçamos, a relação com a vida está tênue ou deteriorada. E por isto (acha ele) pode matar e ou/morrer.
Além das melhorias das estradas, fiscalização, educação, campanhas permanentes de conscientização, não podemos jamais esquecer que isto que chamamos de “imprudência” tem uma raiz alicerçada num profundo e cultivado delírio de grandeza ou de uma precariedade emocional no contato com a vida, e aqui eu digo, amar a vida é não a ter como inimiga. Por isto, um tipo de prevenção muito primário, inicial e essencial tem a seguinte questão: é possível cuidarmos de nós mesmos (aceitar que não somos deuses) e de nossos filhos para o desenvolvimento do sentimento de responsabilidade e não o cultivo e aprimoramento do delírio de onipotência?
Psicólogo. Coautor do livro O Sentimento de Culpa e autor do livro Aprendendo a Lidar com os Medos: A arte de cuidar das crianças