A imagem da produção de uvas na Serra Gaúcha traduz-se no mercado pelos vinhos. No entanto, é a qualidade dos sucos integrais produzidos na região que garante a maior fatia das vendas e da produção nas indústrias da região. A liderança nacional de sucos integrais é da Cooperativa Vinícola Aurora, que tem 65% da sua produção e das vendas justamente nos sucos. O produto da cooperativa de Bento Gonçalves representa 30% de todo o suco integral brasileiro. E este setor merece grande atenção nos planos de investimento de R$ 25 milhões da cooperativa neste ano, e de R$ 110 milhões nos últimos quatro anos.
"Há uma tendência mundial pelo consumo de menos álcool. O jovem tem consumido bebidas mais saudáveis, e isso não significa abrir mão dos nossos vinhos, mas nos qualificarmos cada vez mais para atender a essa exigência. Um movimento que iniciamos junto aos nossos produtores de uva desde 2011, quando começamos a mostrar a eles a importância do cuidado e da valorização do cultivo de uvas para sucos, com o plantio de novos vinhedos, mais precoces, de variedades específicas, híbridas de americanas, adequadas para o suco, e tem surtido efeito. Ano a ano temos garantido produtos com menor acidez e mais qualidade, e isso se comprova nos números", aponta o diretor industrial da Aurora, Roberto Lazzarini.
As vendas de sucos representam 46% do faturamento da cooperativa, com alta demanda. Em torno de 20% da produção que, na indústria, graças ao investimento, inclusive ampliado neste ano, em tanques inoxidáveis para o melhor armazenamento, acondicionamento e envase a qualquer época do ano.
Nas unidades do Vale dos Vinhedos da Aurora, três linhas de produção são exclusivas para a elaboração e engarrafamento dos sucos. São dois tipos de produtos na linha de sucos integrais: a linha Casa de Bento, que é engarrafada de um dia para o outro, e a linha Aurora, esta, com maior limpeza do mosto - que tem recebido maiores investimentos da cooperativa -, com a uva estocada em tanques.
De acordo com Lazzarini, os sucos recebem agora um reforço de novos produtos zero álcool, que representam 2% da produção da Vinícola Aurora. Entre os novos produtos, está o suco de uva com gás e carbonatado artificialmente que, inclusive, tem aberto o mercado da China para os produtos da cooperativa. Está ainda em desenvolvimento o estudo para desalcoolização do vinho.
Arte/JC
O setor vive um 2025 desafiador. Depois da safra ruim do último ano, neste ano, a colheita e a qualidade da uva foram positivas, no entanto, são os preços nas prateleiras que não têm atraído o público com o mesmo vigor aos sucos integrais. Ainda assim, o suco é uma receita para garantir rendimentos em momentos não muito favoráveis para o setor.
"Mesmo com a quebra da safra no ano passado, 26% do nosso faturamento veio do suco de uva. Em volume, temos mantido em torno de 50% da produção neste produto, e no campo, 65% da uva é do tipo americana, com 80% delas usadas na produção de sucos. O restante, é destinado aos vinhos finos", aponta o gerente de marketing da Cooperativa Vinícola Garibaldi, Maiquel Vignatti.
Ele recorda que o movimento em direção à valorização do suco iniciou há cerca de 20 anos, justamente para dar melhor destinação às uvas de mesa, que não garantiam, até então, valor agregado à produção da cooperativa de Garibaldi, que conta com 470 produtores associados.
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"O suco é um produto que evolui muito, inclusive ao longo do ano, e isso nos exige investimentos industriais em tecnologia para manter o bom padrão. Temos observado, por exemplo, um bom crescimento no mercado do suco de uva branco, que hoje chega a 10% das vendas. Temos também investido em variedades de embalagens, com tamanhos menores do que os originais, com boa aceitação principalmente de 1 litro", aponta.
A Garibaldi é a terceira no mercado de sucos integrais brasileiros hoje, que conta, no top 3, com outra cooperativa da Serra, a Nova Aliança.
A uva é aproveitada por inteiro
Produção da Organovita é certificada
Organovita/Divulgação/JCA produção de uvas bordô, com maior resistência a variações climáticas, mesmo com menor produtividade, de 30 famílias em 12 municípios da Serra tem, em Garibaldi, a sua destinação para a produção média de 360 mil litros de suco 100% orgânico. Na Organovita, 100% da uva recebida das produções, que são certificadas internacionalmente como orgânicas, é processada e envasada no mesmo dia, sem o uso de conservantes. Uma produção que também se estende às maçãs, que resultam em 300 mil litros anuais de suco.
"Foi uma experiência que começou com o nosso pai, ainda no interior de Roca Sales, a partir de um parreiral que ele recuperou para fazer suco para as crianças da família. Ele era biólogo e sempre prezou pela produção orgânica. Logo, os vizinhos também estavam produzindo sem agrotóxicos. Até que, em 2001, compramos terra em Garibaldi, mas a produção cresceu, e, hoje, temos a parte industrial concentrada no município, com a produção das uvas e maçãs distribuída pela região", conta o diretor comercial da Organovita, César Luís Postingher.
Segundo ele, a certificação internacional, que garante lugar importante à empresa no mercado de orgânicos, é obtida a partir de auditoria aos produtores, com análise da ausência de contaminação no solo, do uso de insumos naturais, também certificados. E, na parte da industrialização, a diferença está na ausência de conservantes.
O percurso para a certificação não é simples, e quem já o trilhou, como a Organovita, corta o caminho para outras marcas ou redes de varejo. Hoje, metade da produção da empresa de Garibaldi é destinada a outras marcas, que usam seus rótulos, ou mesmo as marcas próprias de redes de varejo.
"O mercado tem recebido muito bem o nosso produto, que tem um valor de prateleira maior e um retorno muito positivo. Temos hoje, uma das empresas do setor orgânico melhor estruturadas no País, com 30 funcionários e crescente automatização. Os nossos produtos chegam a todo o Brasil e, no exterior, principalmente aos Estados Unidos e Canadá", comenta o diretor.
Farinhas e óleo valorizados
Na Organovita, em Garibaldi, além da produção orgânica de sucos e vinagres, o aproveitamento da uva é total. Na produção líquida, a empresa industrializa ainda os vinagres. Mas o aproveitamento das frutas é por inteiro na produção. São separadas cascas e sementes que, secas, e com um processo que evita a fermentação, resultam em farinhas a partir da trituração, ricas em fibras, e em óleo, extraído da semente da uva, com uso direcionado desde a indústria de cosméticos e de alimentos, inclusive como substituto, de maior valor agregado, ao azeite de oliva. A cada ano, a Organovita produz 5 toneladas de farinhas a partir da uva e da maçã, com 15% dessa produção destinada à exportação. "Somos os únicos produtores de óleo de uva 100% orgânico e certificado no Brasil", explica César Luís Postingher. Anualmente, a empresa produz 500 litros de óleo de uva, destinados ao mercado brasileiro.
A Serra também produz destilados
Union Destillery produz até três milhões de litros por ano de malte whisky
William Sigognini/Divulgação/JCEstá na capital do vinho, em uma propriedade que, durante muito tempo, foi um dos endereços da produção de vinhos da cidade, mas o que há ali hoje é uma destilaria, de onde saem até três milhões de litros por ano de malte whisky, pela Union Destillery, inclusive, a exemplo dos produtores de vinho de Bento Gonçalves, ensaiando os primeiros e bem-sucedidos passos na exploração turística da sua produção.
"O turismo para nós ainda é uma descoberta, e para os turistas também. Nós abrimos a destilaria, mostrando aos visitantes o passo a passo do processo de produção do whisky, a partir de um único cereal, o malte, até a degustação no final. Percebemos que há um encantamento dos turistas por descobrir algo novo. É um caminho com grande potencial, assim como é para o whisky brasileiro. Nós somos considerados o novo mundo do whisky", explica o diretor executivo da Union Destillery, Luciano Borsato.
Ele lidera um processo de modernização da produção iniciado em 2010, quando a empresa adquiriu a propriedade em Bento, que pertencia à vinícola Cordelier. A proposta da destilaria é oferecer ao mercado um whisky premium que garanta a produção da sua própria linha, produzida e vendida em Bento Gonçalves, mas mantém o seu perfil de fornecedor para outras empresas engarrafarem no Brasil e no Exterior.
Segundo Borsato, 99% da produção é destinada a outras empresas, e 40% é destinada ao mercado externo.
"O mercado do whisky cresceu muito nos últimos anos, por isso investimos na ampliação não apenas da produção, mas também dos barris, para atender a novos clientes no Exterior. Os países da América do Sul, como Argentina, Chile e Uruguai, além do Japão, são os nossos principais parceiros fora do Brasil", diz o diretor.
A destilaria conta hoje com 35 funcionários que operam dois destiladores de 16 mil litros, que têm a função de concentrar o álcool na primeira etapa da produção. E um destilador com capacidade para 18 mil litros, que separa os elementos que vão formar o malte whisky.
A origem da Union Destillery remonta a 77 anos atrás, em Veranópolis. À época, a chamada União Montanhesa era uma cooperativa de produtores, que durou até o início dos anos 1970, quando a família Borsato encampou o negócio e deu novo rumo a ele. Ainda no final daquela década, passou a fornecer no mercado o malte whisky produzido em Veranópolis, com a primeira exportação em 1984.
Diferente das produções de vinho, não há produção rural na área da Union Destillery. A base do whisky é a cevada, já maltada, que vem principalmente do Paraná. Há ainda 5% do malte usado pela empresa importado da Escócia e usado em linhas mais premium.
"A produção hoje é toda concentrada em Bento Gonçalves, mas mantemos a sede em Veranópolis. Ficam lá hoje os depósitos com os estoques mais antigos", explica Borsato.
Além das suas sete linhas vintage malte whisky engarrafadas na Serra e outras duas linhas de edições limitadas, a Union Destillery produz ainda, sob encomenda, um licor de whisky, uma linha de vinho e cerveja.