Desde novembro do ano passado, quando o governo gaúcho partiu em missão à China, o prefeito de Igrejinha, Leandro Horlle, aguarda com esperança por uma definição da montadora BYD sobre a possibilidade de instalação de uma fábrica no município do Vale do Paranhana. Na bagagem do governador Eduardo Leite, naquela oportunidade, foi o material que apresentava Igrejinha e demonstrava todas as facilidades para atrair o investimento e garantir, ainda mais, a diversificação da matriz econômica do município que já teve o setor calçadista como responsável por 80% dos empregos locais, e hoje responde por 40% e metade do retorno tributário.
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De acordo com o prefeito, este foi um namoro iniciado em agosto do ano passado, quando representantes do município tiveram um encontro com a BYD em São Paulo. Até o início deste ano, surgiram pelo menos dois municípios concorrentes, Novo Hamburgo e Rio Grande, mas ainda não há definição nem de local e nem do modelo de nova planta industrial que os chineses pretendem instalar no Brasil, depois da montadora em Camaçari, na Bahia.
"A BYD, claro, chama a atenção pelo porte e por ser uma montadora internacional, mas não seria inédita a operação que estamos oferecendo para que eles sejam atraídos para o nosso município. Conseguimos estabelecer um modelo de lei de incentivos significativo e personalizado ao porte da empresa que queremos atrair ou que está interessada em se instalar em Igrejinha, que vai desde o ressarcimento do ICMS até a doação de terreno ou isenção de tributos municipais desde a construção até a operação", explica Horlle.
Diferente de municípios vizinhos no Paranhana, nos últimos anos Igrejinha tem conseguido reduzir com sucesso a dependência histórica relacionada ao setor calçadista, mas sem reduzir o espaço para este polo econômico. Há três anos, por exemplo, foi a lei de incentivo local que garantiu a ampliação da Usaflex em Igrejinha, onde já fica a sede da empresa, ao invés de migrar para outro município da região. A exemplo da Piccadilly e da Beira Rio.
Fica em Igrejinha, por exemplo, a Construarte, uma das principais empresas do setor da construção civil no Estado. E um novo polo moveleiro, com 20 pequenas empresas já estabelecidas e incentivadas pelo município, é desenvolvido. Até mesmo uma empresa de economia circular, a Ambiente Verde, instalou sua unidade para receber resíduos da indústria calçadista, com o desenvolvimento de novos produtos, em um lote negociado com o município às margens da ERS-115.
"São resíduos que se tornam valor econômico e aumento da cadeia produtiva para o município", resume o prefeito.
Entre os novos setores em ascensão está ainda o de confecções de roupas íntimas, com os investimentos e o avanço nos mercados nacional e internacional da Crisdu. Igrejinha foi o 35º principal município exportador do Rio Grande do Sul nos primeiros sete meses do ano, e o setor responde por 35% dessas negociações no Exterior, representando pelo menos US$ 18 milhões em vendas no período, com variações positivas superiores a 50% nos valores negociados de sutiãs e de 78% em cuecas, por exemplo.
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Aposta no capital humano
Com o maior PIB municipal na Região do Vale do Paranhana, tendo crescimento de 10% entre 2020 e 2021, anos mais recentes do levantamento municipal pelo IBGE, Igrejinha tornou-se referência na região, especialmente nas ações para a recuperação da economia após a cheia de 2024.
"Nosso município tem pouco mais de 30 mil habitantes, mas temos a consciência de que, quando atraímos ou reforçamos investimentos e empregos na nossa cidade, somos a referência para mais de 200 mil habitantes do Vale do Paranhana. E este é o diferencial do futuro para atrairmos as empresas. Claro que temos a logística como um diferencial competitivo, pela facilidade de mobilidade entre as regiões Metropolitana, Litoral e Serra, mas o capital humano é que fará a diferença no futuro", aponta Leandro Horlle.
No pós-cheia, somente no setor calçadista, 62 empresas locais foram atingidas, gerando mais de R$ 200 milhões de impacto. O reflexo também aconteceu no mercado de trabalho. Segundo o prefeito, o município conseguiu manter uma boa geração de empregos e renda, mas houve redução após maio do ano passado. No final do primeiro semestre, o município registrava saldo positivo de apenas 70 vagas de emprego.
"Quando há vagas para serviços, elas esgotam rápido, mas para vagas industriais, só com incentivos", comenta.
O poder público municipal atua como parceiro do Senai em cursos de qualificação, principalmente para o setor calçadista. E foi criado o programa Formar Igrejinha, gratuito, e custeado pela prefeitura. Já foi realizado, por exemplo, curso de costura têxtil específico com a Crisdu. "Não é à toa que a Beira Rio, por exemplo, tem na unidade de Igrejinha a produção da sua linha de maior valor agregado, a Vizzano. É porque a mão de obra aqui tem qualidade", avalia Horlle.
O potencial da cerveja
Cervejaria Stier produz até 300 mil litros de chopp por mês
/Stier/Divulgação/JCUm dos expoentes da economia de Igrejinha e do Vale do Paranhana é a produção cervejeira, com a fábrica da Heineken. A partir daquela instalação, às margens da ERS-115, é produzida a bebida distribuída para todo o Sul do Brasil. A fábrica passa por uma ampliação, sem a divulgação do valor investido, e responde hoje por 20% do valor adicionado total da economia de Igrejinha, com um retorno de até R$ 5 milhões ao ano para o município.
No entanto, a unidade industrial, bem no limite entre Igrejinha e Três Coroas, tornou-se alvo de uma disputa judicial entre os dois municípios. Na decisão mais recente - o prefeito de Igrejinha promete levar adiante a ação -, foi determinado que, conforme a presença do lote nos territórios de cada município, 85% da arrecadação da indústria deve ser destinada a Três Coroas e 15% a Igrejinha.
A presença da gigante cervejeira é um dos motores para o crescimento da Oktoberfest em Igrejinha, que garante o movimento comercial e turístico e estimula a multiplicação do setor no município. Em todo mês de março há, no mesmo espaço da Oktober, uma feira com as cervejarias locais, comerciais e artesanais.
É neste ambiente que a Cervejaria Stier, criada em 2013 em Parobé, mas instalada em Igrejinha desde 2017, prospera. É uma das três microcervejarias que atuam comercialmente, com presença no varejo, e formam uma associação local de cervejarias. "Hoje estamos em 2 mil pontos de venda no Rio Grande do Sul. Partimos de uma pequena produção, em Parobé, com capacidade para 5 mil litros, fomos incentivados pelo município a nos instalarmos em Igrejinha e passamos a produzir 8 mil litros de chopp. Hoje, estamos produzindo até 300 mil litros por mês", conta a sócia-proprietária da Stier, Silmara Andreatti.
O chopp da Stier foi o primeiro produzido comercialmente na região, inicialmente, distribuído para eventos. Hoje, a cervejaria produz o chopp em garrafa PET, em barril e em garrafa de 600ml, além da cerveja long neck. E, como garante a Silmara, a cervejaria, que emprega 70 pessoas, não vai parar por aí. "Estamos de olho no mercado de bebidas com menor teor alcoólico, que é uma tendência da Geração Z."