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Mapa Econômico do RS

- Publicada em 28 de Novembro de 2023 às 10:07

Rastreabilidade pode ser o diferencial do couro no Vale do Sinos

Indústria calçadista reforça ações de controle da matéria prima

Indústria calçadista reforça ações de controle da matéria prima


Arezzo/Divulgação/JC
A tendência de maior rigor na indústria calçadista pela rastreabilidade e qualidade do couro, aliada à também crescente exigência pela rastreabilidade no setor de carnes, podem criar o cenário ideal para que um diferencial da produção coureira do Vale do Sinos finalmente se torne realidade. Desde 2009 os curtumes de 44 municípios dos vales do Sinos e do Paranhana têm a possibilidade de certificar o seu couro acabado com a Indicação de Procedência de Couro Acabado do Vale do Sinos, a primeira indicação deste tipo para um produto industrial, e que valoriza os conhecimentos técnicos trazidos para a região pela colonização alemã no século XIX.
Poderia parecer algo defasado, ou artesanal, mas é o contrário. Há mais de uma década, para se adequar à indicação, os curtumes deveriam garantir a rastreabilidade do couro e todos os compromissos ambientais no tratamento e descarte dos produtos químicos usados no trabalho com a pele que é fornecida para a produção de calçados, bolsas ou acessórios. Para ser sócio da Associação das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul (AICSul), por exemplo, o curtume precisa estar em dia com todas as exigências ambientais do Estado. Vistos por muito tempo vilões do meio ambiente, hoje o setor coureiro é parceiro do Ministério Público em ações de controle de poluentes no Vale do Sinos.
“É um selo que valoriza a qualidade que temos na região, mas há 12 anos fizemos uma pesquisa e vimos que, para o consumidor, não fazia nenhuma diferença essa origem controlada e de qualidade do couro. Quem estaria disposto a pagar esse preço?”, conta o presidente da AICSul, Moacir Berger.
Na época, sete curtumes locais estampavam o selo no seu produto. Hoje, nenhum. O Vale do Sinos concentra 90% dos 50 associados à AICSul, e até 80% da sua produção é destinada à exportação. Para que se tenha uma ideia, dos 800 milhões de pares de calçados produzidos anualmente no Brasil, só 18 milhões são feitos em couro atualmente. A busca por novos mercados fora do país, foi o caminho natural. Novo Hamburgo, por exemplo, é o 19º município no ranking de exportações do Rio Grande do Sul neste ano, e 21% do volume vendido ao Exterior é em couro.
Agora, confirma Berger, há uma correria no setor para garantir a rastreabilidade, que em grande parte depende mais do setor de frigoríficos, por exemplo, do que da indústria de preparo do couro. A partir de janeiro, o rastreamento de todos os produtos originários do gado brasileiro será um dos principais critérios fundamentais para as exportações à União Europeia.
“Os grandes curtumes que já existiram na região, hoje deram lugar a empresas menores e cada vez mais especializadas. Antigamente, eram empresas que pegavam o couro salgado, pintavam e entregavam pronto para a indústria. Hoje, o curtimento e o acabamento estão separados. O tamanho da cadeia produtiva ficou maior, o que pode dificultar a rastreabilidade do produto”, aponta o representante do setor.
Entre os desafios para o setor coureiro, há ainda a migração do rebanho brasileiro. Se no século XIX e começo do século XX a produção de gado gaúcha garantiam a produção, hoje, o rebanho do Rio Grande do Sul supre somente 20% da demanda dos curtumes. Há uma capacidade instalada de 10 milhões de peles para acabamento no Estado, mas até 8 milhões são garantidos com o couro vindo de outros estados, especialmente no Centro-Oeste.
“Boa parte das indústrias, inclusive migraram para onde o rebanho está. Foi um movimento que também acompanhou o que aconteceu no setor calçadista, com a migração das grandes indústrias para o Nordeste, por exemplo”, recorda Berger.

Tem até couro de cobra no Vale do Sinos

Mas há quem não dependa do gado para produzir couro no Vale do Sinos. É o caso da Arte de Pele, que há 23 anos produz, em Estância Velha, couros a partir de peles exóticas, como o jacaré, de criações controladas, o pirarucu, a partir de criações e de manejo na Amazônia, e a python, a partir de criações na Indonésia.
“Fazemos parte de um nicho específico no mercado, com o trabalho em peles certificadas e de espécies não ameaçadas, que tem um custo e um valor de mercado mais elevado e, em comparação com outros curtumes, pode ser considerado até uma produção artesanal. São apenas dez funcionários na produção”, explica o sócio-proprietário da empresa, Luís Bocchi.
Para que se tenha uma ideia, enquanto o metro quadrado de um couro oriundo do gado, mas nobre, custa em torno de R$ 120. O metro quadrado do produto que sai da Arte de Pele custa em média R$ 1,4 mil.
Após o processo de preparação do couro exótico e nobre, há uma cadeia produtiva que também está no Vale do Sinos. Há em torno de 30 empresas locais como clientes do curtume de Estância Velha.
“É um mercado com um comprador cativo, e que se mantém. Já foi maior, mas acredito que a tendência, tanto pela especialização da produção industrial quanto pelo mercado consumidor de produtos de luxo femininos, é a estabilização”, comenta Bocchi.
São produtos como botas com pele de python, avaliados em R$ 3,5 mil, ou jaquetas, a R$ 8 mil.
“Todo o processo produtivo para um curtume deste tipo é complexo, é preciso entender o nicho e como o mercado se comporta. Se fizesse uma comparação com os curtumes tradicionais, é como se eles produzissem metais, como aço ou ferro, e nós, ouro”, resume o empresário.