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Publicada em 21 de Julho de 2025 às 00:25

Redução da malha ferroviária prejudica logística regional

Entre 2013 e 2023, o eixo entre Cruz Alta e Rio Grande recuou 30%

Entre 2013 e 2023, o eixo entre Cruz Alta e Rio Grande recuou 30%

/TÂNIA MEINERZ/JC
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Eduardo Torres
Eduardo Torres Repórter
Mesmo com pelo menos cinco empresas especializadas na logística de transporte de grãos operando em Santa Maria, nenhuma delas opta por escoar a produção pelo modal ferroviário. Na cidade que marca o Centro do Rio Grande do Sul, e onde a Rumo Logística, responsável pela concessão das ferrovias gaúchas, tem sede, não há um terminal adequado para o carregamento de grãos.
Mesmo com pelo menos cinco empresas especializadas na logística de transporte de grãos operando em Santa Maria, nenhuma delas opta por escoar a produção pelo modal ferroviário. Na cidade que marca o Centro do Rio Grande do Sul, e onde a Rumo Logística, responsável pela concessão das ferrovias gaúchas, tem sede, não há um terminal adequado para o carregamento de grãos.
Um estudo encomendado pelo governo do Estado, avaliando as condições atuais deste modal, mostra que, entre 2013 e 2023, o eixo entre Cruz Alta, Tupanciretã, Júlio de Castilhos, Santa Maria, Cacequi e Porto de Rio Grande teve redução de pelo menos 30% no fluxo de grãos enviados por trem. Após as cheias de 2023 e 2024, a situação ficou ainda pior.
Este foi o único trecho de ferrovias gaúchas que seguiu com fluxo, mas com apenas seis trens — que têm uma das menores médias de velocidade do País — por semana. "Não usamos a ferrovia porque não encontramos uma estrutura adequada em Santa Maria. O nosso transporte é todo feito por caminhões, e isso resulta, claro, em custos elevados. Em torno de 60% da diferença entre o preço que pagamos ao produtor e o que vendemos o grão no Porto de Rio Grande é destinado a esse custeio", aponta o gerente de grãos da Bordignon Grãos, Dilvan Vieira, que opera com unidades em Santa Maria e São Sepé.
Somente esta empresa de logística de grãos, que faz o intermédio entre os produtores da Região Central e o Porto, transporta, em média, 1,3 milhão de sacos de soja por safra. Os grãos respondem por mais de 86,9% das exportações de Santa Maria que, entre janeiro e junho, foi o 16º município gaúcho em valores de cargas enviadas ao exterior. No entanto, com uma movimentação de US$ 89,45 milhões, Santa Maria registrou queda de 12,7% nas exportações em relação ao mesmo período do ano passado.
Mas Santa Maria tinha uma importância ferroviária além dos grãos. Após a cheia, o ramal que ligava o município a Canoas para o transporte de combustíveis também foi rompido e não recuperado pela Rumo Logística. Os únicos terminais que ainda têm algum fluxo de grãos para os trilhos estão em Júlio de Castilhos, que divide com Tupanciretã as principais áreas de plantio de soja na faixa central do Rio Grande do Sul. Há ainda operação em Cacequi, que também já teve desativada a ligação por trem com Uruguaiana.
Um pouco mais ao Sul, mas ainda na Região Central, a Cooperativa Tritícola Sepeense (Cotrisel), uma das principais produtoras de soja e arroz da região, por exemplo, abandonou o uso da ferrovia há 20 anos. Até aquele momento, a Cotrisel escoava sua produção pelos trilhos a partir de Restinga Sêca até Rio Grande, mas não teve mais condições. "Houve falta de interesse e de manutenção da concessionária", conta o presidente, José Paulo Salerno.
O terminal de Restinga Sêca é um dos já desativados na região. Nos últimos 18 anos, a redução de movimentação de grãos por trens no Rio Grande do Sul foi de quase 50%, enquanto a produção aumentou em mais de 70%. Lá na ponta, no Porto de Rio Grande, os trens respondem por apenas 6% da movimentação de cargas. No Vale do Rio Pardo, onde está a produção industrial de tabaco - que responde por pelo menos 14% de todas as exportações gaúchas entre janeiro e junho -, sequer há ramais em condições de transportar contêineres carregados até o porto.

Estudo propõe novas rotas ferroviárias

Um cenário que, se depender do estudo apresentado pelo governo, e possivelmente de um novo modelo de concessão de ferrovias a partir de 2027, pode ser revisto. Isso porque, na busca por viabilizar o transporte ferroviário da produção, o Centro do Rio Grande do Sul é chave na apresentação de cenários alternativos que encurtam o caminho das cargas até o porto.
Naquele que exigiria menor investimento — estimado em R$ 1,2 bilhão — ligando Santa Maria, São Sepé e São Gabriel, em uma das regiões de grande expansão agrícola da soja, o ganho para quem transporta já seria significativo. Conforme o levantamento, hoje, uma carga que saia de Cruz Alta, passando, necessariamente por Santa Maria, por trem, tem um custo somente 1% inferior ao transporte rodoviário, e com o agravante da uma das menores velocidades médias de trens do Brasil. Com essa nova via, a mesma carga teria custo 22% menor do que se transportada em todo o trecho por caminhão.
A projeção feita pelo Estado apontou ainda outros dois ramais alternativos para encurtar caminho. Um deles, também a partir de Santa Maria, iria a Vila Nova do Sul e Bagé, com investimento estimado em R$ 3,1 bilhões. O outro, aí sim, ativando áreas fundamentais na exportação gaúcha, além dos grãos, entre o Vale do Rio Pardo e o Jacuí Centro, sairia de Santa Maria, passando por Formigueiro e Cachoeira do Sul até Capão do Leão, exigindo, conforme a projeção, R$ 4,3 bilhões em investimentos.
O estudo apresentado este ano pelo vice-governador Gabriel Souza aponta cinco cenários possíveis para a recuperação da malha ferroviária gaúcha, que exigiriam, em 30 anos, entre R$ 17 bilhões e R$ 35 bilhões em investimentos. Todos eles teriam Santa Maria, como tradicionalmente acontece na história das ferrovias no Rio Grande do Sul, no Centro dos planos.
A reportagem fez contato com a Rumo Logística, que, no entanto, não se manifestou.

Perdas ferroviárias

 Do total de 3,8 mil quilômetros da malha ferroviária gaúcha, pouco mais de 921 quilômetros têm condições de operação.
 A única linha ativa para escoamento de grãos cruza a Região Central do Estado, com uma redução de quase 50% no fluxo de cargas, mesmo com o aumento de 70% na produção, nos últimos 18 anos.
 Mesmo com importância estratégica, as Regiões Central e Vale do Rio Pardo já não operam contêineres nem cargas líquidas, como combustíveis.
 Estudo encomendado pelo governo do Estado propõe entre
R$ 17 bilhões e R$ 35 bilhões em 30 anos, para recuperação da malha ferroviária gaúcha, tendo o Centro do Estado como área protagonista do projeto.

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