A Casa Amarela, edifício do início do século XX e primeiro imóvel tombado de São Francisco de Paula, terá sua restauração iniciada pela recuperação do telhado, em obra conduzida pela prefeitura a partir do início de janeiro, segundo a previsão do Poder Executivo. O projeto que busca o resgate físico e imaterial do imóvel foi contemplado pela Lei de Incentivo à Cultura (LIC), e está em uma primeira fase, de pesquisa documental e das características arquitetônicas e construtivas.
Para os trabalhos referentes ao telhado, está previsto um investimento de cerca de R$ 300 mil, custeado pela prefeitura com recursos próprios. Com mais de 400 m², o prédio sediou o governo municipal até meados dos anos 2000 e permaneceu ocupado por secretarias até 2023, quando foi finalmente desocupado.
A coordenação do projeto está a cargo da jornalista e gestora cultural Lúcia Pires, responsável pelo Projeto Memórias São Francisco de Paula, que conquistou o financiamento via LIC. Ela ressalta que esta primeira fase não envolve ainda uma intervenção arquitetônica completa, mas a construção das bases para o projeto definitivo. “Estamos realizando uma pesquisa histórica aprofundada, com museólogos e historiadores, para reconstituir a trajetória da casa. As informações disponíveis eram rasas, e é fundamental conhecer sua história antes de definir o restauro”, afirma.
O levantamento histórico deve ser concluído até agosto e servirá como diretriz para o projeto arquitetônico e museológico do primeiro centro cultural do município. Essa fase conta com investimento, por meio da LIC, de outros R$ 335 mil, além de R$ 44 mil de contrapartida da prefeitura. Empresas que atuam no município, como a MDA Alimentos, Marine Compensados e Sicredi, atuam nos patrocínios ao projeto. “Eles estão felizes de poder patrocinar um projeto cultural de patrimônio em sua cidade. São empresas que se ligaram a essa primeira etapa, e eu tenho certeza de que, quando iniciarmos a segunda, eles irão multiplicar, outras empresas irão ver (o que está sendo feito)”, vislumbra.
Segundo o secretário de Turismo e Cultura, Rafael Castelli, a iniciativa marca um avanço histórico na política municipal de preservação. “Esta é uma das obras mais importantes dos últimos anos em São Francisco. É o primeiro prédio tombado e simboliza um novo olhar sobre o patrimônio”, afirma. Ele destaca que, desde 2017, o município estruturou inventários, legislação e parcerias técnicas, inclusive com o Iphae, para consolidar uma agenda de preservação.
A Casa Amarela foi oficialmente tombada em novembro de 2024, em um ato público que reuniu moradores e marcou o reconhecimento formal do prédio como bem cultural. A prioridade, agora, é estabilizar a estrutura. “Precisamos arrumar o telhado para trabalhar com segurança, substituir toda a parte elétrica e avançar no restauro sem que a edificação continue se deteriorando”, explica Castelli.
A prefeitura pretende transformar o espaço em um centro cultural multifuncional, articulando preservação e uso social. “Mais que restaurar tijolo e cimento, queremos que a cidade se encontre com sua própria identidade. A Casa Amarela deverá receber biblioteca, centro de memória, arquivo histórico e salas de ativação cultural, gerando fluxo turístico e oferecendo espaços de convivência”, pontua o secretário.
A restauração do imóvel também se conecta ao movimento crescente de valorização do patrimônio local. O município já inventariou mais de 30 edificações e planeja novos tombamentos. Para Castelli, a Casa Amarela deve se tornar referência de preservação: “Existe uma mudança cultural em andamento. As pessoas estão entendendo que patrimônio é um direito e uma oportunidade de fortalecer identidade, turismo e desenvolvimento”.
Município amplia ações de preservação e mira novos tombamentos
O início da restauração da Casa Amarela abriu caminho para um movimento mais amplo de valorização do patrimônio histórico em São Francisco de Paula. Desde 2018, de acordo com o secretário de Turismo e Cultura, o município conduz um inventário que já identificou mais de 30 edificações de relevância cultural, e duas delas estão na linha de frente para novos tombamentos: o prédio onde funciona a Brigada Militar, antiga escola estadual, e o edifício do Fórum.
Segundo Rafael Castelli, o interesse da população também cresceu após a criação da lei municipal de tombamento e o avanço das políticas culturais. "Existe uma mudança de comportamento. A comunidade está entendendo que preservar é garantir história e identidade", afirma. Ele destaca que proprietários de imóveis privados já procuram a prefeitura para saber como aderir ao processo.
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A coordenadora do projeto Memórias, Lúcia Pires, reforça que a cidade ainda está consolidando sua cultura de preservação. "As pessoas têm medo do tombamento, muitas vezes por desinformação. Mas patrimônio é um direito, não um obstáculo", afirma. Para ela, a Casa Amarela pode funcionar como um exemplo concreto de que restauro e uso social podem caminhar juntos.
Além do tombamento de bens materiais, São Francisco de Paula também avança na proteção de patrimônios imateriais, como o modo de preparo do queijo serrano e o gênero musical bugio, recentemente reconhecidos como bens culturais do Estado. As ações, segundo Castelli, reforçam uma visão integrada de cultura e turismo da cidade da Serra Gaúcha.