Manifestações em toda a Argentina acontecem nesta sexta-feira (2), com epicentro na Plaza de Mayo, em Buenos Aires, em repúdio ao atentado fracassado contra a vice-presidente Cristina Kirchner, que deixou o país em choque. Centenas de pessoas começaram a se deslocar para a praça no início da manhã, a partir de diferentes partes da capital, muitas com bandeiras e carros de som. Segundo o jornal La Nación, todos os ministros do governo Alberto Fernández - que declarou feriado devido ao atentado nesta sexta - decidiram participar da mobilização. Ainda não há definição se o presidente argentino se juntará a eles.
Em manifestação no começo da madrugada em rede de televisão, o presidente Alberto Fernández classificou o incidente com Cristina como o mais grave desde o retorno à democracia em 1983. "Cristina continua viva porque, por um motivo que ainda não foi confirmado tecnicamente, a arma que tinha cinco balas não disparou, apesar de ter sido acionada", disse o presidente em um discurso à meia-noite.
O Papa Francisco, ex-arcebispo de Buenos Aires, enviou à vice-presidente um telegrama no qual expressou sua "solidariedade e proximidade neste momento delicado" e disse que reza para que "a harmonia social e o respeito aos valores democráticos sempre prevaleçam".
A tentativa de assassinato também foi repudiada pelos principais líderes da oposição Juntos pela Mudança (centro-direita), como o ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019) e o prefeito de Buenos Aires, Horacio Rodríguez Larreta.
A coalizão governista Frente de Todos (peronista, centro-esquerda) convocou uma marcha até a Plaza de Mayo "em defesa da democracia" em um dia que foi declarado feriado nacional.
A Argentina está em estado de estupor desde a noite de quinta-feira, quando um homem, que foi preso, apontou uma arma à queima-roupa e tentou atirar no rosto de Kirchner na porta de sua casa no bairro da Recoleta, em Buenos Aires. O agressor esgueirou-se entre a multidão de militantes que a esperavam para manifestar sua solidariedade à ex-presidente (2007-2015), em uma manifestação que se repete todas as noites desde 22 de agosto, quando o Ministério Público pediu 12 anos de prisão para ela em um julgamento em que é acusada de fraude e corrupção.
Polícia encontra 100 balas em apartamento de brasileiro ligado a atentado a Cristina
A juíza María Eugenia Capuchetti e o promotor Carlos Rivolo, encarregado da investigação do ataque, fizeram uma inspeção esta manhã na área onde ocorreu o ataque. O tribunal começou a receber as primeiras declarações de testemunhas, além de policiais e membros da custódia da vice-presidente de 69 anos. Mais tarde, a juíza foi à casa de Kirchner para ouvi-la.
A polícia federal invadiu um apartamento nos arredores de Buenos Aires, que o agressor aluga há oito meses, segundo o proprietário. Duas caixas de 50 balas cada foram encontradas no local, disse uma fonte policial à imprensa.
O brasileiro Fernando André Sabag Montiel, residente na Argentina desde 1993, é de nacionalidade brasileira, de mãe argentina e pai chileno. Ele já havia sido detido em 17 de março de 2021 por porte de armas não convencionais, segundo fontes policiais citadas pela agência de notícias oficial Télam. O homem tem um símbolo nazista tatuado no cotovelo, segundo imagens em suas redes sociais.
Vigília e manifestações marcam a sexta-feira na Argentina
"Acabamos de vivenciar um dos piores episódios de nossa história com a tentativa de assassinato de Cristina Kirchner", tuitou Axel Kicillof, governador da província de Buenos Aires, o maior distrito do país. Nesta sexta-feira, uma vigília foi realizada no local em meio a uma forte presença policial que isolou a área.
No meio da manhã, os manifestantes, convocados por partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais e organizações de direitos humanos, começaram a se reunir nas principais cidades do país, para protestar partir do meio-dia.
"Estávamos esperando nossa querida Cristina. Ela desceu para cumprimentar todo mundo, como todas as noites, para cumprimentar as pessoas. E de repente ouviu-se uma agitação, e foi aquele cara que apontou para ela. Eles o agarraram do meu lado, tenho o rosto deste infeliz pregado na minha cabeça", disse à AFP Teresa, que não quis dar seu sobrenome em frente à casa da vice-presidente.
Martín Frías, outro partidário de Kirchner de 48 anos, disse à AFP que com este fato "o inimigo é mais conhecido, mas a luta não se abandona. Significa tomar maiores precauções, mas com as mesmas convicções de sempre".
O ataque foi repudiado por líderes latino-americanos e pelo chefe do governo espanhol, bem como pela porta-voz do Escritório de Direitos Humanos das Nações Unidas, Ravina Shamdasani.
Nesta sexta, o chefe da diplomacia dos EUA, Antony Blinken, também condenou o ataque e pediu a rejeição da violência política e do "ódio". "Apoiamos o governo e o povo argentinos na rejeição da violência e do ódio", escreveu Blinken no Twitter.