Ao buscar assistência médica na unidade de saúde, ela foi diagnosticada com depressão e ‘transtorno de identidade sexual’. O sofrimento também motivou uma tentativa de suicídio. Com um ano de acompanhamento, em 1998, ela foi submetida a uma intervenção inicial, com a expectativa de completar os procedimentos. No entanto, mesmo após passar pelo programa de adequação sexual, em 2001, a cirurgia foi cancelada de última hora, o que agravou o estado de depressão da cabeleireira.
"Eu estava me tratando em todas as especialidades, endócrino, psiquiatria, gineco, psicologia, otorrino.Então houve essa negação, o que para mim foi devastador. Eu vi o mundo desabando", relata Luiza.
Entre os anos de 2002 e 2008, com a ajuda do advogado Thiago Cremasco, o caso foi parar na Justiça, mas o tratamento foi negado por, pelo menos, três vezes. Diante da impossibilidade de cuidado adequado, Luiza fez um empréstimo e pagou a cirurgia por conta própria, em 2005.
Eduardo Baker, advogado e coordenador de justiça internacional da Organização Justiça Global, entidade que também passou a defender Luiza Melinho, explica que o Brasil é signatário de vários tratados internacionais de direitos humanos com obrigações que incluem o direito à saúde.
"Especificamente em relação às pessoas trans, esse direito a saúde também inclui a cirurgia de afirmação de gênero, eventuais procedimentos envolvidos. Todo esse processo de transição será contemplado no direito a saúde", explica o advogado.
O caso Luiza Melinho passou a tramitar no Sistema Interamericano de Direitos Humanos em 2009. Em decisão recente, a Comissão Interamericana concluiu que o Estado Brasileiro não garantiu acesso à saúde a Melinho ao impor obstáculos para acessar a cirurgia solicitada. O advogado da Justiça Global explica as possíveis sanções ao Brasil em caso de condenação.
"A gente espera que essa reparação inclua também uma reformulação da politica de saúde em relação a pessoas trans para que essa cirurgia, não só a cirurgia, mas todo complexo de procedimentos médicos, esteja contemplado de uma maneira célere, previsível, transparente. Que esse protocolo esteja acessível a todo mundo, que uma pessoa que entre nessa fila tenha noção de quando vai poder passar por determinado procedimento", defende Baker.
Para Luiza Melinho, após mais de duas décadas desde o início das tentativas de reafirmação de gênero pelo SUS, ainda é difícil lidar com a exposição da sua história, a primeira relacionada aos direitos de pessoas trans contra o Brasil em uma corte internacional.
Em nota, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania reconhece que a cirurgia de Luiza era a única forma de assegurar o seu direito à vida e sua integridade física. A pasta afirmou que vai cumprir as diretrizes do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.


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